Estreia de Centeno em ambiente de aproximação entre Berlim e Paris

Novo presidente do Eurogrupo vai iniciar, na primeira reunião esta segunda-feira, debate sobre a reforma do euro, cujo resultado pode marcar o seu mandato.

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Mário Centeno assume agora as rédeas do Eurogrupo. Reuters/GONZALO FUENTES

Será num clima de esperança, trazida pelo sinais de entendimento entre as principais capitais europeias, mas também de incerteza, criada pelas dúvidas em torno da formação de um Governo na Alemanha, que Mário Centeno irá esta segunda-feira estrear-se como presidente numa reunião do Eurogrupo. O seu principal desafio, a reforma da zona euro, será um dos temas na agenda do encontro dos ministros das Finanças em Bruxelas, dando início a um processo que se irá ainda prolongar por meses e que irá marcar o mandato do ministro português.

Para já, neste primeiro encontro depois da cimeira de 15 de Dezembro, o objectivo será “discutir como se irá organizar” nos próximos meses a discussão da reforma da zona euro. Não se pense contudo que estará em causa apenas uma mera definição de calendários. A grande questão que se irá já começar a colocar é se o debate será limitado ao aprofundamento da união bancária e à mudança das competências do Mecanismo de Estabilidade Europeu (MEE), como tem sido defendido pela Alemanha e pelo Conselho, ou se se alarga as discussões a outras questões como a criação de uma capacidade orçamental na zona euro ou a simplificação das regras orçamentais europeias, como é sugerido pela França e pela Comissão Europeia e apoiado por Mário Centeno.

Se na cimeira do euro realizada em Dezembro, acabou por sair a recomendação de discussão apenas dos temas onde as hipóteses de entendimento fossem maiores, a verdade é que nas últimas semanas foram surgindo sinais de esperança para quem acredita na possibilidade de avanços também noutras frentes, nomeadamente pelo facto de as várias partes mostrarem disponibilidade para ceder em áreas que antes preferiam não discutir.

A principal diferença aconteceu no princípio de acordo entre a CDU e o SPD para a criação de uma coligação governamental na Alemanha. Merkel e Schulz acertaram que um futuro Executivo incluiria na sua política europeia, para além de mais avanços na união bancária, também o apoio a medidas como um fundo de investimento.

Também relevante foi o facto de, na semana passada, um grupo de economistas franceses e alemães se terem unido para defender uma proposta comum de reforma do euro, que combina algumas das ideias de Macron com as preocupações expressas por Merkel. Entre as propostas dos economistas está a redução do crédito malparado, o lançamento de um seguro de depósitos europeu, a simplificação das regras orçamentais passando o foco dos limites aos défices para os limites ao crescimento da despesa pública, a criação de um processo de insolvência para os países e a criação de um fundo de apoio aos países em crise.

Entre os economistas franceses e alemães estão personalidades bastante próximas de Macron e Merkel.

Para medir estas possibilidades de entendimento, Mário Centeno visitou durante a semana passada Paris e Berlim, adaptando o seu discurso àquelas que são as principais preocupações dos respectivos governos. Em Berlim, na conferência de imprensa a seguir ao encontro com o ministro das Finanças alemão Peter Altmaier, Centeno aceitou a ideia de que na união bancária é preciso reduzir o risco se se quiser aumentar a sua partilha e ao mesmo tempo defendeu a necessidade de criar uma capacidade orçamental adicional na zona euro. No entanto, para tranquilizar quem o ouvia na Alemanha, esclareceu: “uma capacidade orçamental comum não implica transferências permanentes e não há propostas nesse sentido. E tem de ser tudo desenhado de uma forma que evite o risco moral (moral hazard em inglês)”.

Mas se, nesta fase, parece haver uma abertura em vários governos para a aproximação às propostas e preocupações dos outros, é também claro que são ainda muitos os riscos e dificuldades para chegar a um consenso importante. Um dos riscos mais evidentes é a possibilidade da coligação governamental entre a CDU e o SPD acabar por não se concretizar. Nesse caso, a criação de uma crise política grave na Alemanha teria como consequência, no mínimo, um adiamento de tomada de decisões relevantes.

Para além disso, não é ainda certo que, mesmo num cenário de entendimento franco-alemão, todos os outros Governos estejam dispostos a aceitar avanços em medidas de partilha de riscos na zona euro.

A estreia do novo presidente do Eurogrupo não será contudo apenas dedicada, nesta primeira reunião, ao tema da reforma da zona euro. Da agenda consta também a quase inevitável análise da situação na Grécia, o único país da zona euro que ainda está submetido a um programa da troika. O cenário nesta frente, contudo, está bastante mais desanuviado do que noutras ocasiões. O acordo obtido na última reunião do Eurogrupo e os sinais positivos dados pela economia grega fazem adivinhar um encontro com poucas críticas dos parceiros a Atenas.

Por fim, Portugal também irá estar na agenda, já que a Comissão Europeia irá apresentar aos ministros do Eurogrupo o seu mais recente relatório sobre o país. É verdade que do documento constam muitos elogios – a par de apelos para mais reformas e de dúvidas em relação às metas orçamentais deste ano – o que torna a posição de Centeno mais confortável. Mas ainda assim, esta coincidência de agenda pode forçar a que o novo presidente do Eurogrupo tenha, na conferência de imprensa a seguir ao encontro, de se pronunciar sobre os resultados obtidos pelo ministério que lidera em Portugal.

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