Digitalização com ética e sem pés de barro

Questionário feito pela PwC a 50 gestores ligados ao mar revela unanimidade na importância atribuída a avanços na integração e utilização tecnológica. Sectores do transporte e da acção de Estado são os que revelam maior impacto.

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Ana Paula Vitorino apresenta esta quinta-feira a oitava edição do LEME. LUSA/MIGUEL A. LOPES

O entendimento de que é importante fazerem-se maiores avanços na chamada digitalização da Economia do Mar é praticamente unânime num sector, que é tão vasto e diversificado quanto o mar em que assenta. Essa quase unanimidade foi aferida num inquérito que a consultora PwC efectuou a meia centena de gestores e personalidades ligadas à Economia do Mar, e que apontou também para as preocupações que existem no sector: é importante pensar na digitalização que se pode e se quer fazer, para que ela não avance sem contraditório nem navegue em sentimentos de inevitabilidades.

Este questionário integra o Barómetro que a PwC editado todos os anos sobre a Economia do Mar, o Barómetro LEME, e que na edição de 2018 – a oitava edição, e que é apresentada publicamente esta quinta-feira – incide precisamente sobre "A Revolução Digital e a Economia do Mar". O questionário foi apresentado a 50 gestores e personalidades ligadas ao mar, abrangendo de uma forma transversal todos os subsectores desta economia em Portugal. O resultado deste questionário revelou que 90% dos gestores de topo e personalidades da economia do mar inquiridos no âmbito do LEME consideram que a revolução digital terá um grande impacto na actividade. Mas revelou, também, que embora o interesse pelos temas da transformação digital tenha aumentado consideravelmente no seio da comunidade marítima portuguesa e as acções no terreno também já tenham arrancado, o conhecimento dos riscos associados a ciberataques e sua mitigação é ainda incipiente.

“Talvez o Mar possa dar o exemplo e avançar com uma digitalização assente em ética, que contrarie os chamados pés de barro. E aqui estamos a falar de questões de cibersegurança mas não só”, sintetiza, em declarações ao PÚBLICO, o coordenador deste inquérito, Miguel Marques, consultor da PwC responsável pela divulgação do LEME.

Uma das grandes preocupações encontradas pelo consultor é a de que, apesar de estarmos habituados a saltos tecnológicos, há uma sensação “algo estranha” de que as coisas estão a avançar sem contraditório, sem debate. “As coisas estão a alterar-se rapidamente e sem qualquer discussão., entram no terreno como se fossem manteiga. Estaremos a assistir a uma revolução de paradigma sem contraditório? Até a globalização teve debate e contraditório. A digitalização não está a ter, e nós gostávamos que o Mar fosse um exemplo de respeito e de ética”, sintetiza Miguel Marques, frisando que este é um discurso “prático e pragmático” e nunca “moralista” ou “obstrutivo”.

O tema da revolução digital encerra diversos tópicos e a economia do mar pode ser dividida em vários sectores e fileiras. Como se lê no estudo, “embora a divisão do todo que é a revolução digital em tópicos seja difícil e, muitas vezes, as divisões por tópicos não coincidam de especialista para especialista”, a PwC perdeu algum tempo a estabelecer esses tópicos, numa espécie de exercício em que dividiu a revolução digital em 12 fatias. Entre elas encontramos o Big Data Analytics (Análise de dados em massa através de ferramentas informáticas), o Machine Learning & Artificial Intelligence (Algoritmos de inteligência artificial que permitem retirar informação útil a partir de dados), o Data Integration (Informação integrada em todos os elos da cadeia de valor de uma indústria ou de um processo) ou os Smart Sensors (sensores que recolhem, analisam e enviam dados). Nos sectores da economia do mar encontramos o sector dos transportes, da construção naval, do turismo ou da pesca.

O propósito a que a PwC se votou foi perceber, por cada fileira da economia, qual o grau de impacto de cada tópico. Na opinião dos líderes inquiridos neste estudo, todas as indústrias do mar sofrerão um elevado impacto provocado pela revolução digital, sendo que Portos, Transportes Marítimos e Acção do Estado no Mar são as áreas afectadas pela quase totalidade dos doze temas inerentes à revolução digital. Partilharam também a opinião de que, Big Data Analytic, Internet of Things e Smart Sensors, são os temas da revolução digital que afectarão o  maior número de indústrias do mar.

A análise de dados em massa através de ferramentas informáticas (Big Data Analytic), a disponibilização de serviços que permitam executar tarefas através da internet, por exemplo ligar uma câmara de vídeo que monitoriza uma aquacultura (Internet of Things) ou a utilização de sensores que recolhem, enviam, analisam e processam dados (Smart Sensors), estão no topo da lista das necessidades do crescimento da economia azul.

O LEME constrói indicadores sobre a evolução da economia do mar em Portugal desde 2010 e as conclusões desta série de oito anos mostram uma economia sempre a crescer mais do que a economia em geral. Nos anos de crise em que a economia registava taxas negativas no Produto Interno Bruto, ou próximas do zero, a economia do Mar continuou a registar crescimentos anuais de cerca de 50% das actividades monitorizadas. Nos anos de 2015 e 2016, em que a economia começou a dar sinais de redução da instabilidade, a percentagem de variáveis que cresceram, monitoradas pelo LEME, foi de 83% e 64%, respectivamente.

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