“Podemos declarar vitória? Ainda não”, afirma Draghi

Presidente do BCE diz que estímulo monetário à economia está para durar e deixa implícita uma crítica aos comentários que os responsáveis da Administração Trump fez sobre o dólar.

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Mario Draghi Reuters/Kai Pfaffenbach

Com o euro a atingir um máximo dos últimos três anos face ao dólar e a ameaçar a competitividade das empresas europeias, o presidente do Banco Central Europeu (BCE) voltou nesta quinta-feira a fazer um esforço para convencer os investidores de que a política monetária expansionista na zona euro ainda está bem longe de chegar ao fim.

Nos mercados, durante as últimas semanas, ganhou mais força a ideia de que, com a retoma da economia europeia confirmada, o BCE poderia, já numa das suas próximas reuniões, anunciar que, em Setembro, em vez de voltar a prolongar o seu programa de compras de dívida pública (que passou de 60 mil para 30 mil milhões de euros ao mês a partir deste ano), poderia pará-lo imediatamente, abrindo a porta a uma subida de taxas logo a seguir.

O problema para o BCE é que a expectativa de um fim mais apressado da política expansionista tem como consequência imediata nos mercados uma apreciação do euro face ao dólar (principalmente quando do lado dos EUA não surgem sinais de haver vontade de segurar a divisa), o que resulta não só numa perda de competitividade externa das empresas da zona euro, como numa redução da inflação proveniente dos produtos importados.

Ora, aquilo que Mario Draghi mostrou na conferência de imprensa que se seguiu à reunião do conselho de governadores desta quinta-feira foi que o BCE não quer ver nesta fase o euro a travar a retoma da actividade económica e o regresso da inflação aos níveis pretendidos pelo banco central (perto de 2%).

O presidente do BCE tentou, sempre que a oportunidade surgiu, passar a mensagem de que, embora a economia esteja a dar sinais positivos, ainda não está garantido que, principalmente no que diz respeito à inflação, a zona euro está a chegar onde se pretende. “Podemos declarar vitória? A resposta é não, não ainda”, disse Mario Draghi, salientando que “as pressões de preços estão controladas e a inflação subjacente não dá sinais de movimentos ascendentes convincentes”.

Em relação aos salários, que o BCE já afirmou várias vezes que gostaria de ver a crescer mais, Draghi disse que “os dados confirmam uma subida face ao segundo trimestre de 2016”. No entanto, salientou, “até agora não são o resultado de negociações, pelo que precisamos de saber se esse resultado se confirma”.

Alguns minutos antes, no comunicado publicado no final da reunião, o BCE tinha mantido exactamente na mesma a política anunciada, nomeadamente a compra de 30 mil milhões ao mês de dívida pública até pelo menos Setembro e a manutenção das taxas de juro ao nível actual até “bem depois” do fim do programa de compras. “Não houve uma grande mudança, o que nos levou simplesmente a reafirmar a nossa política”, explicou Draghi, que fez questão de salientar que “mesmo quando o BCE considerar que houve progressos no ajustamento, a política monetária vai continuar a ser expansionista”.

Mário Draghi não escondeu a sua preocupação com a recente apreciação do euro face ao dólar e deixou no ar algumas críticas aos responsáveis políticos nos EUA. Disse que as variações cambiais relacionadas com a força relativa de cada economia "são normais", mas defendeu que parte da subida do euro se deveu "ao uso de linguagem na discussão dos desenvolvimentos das taxas de vâmbio que não reflectem os termos de referência que tinham ficado acordados". na última reunição do Fundo Monetário Internacional, os líderes das grandes potências económicas tinham acordado evitar desvalorizações competitivas das suas divisas, no entanto, esta quarta-feira, o secretário do Tesouro norte-americano disse, em Davos, que a depreciação do dólar trazia vantagens para a economia norte-americana.

Em relação ao programa de compra de dívida pública, Mário Draghi explicou o facto de em vários países o nível de compras estar a divergir do peso que tem no capital do BCE. O líder do banco central explicou que essas divergências tendem a ser corrigidas e deu o exemplo de Portugal como um dos países em que a falta de títulos de dívida para comprar conduziram a que o nível de compras ficasse abaixo do peso no capital. O peso das compras portuguesas, disse Draghi, tem sido de 1,8%, um valor 27% abaixo do peso de 2,48% que Portugal tem no capital do BCE.

 

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