Polónia, o maior de todos os paradoxos do Holocausto

Se na Polónia houve milhares de vítimas dos nazis, e se houve movimentos de resistência contra o regime alemão, também houve milhares de colaboracionistas e informadores entre os polacos, e alguns levaram a cabo massacres de judeus.

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A entrada de Auschwitz-Birkenau Adriano Miranda/PÚBLICO/Arquivo

“O caso da Polónia é talvez o maior de todos os paradoxos do Holocausto”, escreveu o historiador Gunnar S. Paulsson. “Por um lado, dos mais de três milhões de judeus polacos que caíram nas mãos dos nazis, só sobreviveram cerca de 3%, o que põe a Polónia no fim da lista dos países europeus”, nota. “Por outro lado, na lista de países nos quais pessoas arriscaram a vida para ajudar judeus, a Polónia está no topo de todos”.

Vítimas e resistentes

A Polónia foi invadida pela Alemanha em 1939 e os nazis construíram e geriram vários campos de concentração e seis de extermínio, como Auschwitz-Birkenau.

Na sequência da invasão e ocupação da Polónia pela Alemanha nazi – considerada uma das mais brutais da II Guerra - morreram 2,77 milhões de polacos e ainda 2,9 milhões de judeus polacos.

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Em Auschwitz-Birnekau milhares de judeus e outros prisioneiros do regime nazi foram forçados a trabalhar ou enviados para as câmaras de gás Adriano Miranda/PÚBLICO/Arquivo

Os polacos são a nacionalidade com mais cidadãos distinguidos pelo museu Yad Vashem por salvar vidas de judeus durante a guerra – 6706 cidadãos (num total de 26.513). Muitos polacos foram mortos por terem escondido judeus nas suas casas (a pena era a morte de todos os habitantes da casa).

A Polónia foi também o país com o maior movimento de resistência aos ocupantes nazis. O Armia Krajowa (Exército Nacional) era a mais importante força de resistência e era leal ao governo polaco exilado em Londres, chegando a ter cerca de 300 mil combatentes depois de ter absorvido a maior parte de outros movimentos de resistência.

Perpetradores

A Alemanha autorizou uma única força armada polaca, a polícia. Conhecida como a Polícia Azul, tinha entre os seus deveres tarefas como manter a ordem e regular o trânsito, mas também assegurar que eram cumpridas as regras dos guetos de judeus, incluindo sujeitá-los a fome, e levando também a cabo execuções, algumas sob ordens directas dos alemães, outras não.

Muitos polacos aproveitaram a situação da altura para tirar vantagens para si próprios. Existe uma palavra, szmalcownik, para designar os que informavam sobre os judeus escondidos para obter recompensas, ou chantageavam os próprios judeus ou os polacos que os escondiam.

O número de colaboracionistas polacos é de “muitos milhares”, diz o “caçador de nazis” Efraim Zuroff do Centro Simon Wiesenthal.

A participação de polacos em massacres sem ordens dos nazis é ainda alvo de algum debate. Por exemplo, em 2010 um livro do sociólogo americano de origem polaca Jan Thomasz Gross, Vizinhos (ed. Pedra da Lua), faz a reconstrução do episódio em Jedwabne que cerca de 1600 judeus (homens, mulheres, crianças) foram levados até a um estábulo e mortos. Quem os levou e incendiou o estábulo foram os outros polacos, seus vizinhos.

O pós-Holocausto

Alguns massacres ocorreram já depois do final da guerra. Em Kielce, a 4 de Julho de 1946, 40 sobreviventes do Holocausto foram mortos por habitantes em raiva que os responsabilizavam pelo desaparecimento de uma criança não judia. O episódio acelerou a imigração de judeus polacos para Israel, que temeram mais violência.

A Polónia era um dos países com maior população judaica antes da II Guerra, cerca de três milhões de judeus, e tem hoje no máximo dezmil (o que não é muito especialmente se comparado com a Alemanha, onde há hoje 275 mil judeus). 

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