Há mais quatro recomendações sobre os lesados do BES e Banif, falta começar a cumprir

Partidos uniram-se para aprovar recomendações ao Governo mas, no debate, direita e esquerda acusaram-se mutuamente sobre responsabilidades pela criação do problema e pela demora em solucioná-lo.

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LUSA/Gregório Cunha

Apenas nove dias depois de ser publicada em Diário da República a última recomendação do Parlamento ao Governo para que promova medidas que minimizem as perdas dos lesados não qualificados do BES e do Banif – que ficaram de fora do primeiro acordo –, a Assembleia da República aprovou nesta sexta-feira mais quatro resoluções com o mesmo objectivo. A intenção é encontrar uma solução, através de mecanismos extrajudiciais, que permitam aos emigrantes e outros investidores das duas instituições recuperarem parte ou a totalidade das suas poupanças, à semelhança do que foi conseguido para o papel comercial do BES.

As soluções aprovadas incluem a criação de um mecanismo arbitral, proposto por PSD e CDS; de um mecanismo extrajudicial com intervenção da CMVM (diploma do BE); e ainda uma solução criada pela CMVM, Banco de Portugal e Governo em conjunto com as associações de lesados (PS).  

Os quatro projectos de resolução não tiveram qualquer voto contra, mas o PS absteve-se nos diplomas do PSD e do CDS, enquanto o PSD se absteve nas propostas do PS e do Bloco. Estes diplomas foram levados a plenário acompanhando três petições de associações de lesados, que acompanharam a reunião do plenário desta manhã nas galerias.

No debate, embora todos os partidos tenham defendido a necessidade de encontrar soluções para os casos ainda sem resposta de lesados do BES/GES e do Banif, foram trocados argumentos entre esquerda e direita sobre responsabilidades e nível de preocupação com os investidores. Perante os ataques do PSD à falta de acção do Governo, Bloco, PCP e PS vieram defender acerrimamente o executivo. O socialista Paulo Pisco acusou os sociais-democratas de “falta de vergonha” por terem deixado os emigrantes por sua conta.

A deputada madeirense Rubina Berardo acusou o Governo de estar “há três anos com o dossier”, de se “esconder retoricamente no passado” e de fazer “regras à medidas para alguns recuperarem os seus créditos, deixando outros de fora”. Pediu “igualdade e equidade” no tratamento de todos os lesados, defendendo a proposta do PSD para a criação de um mecanismo arbitral célere que estabeleça o perímetro dos lesados não-qualificados para serem abrangidos por soluções comerciais, limitando assim a utilização de dinheiro público.

Os mesmos argumentos de “justiça e equidade” foram defendidos pela centrista Cecília Meireles, que argumentou que em muitos casos os clientes foram “enganados”, e que o Parlamento deveria ter criado um critério para abranger as diversas situações quando discutiu o fundo para a recuperação de créditos. Em vez de só se ter dado resposta a quem “protestou mais”. E criticou as propostas do PS e do BE, de deixar para a CMVM a tarefa de arranjar uma solução, que servirá como “boa desculpa para continuar tudo como está”.

Cecília Meireles também anunciou que o CDS vai pedir que sejam imediatamente discutidos na especialidade os projectos de vários partidos sobre produtos financeiros que estão na Comissão de Orçamento e Finanças há meses à espera para serem discutidos por faltar uma proposta do Governo. “Já chega de estarmos a remediar em vez de prevenir.”

“Ninguém suporta o aligeirar de culpas nem o empurrar com a barriga para fugir a responsabilidades”, apontou a socialista Hortense Martins à direita, realçando as iniciativas do Governo PS para uma larga fatia de investidores não qualificados do BES/GES, e salientando as falhas evidenciadas pelo sistema de regulação e intermediação financeira.

Mariana Mortágua defendeu que o esforço para indemnizar os lesados devia caber ao sistema financeiro, em particular à Lone Star e ao Santander, “a quem foram entregues as partes boas do BES e do Banif”, e atacou os “actos de hipocrisia do PSD que vem agora lavar a face” com uma recomendação ao Governo. “Não tem legitimidade para o fazer”, lembrando depois as culpas do PSD por ter chumbado projectos do Bloco para evitar a venda de produtos financeiros deste género ao balcão. Sobre as soluções, disse ser preciso um “equilíbrio jurídico entre situações muito diferentes”, daí a proposta do BE para a criação de um mecanismo extrajudicial, com a CMVM, que identifique os casos de prática fraudulenta.

O comunista Miguel Tiago trocou os termos por miúdos: trata-se de encontrar soluções para uma “burla”. E disse que não faz sentido estar de novo a fazer recomendações ao Governo quando ela já existe e foi publicada há dias. “O que temos de fazer é ter a certeza que é cumprida. De boas recomendações está o Governo cheio; o que importa é o que faz com elas.”

O deputado acusou o PSD de tentar “limpar o passado e as suas responsabilidades” e defendeu que o maior erro foi a maioria não ter apoiado as propostas do PCP para que se integrasse no Novo Banco o património do GES e do BES assim como o dos seus grandes accionistas – o “produto do roubo”, como lhe chamou – para se pagarem este tipo de dívidas aos pequenos investidores.

As petições dos lesados

  • A ABESD – Associação de Defesa dos Clientes Bancários pede em nome do movimento Emigrantes Lesados da Venezuela e do Movimento de Lesados da África do Sul quer uma solução da Assembleia da República em linha do que foi criado para os lesados do papel  comercial do BES, que não os abrangeu, para que se reponham os “direitos de todos aqueles que perderam as suas poupanças”.
  • A AMELP – Associação Movimento Emigrantes Lesados Portugueses Emigrantes, abrange maioritariamente lesados emigrantes residentes em países europeus que subscreveram  quatro produtos: Poupança Plus, EuroAforro, Top Renda e EG Premium. O Novo Banco já apresentou propostas para alguns destes produtos, mas para outros não. Neste grupo estão emigrantes que não aceitaram as propostas do Novo Banco.  A petição pede que “sejam levadas a cabo todas as práticas e mecanismos ao dispor da Assembleia da República para reposição dos direitos dos emigrantes, por ser de elementar justiça”.
  • A ALBOA – Associação de Lesados do Banif pretende maior responsabilização das entidades que vendem produtos financeiros a clientes particulares (não qualificados) e a criação de meios alternativos de defesa (tribunais arbitrais), que não podem prejudicar a actuação em tribunais comuns.
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