Sites promovidos por russos incentivam extrema-direita em Espanha

Colunistas espanhóis também participam nestes "centros de estudo" onde se defende a Rússia e se ataca a União Europeia.

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Espanhóis manifestam-se com uniformes da Falange do tempo de Franco Juan Medina/Reuters

Vários portais em espanhol patrocinados por um magnata russo que o jornal El País recorda ser próximo do Kremlin, Konstantin Malofeev, difundem teses da extrema-direita e organizam encontros entre activistas e políticos com ideias comuns não só em Espanha como outros países da União Europeia.

De acordo com o diário de Madrid, é o que acontece com os sites Katehon.com e Geopolitica.ru, autodefinidos como “centros de análise” ou “comunidade independente de peritos dedicados à investigação em diversos campos, incluindo a análise política, geoestratégica e geopolítica de acontecimentos internacionais”.

No caso do Katehon, os textos são publicados em inglês, espanhol, francês e árabe. Todos os colunistas demonstram ter ideias de extrema-direita, defendem sempre as posições russas e são habitualmente anti-NATO e anti-União Europeia. O Katehon teve 570 mil visitas em Outubro, com quase uma em cada três com origem nos Estados Unidos, Rússia ou Espanha; o portal Geopolitica.ru ultrapassou as 415 mil no mesmo mês, quadruplicando os resultados obtidos em Julho.

Muitos dos supostos analistas que aqui têm voz são os mesmos que podemos encontrar a serem entrevistados no canal de notícias russo em inglês RT ou na agência de notícias Sputnik. Um general na reserva chamado Salvador Fontenla, por exemplo, escreve um texto em que critica a falta de capacidade de combate dentro de Espanha e a mobilização internacional na Estónia, Letónia e Lituânia com mandato da NATO: “Que se sabia até agora não há nenhuma ameaça russa contra estas nações bálticas”, escreve o militar.

A Rússia, continua Fontenla, ex-membro da Legião (a unidade de reacção rápida criada há quase cem anos para integrar o Exército Espanhol de África) e durante anos pára-quedista colocado no Sara Ocidental, “converteu-se, como em 1812, num dos principais baluartes da Europa”, pelo que prolongar as sanções contra Moscovo “só pode prejudicar o resto das nações europeias e, em particular, Espanha”.

Uma estreia recente no Katehon foi Inma Seguí, actual militante do Respeto e ex-candidata à autarquia de Cuenca (Castela la Mancha) do partido de extrema-direita Vox (que ficou conhecido com as suas propostas de criminalização do aborto e centralização do Estado, num país compósito onde as diferentes regiões e autonomias beneficiam de vários poderes). Inma Seguí escreveu sobre o clube taurino da Rússia, que há uns meses passou por Madrid.

“Interessa-me que se conheçam os meus pontos de vista: por que é que estou contra a NATO ou penso que a Rússia é Europa, e este meio é um começo”, disse ao El País. “No fundo, a minha linha coincide com a linha deste media.

Para além de opiniões, o Katehon também já difundiu notícias como uma suposta implicação de Hillary Clinton em cinco assassínios, isto quando era a candidata democrata à Casa Branca, ou a existência uma suposta lista negra feita pela Fundação Soros para assinalar jornalistas espanhóis pró-russos.

Konstantin Malofeev, que surge na versão espanhola do site como presidente do “centro de estudos”, é um magnata que integra as listas de russos sob sanções dos EUA e a UE desde 2014 por causa do seu apoio aos separatistas ucranianos. Bruxelas considerou-o “suspeito de apoio material e financeiro” e acusou-o de agir “em apoio da desestabilização da Ucrânia Oriental”.

Malofeev também criou e preside a Fundação São Basílio o Grande, que convoca conferências com diferentes movimentos da direita radical europeia, dos carlistas espanhóis ao partido AfD alemão. “Creio que com as actuações do drº [Alexander] Gauland a Alemanha voltará a ser a Alemanha, assim como a Rússia voltará a ser a Rússia com [Vladimir] Putin”, afirmou num encontro em São Petersburgo há dois anos, depois de uma conversa com Gauland, co-presidente do Alternativa para a Alemanha.

No fundo, estes sites integram uma rede que cita supostos analistas e instituições que partilham os seus próprios conteúdos e assim se promovem mutuamente. Segundo disse ao jornal espanhol o perito em relações externas Francisco Malavassi, que investigou os métodos russos para infiltrar propaganda fora de fronteiras, a ideia “é dar a impressão que há muitíssimos formadores de opinião, uma escola por trás dos artigos que apresentam”. Na verdade, “quando se vê em detalhe ou os artigos não estão assinados ou são escritos por um grupo pequeno de pessoas que citam outros, amplificando-os”.

O objectivo russo, diz Malavassi, passa essencialmente por obter mais poderes ao desestabilizar a UE e os seus membros, pelo que faz isto em Espanha, mas também em Itália, França ou Alemanha. E de acordo com o aconteça nos próximos tempos, “poderão aliar-se com grupos de extrema-esquerda ou qualquer tipo, sempre que ataquem o status quo da União Europeia, o que procuram é gerar o caos”.

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