Ministro da Cultura vai ao Parlamento com os atrasos do património na agenda

Luís Filipe Castro Mendes vai esclarecer os deputados sobre a transferência do antigo Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática para Xabregas, processo que leva já três meses de atraso. A obra de remate da Ajuda também está à espera de "autorizações".

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A DGPC terá de transferir para Xabregas 14 mil bens móveis que resultaram de escavações em contexto aquático Rui Gaudêncio

Luís Filipe Castro Mendes regressa esta terça-feira à comissão parlamentar de Cultura para falar de património arqueológico, tema que já vem sendo recorrente nas suas deslocações à Assembleia da República. Desta vez o ministro da Cultura estará presente “a convite” do PCP, que a 21 de Novembro apresentou um requerimento para que lhe fosse dado acesso, através do titular da pasta, a “toda a documentação relevante referente ao processo de transferência de instalações do Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática” do Mercado Abastecedor da Região de Lisboa (MARL), em São Julião do Tojal, Loures, para a futura sede, definitiva, na zona oriental de Lisboa, em Xabregas. Uma transferência que leva, para já, três meses de atraso em relação ao calendário anunciado ao PÚBLICO pelo subdirector-geral do Património no começo de Outubro.

Numa visita às instalações do MARL, João Carlos Santos disse, então, que o projecto da sua autoria para a reconversão dos armazéns de Xabregas na nova casa do antigo CNANS — formalmente o organismo não existe e os seus serviços estão afectos à Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) — estava pronto e que o concurso para a obra seria lançado em meados desse mês, o que não aconteceu ainda.

Orçada em 1,4 milhões de euros, segundo o ministro da Cultura, a empreitada deveria estar concluída até ao fim de Junho de 2018 para que a mudança começasse em seguida e fosse dada por terminada em Outubro.

Recorde-se que esta troca de instalações gerou polémica entre os arqueólogos, que sublinharam aos jornais, em diversos encontros profissionais e em cartas abertas a importância do património náutico e subaquático e acusaram o Estado de não cumprir a sua missão de salvaguarda, intervindo para garantir a mudança apenas meses depois de ter sabido que o MARL não renovaria o contrato de arrendamento.

Transferir o espólio à guarda do CNANS – 14 mil bens móveis, alguns deles implicando complexas condições de conservação – não é tarefa fácil nem barata, defendeu ainda em Outubro João Carlos Santos, explicando que a mudança deverá demorar, pelo menos, três meses.

Contactado pelo PÚBLICO agora, o subdirector da DGPC preferiu não prestar mais esclarecimentos quanto à obra que terá de preceder a mudança para Xabregas.

Sem deixar de reconhecer que o calendário anunciado não foi cumprido, João Carlos Santos fez saber apenas, através da assessora de imprensa da DGPC, Maria do Céu Novais, “que tudo está a decorrer normalmente”, e que os atrasos no CNANS, tal como na obra de remate do Palácio Nacional da Ajuda, cuja adjudicação se esperava até ao final de Dezembro, se devem ao facto de ambos estarem “dependentes de autorizações e outras formalidades que se prendem com a passagem do ano económico”.

Silêncio sobre a Ajuda

A 21 de Dezembro, quando faltavam somente seis dias úteis para o fim do ano, João Carlos Santos mostrava-se confiante quanto a um avanço favorável das obras no Palácio da Ajuda. “Dissemos que faríamos a adjudicação no segundo semestre de 2017 e vamos cumprir”, disse o subdirector da DGPC ao PÚBLICO. No entanto, isso não aconteceu.

João Carlos Santos é também o autor do projecto de arquitectura para a zona poente do palácio, onde vão estar em exposição as jóias da coroa, mas, segundo o protocolo assinado em Julho de 2016 entre a DGPC, a Câmara Municipal de Lisboa e a Associação de Turismo de Lisboa (ATL), é a esta última que compete “promover a realização dos estudos, projectos e obras”. Contactada pelo PÚBLICO, a assessoria de imprensa da ATL não quis prestar esclarecimentos, alegando que “oportunamente será feito o ponto de situação”.

O projecto está envolvido em algum secretismo, justificado pela DGPC com a necessidade de garantir a segurança futura das jóias da Casa Real. Mas esta atitude levou o Fórum Cidadania Lx a apresentar uma queixa à Provedoria de Justiça no fim do ano, na qual pedia a divulgação online de todos os documentos relevantes sobre a obra. O mesmo grupo de cidadãos tinha, algumas semanas antes, levantado dúvidas sobre a estabilidade dos terrenos e a segurança estrutural do palácio.

“O palácio não é construído sobre aterros, é construído sobre alicerces robustos”, garantiu João Carlos Santos a 21 de Dezembro. Nessa ocasião, o arquitecto apresentou ao PÚBLICO as conclusões dos trabalhos de arqueologia, desenvolvidos na primeira metade do ano passado. As escavações nada revelaram de extraordinário e não levaram “a nenhuma alteração significativa do projecto”, disse o subdirector.

Algumas questões que estão por esclarecer dizem respeito à calendarização da obra, ao seu orçamento (em 2016 estava previsto um gasto de 15 milhões de euros) e à forma como será financiada.

O mesmo se passa com o CNANS: um dos aspectos que o grupo parlamentar comunista quer ver esclarecidos hoje na Assembleia é precisamente o do financiamento do projecto, que o ministro disse, por diversas vezes, estar já garantido.

Em cima da mesa, ainda que fora da ordem do dia, poderá vir a estar também a petição Pela Defesa do Património Arqueológico Nacional, que foi lançada este domingo online e que sugere, entre outras coisas, que se estabeleça um Plano Arqueológico Nacional, algo que Portugal já teve quando a arqueologia tinha direito a um instituto só para ela na orgânica do Ministério da Cultura.

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