Governo quer mais medicamentos produzidos no Laboratório Militar

Grupo de trabalho criado pelos dois ministérios propõe lista de oito medicamentos. Mas fica afastada para já a possibilidade do tratamento de plasma nacional, que obrigaria a um investimento de 360 milhões de euros.

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Daniel Rocha

Os ministérios da Saúde e da Defesa querem avançar com a produção de mais medicamentos no Laboratório Militar para fornecer o Serviço Nacional de Saúde (SNS), o que implicará um investimento estimado de 16 milhões de euros. O Governo já aprovou um novo despacho, incumbindo o Infarmed e o laboratório de fazerem um levantamento da legislação que é preciso mudar.

Mas a intenção dos dois ministérios era reforçar, ainda mais, o papel do Laboratório Militar com o tratamento de plasma nacional, mas esse objectivo fica afastado para já. Para isso acontecer é preciso um investimento de 360 milhões de euros. A Saúde diz que são precisos mais estudos.

A lista de oito medicamentos, que "deverão passar a ser produzidos pelo Laboratório Militar", foi elaborada pelo grupo de trabalho criado em Fevereiro do ano passado pelos dois ministérios. O objectivo foi avaliar o reforço desta instituição na produção de substâncias que a indústria farmacêutica deixou de produzir pelo baixo preço, que as tornou desinteressantes comercialmente, ou pela baixa procura.

Da lista fazem parte um medicamento para a Doença de Wilson, um anti-inflamatório, um corticosteróide para o tratamento da Doença de Addison, um produto que altera a resposta do organismo à luz, um modificador biológico que normaliza o crescimento do cabelo, uma substância usada na prevenção de infecções oftalmológicas em recém-nascidos, um sedativo e um antituberculoso.

As falhas destas substâncias “constituem uma lacuna terapêutica com potencial impacto negativo nos cuidados aos doentes”, lê-se no relatório, que destaca que com a produção no Laboratório Militar ficam salvaguardados “o interesse e saúde públicos”. Para esta nova realidade, o Laboratório Militar precisa de se modernizar – os peritos estimam um investimento de 16,75 milhões de euros – e contratar mais 20 técnicos de várias áreas. “O tempo expectável para a readaptação do Laboratório Militar, após disponibilização de meios financeiros, humanos e de equipamentos, estima-se no mínimo em 24 meses”, diz o relatório, tornado público numa resposta do Ministério da Saúde ao CDS.

Soluções pediátricas e metadona

Os peritos recomendam ainda que se façam alterações legislativas no estatuto do medicamento, que permitam que toda a capacidade de produção do Laboratório Militar seja usada. Recomendação que já está a ser seguida pelo Governo.

“Foi aprovado um novo despacho dos ministérios da Saúde e da Defesa em que se incumbe o Laboratório Militar e o Infarmed de, no prazo de 90 dias, apresentar proposta com as alterações legislativas necessárias para permitir às Forças Armadas fazerem uso da sua capacidade produtiva para a produção dos oito medicamentos identificados no relatório do grupo de trabalho”, explica ao PÚBLICO fonte do Ministério da Saúde, acrescentando que a publicação do novo despacho acontecerá “em breve”.

Depois da emissão do parecer do Infarmed, o Exército deverá apresentar um plano para a modernização das infraestruturas e com a identificação de fontes de financiamento. “O Exército, em colaboração com os serviços responsáveis do Ministério da Saúde, deve apresentar, no prazo de 120 dias, o modelo de negócio a implementar neste âmbito, incluindo a forma de relação contratual entre as duas instituições”, responde ainda o gabinete do ministro da Saúde.

Nos últimos anos o Laboratório Militar tem desempenhado um papel importante ao garantir já a produção de vários medicamentos para o SNS, que de outra maneira não estariam disponíveis. "Produz cerca de 12 medicamentos manipulados de forma contínua para o SNS, para além das solicitações que vão surgindo de forma não planeada", explica o Ministério da Defesa ao PÚBLICO.

São medicamentos produzidos “de modo geral para situações graves ou críticas como os grandes queimados ou em situações em que é necessário a adaptação das doses terapêuticas como é o caso da pediatria, em que o Laboratório Militar disponibiliza soluções orais pediátricas e pequenos lotes destinados a doenças raras”. A preços “em média um terço mais baratos que o último preço que há registo”, acrescenta o ministério. Tem também um protocolo com o Ministério da Saúde, desde 1999, para a produção de metadona, que é usada nos programas de substituição de narcóticos.

Investimento de 360 milhões

Quando no ano passado o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, anunciou no Parlamento que estava a preparar com a Defesa um despacho para avaliar o reforço do papel do Laboratório Militar, fê-lo com a perspectiva que pudesse vir a ter um papel igualmente importante do tratamento do plasma nacional. Desde 2015 que a produção deste derivado do sangue estava envolta em polémica com a dependência do SNS de um laboratório privado, entretanto investigado por alegado favorecimento nos concursos.

“Quanto ao tratamento industrial do plasma, as conclusões do relatório [do grupo de trabalho] carecem de maior desenvolvimento e estudo”, diz o Ministério da Saúde. Na resposta que deu às perguntas do CDS, o gabinete do ministro explica que o grupo de trabalho analisou vários parâmetros para determinar as condições técnicas e cientificas que o Laboratório Militar precisaria para produzir medicamentos à base de plasma, tal como o método de fraccionamento, volume e investimento.

Para que esta pudesse ser uma realidade seria previso um investimento de 360 milhões de euros, faseado em oito anos, com custos operacionais de 20 milhões por ano. “Verificou-se que é um processo complexo e de elevada exigência tecnológica e científica, com um prazo de implementação nunca inferior a oito anos para a fase de produção, com a construção de uma fábrica, exigindo um parceiro estratégico” que reduzisse tempo e custos relacionados com a investigação.

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