Quanto estamos dispostos a dar à Europa?

É engenhosa a ideia de António Costa: propor a criação de três impostos europeus, sim, mas que não atingem directamente os cidadãos. Engenhosa, mas curta em ousadia

A primeira vez que alguém ousou defender um imposto europeu em Portugal foi Mário Soares, numa saudosa campanha eleitoral para o Parlamento Europeu em 1999. Na altura, ninguém mais poderia defender tal coisa — e nem mesmo Soares conseguiu impor o tema na agenda nacional. Somos um país de europeístas, mas é fácil ser-se europeísta assim. Portugal paga pouco para o orçamento comunitário e recebe muito mais em fundos de coesão. Temos menos autonomia orçamental, mas ganhamos em inflação baixa, custos de financiamento reduzidos, em mercados para exportar. Acontece que a Europa não nos basta assim. Um orçamento comunitário que se reduz a 1% dos orçamentos dos países é um bolo demasiado curto para que a Europa cumpra os sonhos que tem dentro, para sequer que use os instrumentos que tem em mãos. Da mesma forma que, sem a contribuição do Reino Unido, também não bastará passar de 1% para 1,2%.

Isso não chega porque a Europa tem de ser mais do que isto — e para ser mais forte, mais justa, mais plena, precisa que lhe entreguemos os meios para atingir os objectivos que lhe traçamos. Agora, tem uma dupla oportunidade de dizer aos seus cidadãos de que precisa de meios: é mais fácil pedi-lo quando a economia cresce, é mais fácil discuti-lo quando um dos seus maiores financiadores está prestes a dizer-nos adeus. Fácil dizer, difícil convencer. Em Portugal, um país ainda (e por muitos anos) limitado na sua gestão orçamental, sugerir a criação de novos impostos que vão ser geridos, não por nós mas por Bruxelas, seria difícil de justificar a uma maioria com suporte à esquerda, com a primeira das campanhas eleitorais mesmo à espreita (a das europeias).

Daí que seja engenhosa a ideia de António Costa: propor a criação de três impostos europeus, sim, mas que não atingem directamente os cidadãos. A saber, sobre plataformas digitais, empresas poluentes e transacções financeiras internacionais. É, porém, mais fácil dizer do que fazer, porque são temas onde é muito difícil pôr os governos europeus de acordo. Basta lembrar a discussão sobre a Taxa Tobin, precisamente dirigida às transacções financeiras. Sabe há quanto tempo a ideia está a ser estudada na Europa?  

Daí que a proposta de Costa seja engenhosa, mas curta em ousadia. É que a única maneira certa de pedir à Europa os resultados que queremos ter é dar-lhe mais do que hoje lhe damos. Se isso não é possível de defender em Portugal, que é um beneficiário líquido, como esperar que lá no Norte os povos aceitem ajudar-nos depois?

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