O que é que um par de meias brancas e Ricky Martin têm a ver com Angola?

Ex-procurador Orlando Figueira está a ser interrogado em tribunal no âmbito da Operação Fizz pelo quarto dia consecutivo.

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Orlando Figueira, ex-procurador do Departamento Central de Investigação e Acção Penal Rui Gaudêncio

O conteúdo de um bloco de notas do antigo procurador Orlando Figueira, suspeito de ter sido corrompido pelo ex-vice-presidente de Angola Manuel Vicente, foi lido nesta quinta-feira de manhã em tribunal.

E o que dizia? Apesar de ser um documento pessoal, o procurador escrevia em código para si próprio. E escreveu o seguinte, numa anotação que se presume ter sido feita em 2011, altura em que era titular da maioria dos processos do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) envolvendo interesses angolanos: “Ricky Martin está envolvido na lavagem de um par de meias brancas”.

Quem era Ricky Martin? Que par de meias era este? O ex-procurador não soube responder, diz que já não se recorda. Certo é que a anotação estava relacionada com casos que o magistrado na altura tinha em mãos, em especial uma mega-fraude praticada contra o tesouro angolano. E com o empresário Álvaro Sobrinho. Noutra anotação, Orlando Figueira escreveu que o procurador-geral da República de Angola “foi obrigado pelo general Kopelipa a assinar documentos”.

Como o soube? “De certeza através do próprio procurador-geral, com quem me reuni muitas vezes” em serviço, respondeu o arguido.

É o quarto dia consecutivo em que Orlando Figueira presta declarações. Depois de uma longa exposição em que defendeu várias vezes que quem devia ser arguido era o banqueiro Carlos Silva, que foi quem o aliciou, segundo conta, a sair do DCIAP para trabalhar para si como consultor do seu grupo privado, o magistrado está desde quarta-feira à tarde a ser interrogado pelo Ministério Público. E não tem hesitado em corrigir a procurador que lhe está a fazer perguntas: “Está a fazer confusão, dra!”. Nem em contra-interrogar a magistrada sobre detalhes das várias investigações que dirigiu, numa altura em que Cândida Almeida dirigia o DCIAP. 

“Não sei o que vossa excelência está a insinuar”, lançou à procuradora após mais uma pergunta, negando uma vez mais ter tido algum tipo de envolvimento com Manuel Vicente, que, segundo a acusação, pagou ao magistrado para que este arquivasse dois processos em que era suspeito, arranjando-lhe a seguir empregos fictícios no sector privado para justificar transferências de dinheiro para as suas contas bancárias. 

A troca de galhardetes chegou ao ponto de acusar a procuradora de não perceber o que está em causa: “A dra. ou não interioriza ou não compreende!” Foi necessária a intervenção do juiz que dirige os trabalhos para serenar os ânimos. “Não me chame limitada na apreensão das coisas”, avisou, por seu, turno a magistrada.

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