Fugir à tentação eleitoral

É indispensável que a reavaliação dos benefícios fiscais seja isso mesmo e não se transforme numa tentação eleitoral.

Este ano, deixarão de entrar nos cofres do Estado quase 11 mil milhões de euros. É o preço que pagamos pelos benefícios fiscais existentes e que se encontram previstos, não só no Estatuto dos Benefícios Fiscais, mas também espalhados por diversos códigos.

É um número que impressiona. Representa um quarto da receita fiscal que o Estado espera arrecadar e equivale a cerca de 90% do que conta obter por via do IRS. Na prática, o número diz-nos de forma demagógica e simplista que, se se decidisse acabar com todos os benefícios, não seria preciso pagar IRS. O número impressiona também porque, depois do programa de ajustamento, durante o qual esta despesa caiu significativamente, está novamente a crescer de forma significativa.

Mas se os benefícios fiscais acabassem, mesmo em troca do IRS, haveria um custo a pagar. Estes benefícios têm objectivos vários que podem ir desde o apoio à criação de emprego, passando pelo fomento das energias renováveis ou a capitalização das empresas. E o seu fim traria um custo para a sociedade.

A questão é, então, saber se o preço que pagamos por estes benefícios cumpre o propósito para que foram criados. E é isso que o actual secretário de Estado dos Assuntos Fiscais anuncia na entrevista que publicamos hoje. O Governo quer reavaliar os benefícios existentes. Tudo feito sem que daí resulte uma alteração do nível das receitas fiscais. Tudo feito em nome de uma maior simplificação do sistema fiscal.

É impossível não estar de acordo. Basta recordar uma recente auditoria da Inspecção-Geral de Finanças na qual se avaliava o benefício à criação de emprego e na qual se concluía que não se revelava eficaz para a criação de emprego efectivo. A necessidade de reavaliar os benefícios não é, aliás, um imperativo recente. Já em 2005 um grupo de trabalho similar ao que o Governo agora pretende nomear apresentou várias recomendações, uma delas que se encontra ainda em vigor: uma parte significativa dos incentivos previstos no Estatuto dos Benefícios Fiscais caducam passado cinco anos. E já este ano o Conselho Económico e Social veio defender esta reavaliação, entre outras razões, pelo facto de a despesa estar associada a um número reduzido de benefícios e de beneficiários.

O Governo tem a vontade expressa de realizar esta reavaliação e garante que o quer fazer obtendo o apoio do Parlamento. Fazê-lo a caminho de um período eleitoral não vai facilitar a tarefa. É indispensável que esta reavaliação seja isso mesmo e não se transforme numa tentação eleitoral.

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