Angola envolve CPLP na batalha sobre Manuel Vicente

Carta de ministro das Relações Exteriores a embaixadores dos países lusófonos obriga Marcelo Rebelo de Sousa e Santos Silva a virem a terreiro desdramatizar conflito. Uma vez mais.

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MICHAEL REYNOLDS

O Governo angolano deu esta quarta-feira mais um passo no diferendo que o opõe a Portugal por causa do seu ex-vice-presidente Manuel Vicente: o ministro dos Negócios Exteriores escreveu de Luanda a todos os embaixadores da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) sobre o caso.

Manuel Vicente foi acusado pelo Ministério Público de ter corrompido um procurador português, pagando-lhe 760 mil euros para que este lhe arquivasse dois processos em que figurava como suspeito. Só não se senta no banco dos réus no julgamento da chamada Operação Fizz, que está a decorrer em Lisboa, porque as autoridades angolanas se recusam a notificá-lo, alegando que tem imunidade por ter sido vice-presidente. No passado fim-de-semana foi emitido um mandado para ser detido em Portugal para ser notificado, mas isso não sucedeu: ao contrário do que tinha apurado a PSP, Manuel Vicente não veio a Portugal. Os próximos passos das autoridades judiciais portuguesas poderão passar pela emissão de um mandado de detenção internacional, e será para acautelar isso que Luanda escreveu aos embaixadores, incluindo o português.

Sem detalhar nunca o que diz a carta, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, garantiu esta quarta-feira ao final da tarde que ela não se debruça sobre o mandado de detenção do passado fim-de-semana. O Governo de Luanda "teve a gentileza de remeter a Portugal informação sobre o seu ponto de vista em relação à aplicação dos acordos judiciários quer a nível bilateral quer a nível multilateral", uma vez que também existem acordos deste tipo entre os países da CPLP, descreveu o governante. Neste contexto, a missiva “é mais um desenvolvimento dos contactos” que têm existido entre Lisboa e Luanda “sobre as repercussões do processo que envolve Manuel Vicente nas relações entre os dois países”.

Questionado sobre uma eventual transferência para Angola do processo judicial que diz respeito a Manuel Vicente, reivindicada quer pelo próprio quer pelo governo angolano, Santos Silva recordou uma vez mais que se trata de uma decisão que cabe às autoridades judiciais portuguesas - e não ao Governo de que faz parte. 

Apesar das tentativas do chefe da diplomacia portuguesa para desdramatizar uma vez mais o assunto, foi dado conhecimento da carta a Marcelo Rebelo de Sousa. Porque, afinal, "o Presidente da República é sempre informado de todos os momentos relevantes da política externa" portuguesa, justificou o ministro. 

De resto, quando Santos Silva falou do assunto já o chefe de Estado se tinha pronunciado sobre ele. Foi na inauguração de uma exposição de arte angolana em Lisboa, na qual também esteve presente a ministra a Cultura daquele país. Observando que as duas nações estão "condenadas a ficar juntas para sempre", Marcelo Rebelo de Sousa disse que é "bom e positivo" o "espírito subjacente ao relacionamento" entre os dois Governos e os dois países."Querem algo mais forte do que os laços culturais?", perguntou, depois de visitar a exposição, ao lado da ministra angolana.

Entretanto, o banqueiro Carlos Silva, que não é arguido na Operação Fizz mas que foi implicado no caso por dois dos seus arguidos, manifestou esta quarta-feira ao tribunal onde o caso está a ser julgado a sua disponibilidade para ser ouvido como testemunha a partir de Luanda, por videoconferência. 

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