As arribas caem mas nada impede construção na praia do Peneco

O projecto de um novo apoio de praia foi autorizado para uma zona onde o mar, há sete anos, já fez estragos. A edificação, garante a câmara, foi concebida para que “não colapse no caso de o mar avançar”.

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O litoral algarvio continua sob pressão Virgílio Rodrigues

Albufeira vai ter sete apoios de praia, situados em pleno areal numa extensão de cerca de dois quilómetros, mas só um é que está gerar controvérsia — aquele que se situa junto ao rochedo do Peneco. A população não se conforma com a obra embora esta esteja prevista no Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) Burgau — Vilamoura. O que choca, dizem os críticos, é a proximidade com “o principal símbolo da praia”. E o facto de se continuar a construir em zonas que já tiveram de ser intervencionadas por causa da erosão costeira.

O assunto foi debatido na última reunião da Assembleia Municipal, onde o executivo esclareceu que esta infra-estrutura é “mais uma entre as duas centenas que estão a ser requalificadas em todo o litoral algarvio”. A aprovação teve a concordância das entidades com jurisdição na zona: câmara municipal, Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR). A explicação não convence residentes nem ambientalistas. Na internet está a correr a petição pública: “Não à construção privada no areal da praia do Peneco”, reclamam.

Fernando Grade, autor do livro Algarve tal como o destruímos, volta à carga: “Mais uma descaracterização de Albufeira”, diz, referindo-se à implantação do apoio de praia “junto daquele que é o principal ícone [Peneco] desta zona balnear — uma falta de respeito”, enfatiza. O projecto, esclareceu a câmara, está integrado no POOC, em vigor desde 1999, e resulta da relocalização de uma estrutura balnear de apoio ali existente, com carácter sazonal, destruída por um temporal em Fevereiro de 2001. “O que lá se encontrava era apenas um pequeno apoio de praia, agora vai ser surgir um restaurante, nada comparável em dimensão”, diz Hugo Lopes, o primeiro subscritor da petição: “O interesse privado sobrepõe-se ao direito público — acesso pleno à praia”, sublinha.

A autarquia, em nota divulgada no portal do município, esclareceu que “o projecto foi aprovado pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), em conferência decisória, com despacho de 16 de Setembro de 2016”. Por isso, o município entendeu que se tratou de “uma decisão global e vinculativa da administração central”, a que a administração local tem de obedecer. Por sua vez, o presidente da CCDR, Francisco Serra, respondeu que o projecto recebeu “unicamente pareceres favoráveis” durante a fase de consulta a outras entidades com jurisdição na área.

Mais construção

Entre a praia do Peneco e o forte de S. João está prevista a instalação de sete apoios de praia, seguindo uma linha de requalificação que tem vindo a ser aplicada em toda a zona do litoral. Na próxima época balnear estarão seis a funcionar e até final do ano será aberto concurso para este último. O promotor é uma sociedade em que participam, em partes iguais, o concessionário do antigo pequeno apoio que foi destruído pelo mar (família Raposo) e o hotel Rocamar, situado no núcleo histórico da cidade, à beira da arriba. O prazo de concessão pode variar entre os 15 e os 75 anos, de acordo com o investimento a efectuar.

A localização no meio da praia, explica o director regional da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), Sebastião Teixeira, destina-se a “respeitar as faixas de segurança em relação à distância das arribas”.

Sebastião Teixeira diz que a implantação do apoio de praia naquele sítio só foi possível devido à recarga artificial da praia em 2011 — uma obra de 3,3 milhões de euros, levada a cargo pelo Instituto da Água. “Passados sete anos, a praia está com 80% da areia que lá foi colocada”. Razão pela qual entende estarem reunidas as condições de implantação deste equipamento naquele sítio. Antes dessa intervenção, em alturas de preia-mar, as ondas já batiam das arribas e os empresários do sector turística reclamavam investimento público para que não desaparecesse a praia. O ponto mais crítico do processo de artificialização desta zona balnear ocorreu em 1999, quando o ministério do Ambiente mandou cobrir de betão, pintado com tinta da cor da areia, as arribas de Albufeira. O objectivo foi tentar travar os efeitos da erosão das rochas, sobrecarregadas com prédios encavalitados sobre o mar.

É por todas estas razões que a associação ambientalista Almargem diz que “não se compreende” a autorização dada ?à localização deste apoio de praia, com 300 metros quadrados de área de implantação, criticando a gestão que tem sido feita no litoral algarvio. “Fala-se muito de riscos na zona costeira, em grande parte derivados das alterações climáticas, mas, ao mesmo tempo, vai sendo assegurada a permanência de habitações e equipamentos em áreas susceptíveis de virem a ser atingidas pelo avanço do oceano”, sublinha.

A câmara adianta que a construção sobre-elevada, que estará concluída antes da próxima época balnear, ficou assente em “rocha firme” com sapatas a dois metros de profundidade na areia “para que não colapse no caso do mar avançar e retirar a areia”.

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