“Por que é que o SNS está de pantanas se a gripe ainda é ligeira"?

Consultor da Direcção-Geral da Saúde critica responsáveis que dizem que está tudo bem nos hospitais. "O SNS está na reserva, no limite", diz Filipe Froes.

Foto
“Se há plano de contingência que está a funcionar é o nosso”, diz o administrador Carlos Martins Paulo Pimenta

“Por que é que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) está de pantanas se a gripe ainda é ligeira”, pergunta o pneumologista Filipe Froes, que é consultor da Direcção-Geral da Saúde (DGS) para a área das infecções respiratórias e dos cuidados intensivos e trabalha em hospitais públicos desde 1986.

“Em perca há vários anos, o SNS está na reserva, no limite. O SNS vai nu”, sintetiza, em jeito de resposta. "Habituado a trabalhar sem condições", o médico que dirige a Unidade de Cuidados Intensivos Médico-Cirúrgicos do Hospital Pulido Valente (HPV) explica que o que o leva a expor publicamente as suas críticas é o facto de os responsáveis governamentais e dos hospitais afirmarem, “de forma continuada, que está tudo bem”.

“Não está. Quando já estamos no limite, qualquer acréscimo de procura provoca graves perturbações. A gripe provoca sempre dificuldades, mas ainda está no início, a actividade é ligeira. A resposta do SNS à gripe diz-nos mais sobre o estado do SNS do que sobre a gripe”, enfatiza.

Cansado de ler comunicados do Centro Hospitalar de Lisboa Norte (CHLN) — a que pertencem os hospitais Pulido Valente e Santa Maria — sobre a resposta montada para a epidemia de gripe, fez contas para concluir que, em vez das 40 camas que a administração disse ter aberto para o actual plano de contingência de resposta à gripe e frio, se se subtrair as camas que foram sendo encerradas antes, apenas estarão disponíveis mais 18. Só no Pulido Valente, contabiliza, perderam-se 54 camas, com o encerramento de 24 na Medicina III A e mais 30 na Medicina III B, elenca.

Encerram enfermaria e abrem contentor

Entretanto, continua, abriram mais 30 camas num antigo serviço de cirurgia vascular do HPV que estava encerrado. O problema, nota, é que nas antigas instalações agora fechadas as enfermarias eram mais modernas (tinham três camas) e as actuais são de cinco camas (o que significa que os doentes estão mais próximos, logo, têm maior risco de infecção hospitalar). Já no serviço III-B, que foi fechado e que tinha 30 camas, havia três em quarto individual, o que permitia isolar doentes com infecções multirresistentes ou com maior contágio. As actuais 30 camas só têm um quarto de isolamento, acentua.

Em simultâneo, foi aberto um contentor no Santa Maria — "sim, fechou-se uma enfermaria num hospital para abrir um contentor" — com 22 camas, conhecido por REME (Reumatologia, Endócrinas e Medicina) e que agora chamam o "pavilhão da contingência".  Filipe Froes lamenta ainda a "acentuada redução" de médicos especialistas.

“Se há plano de contingência que está a funcionar é o nosso”, rebate o presidente do conselho de administração, Carlos Martins, que desmente as contas do médico. Adiantando que o número de camas que o CHLN dispõe este ano para o plano de contingência é igual ao que tinha no ano passado (140 no total, sendo que, destas, 20 ainda não estão activas, permanecem de reserva), diz que 80 são camas contratualizadas para doentes já em condições de ter alta em instituições particulares de solidariedade social. Quanto ao pavilhão da contingência que funciona em contentores, nota que é o que tem sido usado todos os anos nesta altura.

Carlos Martins diz também não entender a crítica sobre a redução de profissionais. Este ano foi autorizada a contratação de 12 novos médicos e no ano passado tinham sido 51, sublinha. "Confunde-se médicos internos com médicos especialistas", responde Filipe Froes.

Para o administrador do CHLN, o médico está a olhar apenas para o serviço dele, quando os problemas nesta altura estão centrados no serviço de urgência — que atende sobretudo "pessoas idosas com patologias cruzadas complexas". E recusa-se a comentar mais afirmações de quem "não percorre os corredores do Santa Maria mas está na sua zona de conforto".

Notícia corrigida às 12h40: Filipe Froes dirige a Unidade de Cuidados Intensivos Médico-Cirúrgicos do Hospital Pulido Valente

Sugerir correcção
Ler 8 comentários