Sede do PAIGC cercada pela polícia

O partido deveria começar esta tarde o seu nono congresso, cuja legalidade é contestada pelos tribunais. O ministro dos Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, de visita a Cabo Verde já comentou a situação apelando a "todas as partes" para que o processo guineense se desenrole em "condições de inclusão, estabilidade e paz".

Foto
Domingos Simões Pereira, líder do PAIGC, está fora da sede e pede apoio de organismos internacionais para que o congresso se realize adriano miranda

A sede do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), que deve iniciar nesta terça-feira o seu nono congresso, está cercada pela polícia, que impede a saída ou entrada no edifício, disse à Lusa o secretário nacional do partido, Aly Hijazi.

O também presidente da comissão organizadora do congresso, a decorrer até 4 de Fevereiro, disse ainda que "a sede do partido está sequestrada", tendo lá dentro mais de 200 pessoas, entre militantes e dirigentes.

Na segunda-feira, em conferência de imprensa, um responsável do comissariado-geral da Polícia de Ordem Pública (POP), o coronel Salvador Soares, disse aos jornalistas que os agentes iriam fazer cumprir as orientações judiciais que mandam impedir a realização do congresso.

Segundo a Polícia, pelo menos três tribunais regionais emitiram providências cautelares a impedirem a realização do congresso do PAIGC.

O partido tem outra interpretação e adianta que o Ministério do Interior, que tutela a Polícia de Ordem Pública, se recusou a receber uma nota de um tribunal que voltou atrás com a decisão de impedir o início do congresso.

O presidente da comissão organizadora do nono congresso do PAIGC, que deverá ter início à tarde, disse que, a partir das três da manhã, a polícia não deixou ninguém entrar ou sair da sede do partido, onde se encontravam militantes nos preparativos.

"Estamos encurralados por todos os lados pelos elementos da polícia", declarou Aly Hijazi. O mesmo responsável afirmou ainda que "pelo menos" 11 militantes foram agredidos pela polícia, por, alegadamente, terem entrado em discussão com os agentes.

O secretário nacional do PAIGC indicou que, "para já", há água e luz eléctrica da rede pública na sede, mas o problema, disse, é arranjar comida para mais de 200 pessoas, com a sede cercada pela polícia.

O país vive uma crise política desde 2015, com o PAIGC dividido. O Presidente José Mário Vaz, que foi eleito pelo PAIGC, demitiu o primeiro-ministro Domingo Simões Pereira, líder do partido. Desde então, nomeou uma série de líderes do Governo, que foram sendo demitidos sucessivamente - o último foi Sissoco Embaló, exonerado do cargo já este mês.

Aly Hijazi avançou que Domingos Simões Pereira, que está fora da sede, tem-se desdobrado em contactos com os organismos internacionais, tanto os sediados no país, como os do estrangeiro, para lhes explicar a situação e pedir apoio.

Na segunda-feira, o comissariado-geral da Polícia de Ordem Pública disse que não recebeu a ordem do tribunal que autoriza o congresso pelo que “a lei será cumprida”. A POP diz que só poderá autorizar a realização do congresso se receber nova ordem do Tribunal Regional do Norte, com sede em Bissorã.

A polícia diz ter recebido “mais duas providências cautelares”, uma de um tribunal de Buba, Sul do país, e outra de Bafatá, Leste da Guiné-Bissau, que ordenam a suspensão do congresso. O coronel Salvador Soares afirmou que os agentes “vão ter de cumprir as decisões do tribunal”.

As três providências cautelares teriam sido intentadas por militantes do PAIGC que se consideram excluídos injustamente das conferências de base que determinaram a escolha de delegados ao congresso.

Carlos Pinto Pereira, um dos advogados do PAIGC, destacou na segunda-feira que o partido não tinha sido notificado sobre a existência de mais providências cautelares, tirando a do Tribunal Regional do Norte. Entende, por isso, que nada impede a realização do congresso que terá como lema: "PAIGC unido na disciplina, pelos ideais ao serviço da paz e estabilidade e desenvolvimento da Guiné-Bissau”.

Até aqui, Domingos Simões Pereira é o único candidato, para renovar o mandato, embora não seja de excluir as candidaturas de outros militantes no decurso do congresso que está a marcar a actualidade política guineense.

Os ausentes da reunião serão os 15 deputados expulsos do partido em 2015 mas que, entretanto, foram readmitidos pela direcção a tomar lugar no congresso. Segundo o coordenador do também designado grupo dos 15, Braima Camará, está fora de questão a participação dos deputados no congresso sem que todos os militantes sancionados sejam também admitidos a participar.

Um outro "notável" do PAIGC que não estará presente na reunião, pelo menos na qualidade de delegado, será Carlos Gomes Júnior, antigo primeiro-ministro e ex-líder do partido durante 12 anos.

Residente entre Portugal e Cabo Verde, desde que foi derrubado por um golpe militar, há cinco anos, Gomes Júnior regressou ao país na semana passada, tendo solicitado à direcção do PAIGC que lhe seja permitido participar no congresso como delegado. O pedido foi rejeitado.

O PAIGC pediu a presença de 150 soldados da força da Ecomib (contingente militar da África Ocidental) estacionada na Guiné-Bissau na sequência do golpe de Estado de 2012, para garantir a segurança durante o congresso.

Santos Silva: "As questões políticas devem ser decididas politicamente”

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, que hoje cumpre o segundo dia de uma visita a Cabo Verde, reagiu aos mais recentes desenvolvimentos na Guiné-Bissau dizendo que "as questões políticas devem ser decididas politicamente" e apelando a "todas as partes" para que o processo guineense se desenrole em "condições de inclusão, estabilidade e paz".

"As questões políticas devem ser decididas politicamente. A Guiné-Bissau conseguiu o acordo de Conacri, que é um roteiro muito importante para que os processos político e eleitoral se desenvolvam com a normalidade possível”, disse o chefe da diplomacia portuguesa aos jornalistas.

“Enfatizamos muito a importância de todas as partes seguirem esse roteiro e chegarem aos entendimentos necessários para que a Guiné-Bissau possa viver um período de paz, estabilidade e para que seja o eleitorado da Guiné-Bissau a resolver, pelos canais próprios e nos momentos próprios, as escolhas que é preciso fazer", acrescentou ainda Augusto Santos Silva.

A Guiné-Bissau vive uma crise política desde a demissão pelo Presidente José Mário Vaz, do Governo liderado pelo primeiro-ministro Domingos Simões Pereira, em Agosto de 2015.

Por falta de consenso entre as várias forças políticas, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) elaborou o Acordo de Conacri, que prevê a nomeação de um primeiro-ministro de consenso.

No entanto, o Presidente guineense disse na segunda-feira que esse consenso não existe e que ele próprio vai nomear um chefe de Governo esta semana, que será o sexto desde 2012.

Notícia actualizada: Declarações do ministro Augusto Santos Silva 

 

Sugerir correcção
Comentar