Estoril ergueu bancada em terreno cuja instabilidade era conhecida

Estrutura construída em 2014 tem por baixo um curso de água, mas projecto foi aprovado e bancada passou nas vistorias. Segunda parte do Estoril-FC Porto vai disputar-se no dia 21 de Fevereiro às 18h

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LUSA/MARIO CRUZ

Embora nenhuma das entidades que nesta terça-feira visitaram a bancada norte do Estádio António Coimbra da Mota, no Estoril, tenha adiantado uma explicação para os problemas de segurança que levaram à interrupção da partida entre os “canarinhos” e o FC Porto, na segunda-feira à noite, o facto de a estrutura estar construída num terreno por onde passa um ribeiro subterrâneo poderá relacionar-se com o abatimento registado naquela zona do estádio, que se encontrava preenchido por adeptos afectos aos “dragões”. O encontro vai concluir-se no dia 21 de Fevereiro às 18h, anunciou a Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP).

“O reagendamento deste encontro foi antecedido de outro encontro entre a LPFP, o Estoril-Praia e o FC Porto, com representantes da Câmara Municipal de Cascais (CMC), da Autoridade Nacional da Protecção Civil, do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), da GNR, e da empresa construtora da bancada norte do Estádio António Coimbra da Mota, durante o qual foi efectuada uma primeira visita à referida bancada. O LNEC irá proceder a uma visita técnica com vista à emissão de um parecer preliminar sobre a infra-estrutura, que será dado até final da presente semana”, podia ler-se num comunicado conjunto da LPFP e dos dois clubes.

Sem explicações por parte destas entidades, uma razão para o que aconteceu foi adiantada por João Sande e Castro, que integrou a CMC: “Em 2002, quando assumi a função de vereador do desporto no Município de Cascais, o Estoril-Praia tinha um projecto para uma piscina que estava parado há vários anos. O local indicado para a sua construção era de reserva ecológica e ficava em leito de cheia. Que este terreno era pouco estável saltava à vista: em 12 anos por três vezes foi necessário reparar abatimentos no solo dos campos sintéticos contíguos”, escreveu Sande e Castro na rede social Facebook.

Contactado pelo PÚBLICO, o ex-presidente da Sociedade Anónima Desportiva (SAD) do Estoril-Praia, Tiago Ribeiro – que estava no cargo quando foi construída a bancada norte, para corresponder aos requisitos da UEFA devido à participação do clube na fase de grupos da Liga Europa –, admitiu que a existência de um ribeiro subterrâneo no terreno era conhecida. “Nós sabíamos da existência da ribeira. Não só conhecíamos como, na nossa gestão, tivemos um problema com a bancada nascente, na época 2009-10 ou 2010-11, em que parte da bancada nascente, no extremo norte, cedeu. Abriu um buraco e ficou interditada. A CMC assumiu a obra e foi feita uma reestruturação”, recordou.

Contudo, a construção da nova bancada oferecia segurança a Tiago Ribeiro. “Foi feita no antigo peão do estádio, já estava tudo cimentado e há ali estacionamento onde ficam os camiões das televisões. Escolhemos uma empresa com currículo muito bom, que ofereceu soluções adequadas, e com a protecção civil foram recolhidos dados do terreno. Não é novidade construir em terrenos com leito submerso, acontece no mundo inteiro. Era conhecido dos engenheiros responsáveis pela construção da obra em si. Foi feito estudo de viabilidade, tudo foi adequado àquele tereno, com as particularidades que apresentava”, acrescentou o antigo responsável da SAD estorilista. O PÚBLICO contactou a Farcimar, empresa responsável pela obra, mas não foi possível obter esclarecimentos.

“O recinto foi sempre aprovado nas vistorias de início de época, para aprovação do estádio, pela LPFP. Pela Federação Portuguesa de Futebol também, até lá houve jogos da selecção. Da UEFA houve uma vistoria para qualificar o estádio, antes do início dos jogos da nossa segunda participação na Liga Europa. E em cada jogo havia um director de instalações que a UEFA enviava, que fazia de novo uma avaliação técnica. O recinto foi sempre aprovado”, reforçou Tiago Ribeiro.

Em declarações ao PÚBLICO, o ex-vereador João Sande e Castro deixou críticas ao “facilitismo”: “Pela pressão das próprias associações desportivas não são acauteladas as devidas matérias em termos de segurança”, afirmou Sande e Castro, indicando que os problemas na bancada norte que levaram à “cedência significativa da estrutura, talvez uns 3 ou 4 centímetros”, não seriam detectáveis numa vistoria de rotina. “As vistorias regulares não analisam fundações dos edifícios, analisam os extintores, saídas de emergência. Seria necessária uma análise aprofundada das fundações e estabilidade do terreno”, sublinhou.

A CMC, num comunicado do gabinete de imprensa, contestava alguns das questões levantadas pelo ex-vereador. “O alargamento do Estádio António Coimbra da Mota é uma obra que não carece de licenciamento, uma vez que se trata de um equipamento municipal. O projecto foi analisado por uma vasta equipa de técnicos qualificados, tanto da CMC como de organizações externas. O terreno onde está implementado o estádio está tipificado como Rede Agrícola Nacional. A RAN não exclui a construção de equipamentos, quadro legal em que se integra um estádio municipal (equipamento desportivo), instalado naqueles terrenos há mais de 70 anos”, podia ler-se.

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