Constança Urbano de Sousa: “Somos um país de treinadores de bancada”

Antiga ministra da Administração Interna considera que o sexismo motivou parte das críticas de que foi alvo relativamente à gestão da resposta aos incêndios florestais de 2017.

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LUSA/MÁRIO CRUZ

A ex-ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, falou publicamente pela primeira vez após a saída do Governo em Outubro, na sequência dos graves incêndios florestais de 2017 e das críticas ao seu trabalho. Numa entrevista à Notícias Magazine, a revista de domingo do JN e do DN, a antiga ministra diz ter sido alvo de sexismo e critica o retrato de si que foi traçado na imprensa.

“A imagem da imprensa escrita e de alguns comentadores não corresponde ao que sinto no dia-a-dia. Não há dia em que pessoas não venham ter comigo a abraçar-me”, disse, revelando ainda desilusão com alguns dos seus críticos.

“Magoou-me que algumas pessoas, que tinha por sérias e inteligentes, tivessem embarcado na espiral das acusações fáceis, reduzindo todas as tragédias, fruto de uma série de factores e desinvestimentos de décadas, à minha competência ou falta dela”, afirmou.

“Somos um país de treinadores de bancada e todos temos uma opinião, baseada muitas vezes em ideias ligeiras. Ir ao fundo dos problemas dá muito trabalho e exige reflexão”, disse.

Urbano de Sousa considera ainda ter sido vítima de misoginia e sexismo por ter chorado em público perante a tragédia dos incêndios.

“Descobri que para alguns opinion makers uma mulher que chora é fraca. E se é fraca é incompetente, não serve. Já se um homem chora, bom, aí é sinal de grande sensibilidade. O que é uma forma absolutamente misógina e sexista de abordar a questão”, disse. “Senti que se tivesse sido um homem a passar pelas mesmas circunstâncias talvez tivesse merecido mais respeito”.

Na entrevista, a ex-ministra disse que a saída do Governo não implicou qualquer conflito pessoal com o primeiro-ministro António Costa, com que diz manter uma “profunda relação de amizade e admiração”. A jurista revela ainda que a decisão de revelar a carta de demissão foi de Costa e não sua.

Constança Urbano de Sousa, que entretanto regressou ao Parlamento e à docência na Universidade Autónoma de Lisboa, considera que a experiência governativa foi, “apesar de tudo, positiva”, e que lhe permitiu conhecer melhor o país: “Estar em Lisboa, sentadinho num sofá a dar palpites, sem ter noção da realidade, das causas e de uma vivência no terreno é muito fácil”.

“Não ter conseguido evitar as tragédias dos fogos” foi a maior frustração: “É algo que será sempre doloroso e me acompanhará a vida inteira”.

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