Tubarões-azuis fotografados ao lusco-fusco na costa portuguesa

No Algarve, um grupo de tubarões-azuis foi visto, por mergulhadores, na sua fase mais activa do dia: o anoitecer. Dessa aventura resultou uma fotografia que ganhou uma das menções honrosas de um concurso de fotografia de natureza.

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A fotografia chama-se Azuis na noite e foi tirada ao anoitecer João Rodrigues
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João Rodrigues

Oito de Setembro de 2017. Já anoitecia e o mergulho a dez milhas náuticas a sudoeste do cabo de São Vicente, no Algarve, durava há mais de duas horas. João Rodrigues e Rodrigo Clímaco, ambos biólogos marinhos e mergulhadores, e Fernando Felicidade, ex-pescador e guia turístico, estavam na companhia de sete tubarões-azuis. A sua missão era conseguir uma fotografia, mas a corrente estava forte. Tudo aconteceu na última meia hora: Rodrigo Clímaco segurou com uma mão o cabo de segurança e com a outra o sistema de mergulho de João Rodrigues, que ficou com as mãos livres para tirar fotografias. Foi na última investida de dois tubarões-azuis que conseguiram uma imagem agora distinguida com uma menção honrosa no concurso de fotografia Cinclus 2018 – Generg Fotógrafo de Natureza do Ano na categoria Fauna. João Rodrigues diz que é o primeiro fotógrafo subaquático português a publicar uma imagem destes animais nesta altura do dia no país.

Este concurso de fotografia premeia fotógrafos amadores e profissionais de natureza portugueses e pertence ao Cinclus – Festival de Imagem de Natureza de Vouzela. Divide-se em sete categorias, como a Paisagem, Flora e Fungos e Aves. Para cada uma, há um primeiro e segundo prémios e menções honrosas. E há ainda o grande prémio, que, nesta edição, foi para Linhas frias, pontos quentes, de Manuel Malva. João Rodrigues refere que o mais importante para si foi o “reconhecimento”: “Contei a história da minha imagem.”

O biólogo marinho de 28 anos vive há dez anos em Faro, para onde foi estudar biologia na Universidade do Algarve. Agora intitula-se como um fotojornalista freelancer e tem o site Chimera Visuals. “As minhas imagens têm sempre uma mensagem.”

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O biólogo marinho João Rodrigues DR

A fotografia subaquática entrou na sua vida há cerca de dois anos, quando trabalhou como mergulhador de segurança na equipa da série documental da BBC, Planeta Azul II. “Foi a trabalhar entre os grandes que cresceu a vontade de fotografar o património natural do Algarve.” João Rodrigues participou nas filmagens do episódio Azul Profundo (o quarto) em 2015 nos Açores. “Estive a assistir e a zelar pela segurança do operador de câmara em acção, enquanto a equipa filmava uma baleia-comum morta. Esse foi o meu primeiro mergulho com tubarões que estavam a comer uma baleia com 15 metros”, conta.

Por isso, decidiu fotografar tubarões-azuis no Algarve. O mergulho de Setembro era para ser ao largo da praia do Burgau, em Vila do Bispo. Quando estavam a ir para lá, ouviram pescadores a dizer, via rádio, que a sudoeste do cabo de São Vicente havia tubarões-azuis. Foram para lá. O mergulho decorreu por volta das 18h até cerca das 20h30. Ao todo, encontraram sete tubarões. “Eram todos juvenis, que são mais rápidos, ariscos e destemidos.” Mergulharam numa zona em que o fundo marinho estava a 200 metros, mas ficaram a cerca de 15 metros da superfície. 

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João Rodrigues mergulhou a dez milhas náuticas a sudoeste do Cabo de São Vicente João Rodrigues

“O que torna interessante [o mergulho] são as investidas dos tubarões porque vêm da escuridão. São curiosos e gostam de nos tocar quando vêem objectos mais brilhantes, como o nosso equipamento de mergulho”, descreve João Rodrigues. “Não há razões para medo. São das espécies mais tranquilas do grupo dos tubarões.” A fotografia distinguida (Azuis na noite) foi então captada nos últimos momentos do mergulho e nela aparecem dois tubarões juvenis, um com 1,7 metros e o outro com um metro.

O que torna a fotografia especial? “Mergulhar com tubarões nesta fase do dia dá-nos uma interacção muito mais dinâmica e imprevisível”, responde, dizendo que foi possível ver o seu habitat natural de uma forma ainda pouco explorada. Os mergulhadores quiseram encontrá-los assim na sua fase mais activa do dia. “Os tubarões tendem a caçar durante o início da noite, quando a visão nocturna se encontra no seu auge”, explica João Rodrigues. Essas são as conclusões de um estudo científico da Universidade de St. Andrews (Reino Unido), que refere ainda que a temperatura corporal destes predadores tem um papel crucial na caça. De forma geral, ao anoitecer, a temperatura do corpo dos tubarões é mais elevada do que a das suas presas (como peixes pelágicos), o que lhes dá vantagem.

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O tubarão-azul é conhecido pelo seu corpo esguio João Rodrigues

Mais fotógrafos portugueses se têm destacado com fotografias de tubarões-azuis. Por exemplo, em 2011, Nuno Sá venceu com a imagem de um tubarão-azul nas águas dos Açores o primeiro prémio da categoria Grande Angular do maior concurso mundial de fotografia aquática, o Grande Prémio Mundial de Fotografia Subaquática Epson. Nesse ano, também foi distinguido com um “alto louvor” com a fotografia de um tubarão-azul ao largo do Faial no concurso Fotógrafo de Natureza Selvagem do Ano da Veolia. O tubarão-azul também lhe valeu nesse ano um primeiro prémio na categoria Oceanos nos Prémios Internacionais Windland Smith Rice, o concurso mais importante de fotografia de natureza dos Estados Unidos.

Outro dos objectivos de João Rodrigues é mostrar as ameaças que estes tubarões correm. A Prionace glauca é uma das espécies mais abundantes no Atlântico e presente na costa portuguesa. De coloração azul, corpo alongado e esguio, pode chegar aos quatro metros de comprimento. Mas tem perigos à vista como a pesca em excesso. A espécie está classificada pela União Internacional para a Conservação da Natureza com o estatuto de “quase ameaçada”.

João Rodrigues já tem outro projecto na manga para mostrar o mundo subaquático do Algarve e chamar à atenção para a necessidade da sua conservação. No próximo dia 25 de Fevereiro inaugura a exposição fotográfica Águas Vivas no Fórum Algarve, em Faro. Nessa exposição estarão duas espécies de cavalos-marinhos, o polvo-comum ou o tubarão-azul. “Preciso mostrar à população a beleza dessas espécies e o tesouro que se está a perder.”

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