Depois de Janet Yellen, o dilúvio?

A experiência passada do novo presidente da Reserva Federal, demasiado ligada a interesses financeiros, não se afigura apropriada para o cargo que exerce.

A economista que acabou de concluir o seu mandato, que decorreu entre 2014 e 2018, como presidente do Conselho de Governadores do Sistema da Reserva Federal Americana (o banco central dos EUA) — a primeira mulher a ocupar esse cargo, nomeada pelo Presidente Obama, após ter sido vice-presidente da Reserva Federal de 2010 a 2014, durante o segundo mandato de Ben Bernanke —, teve alguma sorte no seu timing.

Após o amplo programa de expansão quantitativa desenhado e implementado durante o mandato de Ben Bernanke, Janet Yellen começou a normalizar a política monetária da Reserva Federal: com uma ligeira diminuição do balanço da Reserva Federal, como sugere a figura, de 10 mil milhões de dólares por mês no último trimestre de 2017 e de 20 mil milhões de dólares por mês no 1T2018; e com o processo de normalização das taxas de juro de referência da Reserva Federal que sobem, desde Dezembro de 2015, de 0%-0,25% para 1,25%-1,5%.

Durante o processo de normalização da política monetária, os mercados continuaram a subir, ao mesmo tempo que crescia a economia real e o emprego. Mas não surpreende que a queda dos mercados tenha ocorrido quando a Reserva Federal começa a aumentar o ritmo de redução do balanço.

Não foi um mandato fácil, porque as consequências da crise de 2007-2009 no sistema financeiro foram profundas. Mas a estratégia de Janet Yellen parece ter sido assegurar a continuidade da política monetária adoptada no mandato do seu predecessor procedendo a uma muito lenta retirada dos estímulos monetários à economia. Ou seja, optou por só fazer alterações incrementais à política monetária.

Janet Yellen, como Ben Bernanke, parece ter entendido que não compete ao banco central combater bolhas especulativas mas antes utilizar a política monetária com o objectivo central de contribuir para o crescimento económico e do emprego.

Embora tenham ocorrido várias situações graves no seu mandato, nomeadamente um escândalo relacionado com fuga de informação privilegiada e, mais recentemente, outro com a criação de milhões de contas falsas pelo Wells Fargo, um dos maiores bancos dos EUA, a posição da Reserva Federal perante essas situações foi relativamente passiva e discreta. É de notar que no último dia do mandato de Janet Yellen, a Reserva Federal impôs restrições relativamente suaves à acção do Wells Fargo, limitando o seu crescimento ainda que essas restrições sejam significativas como sinal da actuação do supervisor, que poderá conduzir a outras medidas mais fortes se o banco não alterar o seu comportamento. 

Jerome Powell, o sucessor de Yellen nomeado pelo Presidente Trump, advogado, com experiência em empresas de advocacia, no governo dos EUA e empresas do sector financeiro, assumiu funções no dia 5 de Fevereiro de 2018, dia em que os mercados de acções dos EUA sofreram uma forte queda. Não começa bem, por conseguinte, o seu mandato. A experiência passada de Jerome Powell, demasiado ligada a interesses financeiros, não se afigura apropriada para o cargo que exerce.

Terá muitos desafios pela frente, entre os quais lidar com o Presidente Trump mas, sobretudo, com uma eventual (prevista por muitos) nova crise financeira causada pelo rebentar de bolhas especulativas, após nove anos de crescimento ininterrupto dos mercados accionistas.

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