ADSE prepara alternativas a eventual boicote dos privados

Hospitais privados, dentistas e Ordem dos Médicos dizem que novas tabelas são “incomportáveis” e equacionam deixar de trabalhar com a ADSE.

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Rui Gaudencio

A direcção da ADSE garante que as novas tabelas de preços propostas aos privados não comprometem o acesso dos beneficiários aos cuidados de saúde, mas ainda assim está a trabalhar em soluções alternativas para responder à eventual saída de alguns hospitais privados da rede da ADSE (o sistema de assistência na doença dos funcionários e aposentados do Estado).

“[As novas tabelas] não comprometem de todo o acesso dos beneficiários a cuidados de saúde convencionados”, adiantou ao PÚBLICO o presidente do instituto que gere a ADSE, Carlos Liberato Baptista, assegurando que “tem previsto soluções alternativas para vir a contrapor a uma eventual situação desse género”.

O responsável não detalhou as alternativas que estão a ser preparadas, mas lembrou que “como alternativa final existe sempre o acesso em regime livre a todos os prestadores existentes no território nacional”. Do ponto de vista do beneficiário, há diferenças significativas entre recorrer a um médico com convenção e a um que não tenha acordo com o sistema. Num médico convencionado, o beneficiário paga menos de quatro euros por uma consulta de clínica geral ou de especialidade, enquanto num médico fora da rede, recebe uma comparticipação de 20,45 euros pela consulta, tendo de suportar o restante.

A nota deixada por Liberato Batista visa tranquilizar os receios dos beneficiários, face à ameaça de alguns prestadores e médicos deixarem de trabalhar com a ADSE. Na origem do diferendo está a nova tabela de preços que a direcção da ADSE apresentou aos privados e que visa reduzir em cerca de 42 milhões de euros os encargos do sistema e dos beneficiários com os cuidados de saúde. A proposta tem sido muito contestada pela Associação Portuguesa de Hospitalização Privada (APHP), pela Ordem dos Médicos e pela Ordem dos Médicos Dentistas por implicar preços “incomportáveis” e, em alguns casos, abaixo do custo.

Ciente dos riscos, o próprio Conselho Geral e de Supervisão (CGS) da ADSE (onde têm assento representantes dos beneficiários) que deu luz verde às novas tabelas alertou para a importância de aumentar a rede de prestadores convencionados e de garantir que os beneficiários não são preteridos na marcação de consultas ou de exames médicos. E no caso específico da medicina dentária, considera que “deve ser ponderada futuramente uma revisão, tendo em vista assegurar maior cobertura de serviços por parte da ADSE”.

Médicos deixam a ADSE

O problema é que alguns beneficiários já têm vindo a ser confrontados com algumas restrições no acesso a determinadas consultas e com a saída de médicos do sistema – uma situação para a qual a APHP já tinha alertado. É o caso de uma aposentada da função pública com quem o PÚBLICO falou e que, no início deste ano, ficou a saber que o seu cardiologista deixaria de trabalhar com a ADSE.

Mudar de médico causa transtorno a esta antiga dirigente da função pública, mas a sua principal preocupação é que haja “um esvaziamento” da ADSE e que os beneficiários questionem cada vez mais se vale a pena descontar 3,5% do salário ou da pensão para beneficiar do sistema. “Há médicos com nome que cancelam a convenção e algumas clínicas estão a pôr os juniores no atendimento aos beneficiários da ADSE e os médicos com nome fazem o atendimento para o privado”, relata.

Outra funcionária aposentada diz que os médicos de três especialidades a que costumava recorrer deixaram de ter convenção com o sistema e receia que outros se sigam. “Tenho um seguro e tenho que pensar se me vale a pena continuar na ADSE com esta política”, frisa na página de Facebook da Associação 30 de Julho, criada para defender os interesses da ADSE e que tem trabalhado com a Associação de Aposentados, Pensionistas e Reformados (Apre).

Liberato Batista recusa que haja um movimento significativo de saída de médicos da rede da ADSE. Em 2017, adianta, foram celebradas 11 novas convenções e foram rescindidas seis. No entanto, frisa, “o dado mais relevante a ter em conta é o número de locais de prestação e não as convenções, porque uma convenção pode comportar vários locais de prestação”.

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