Canavilhas e Soares apontados como possíveis gestores da Lusa

A confirmar-se qualquer um destes nomes, será a primeira vez que um deputado vai liderar a Lusa. PCP e Bloco querem que o Estado compre a quota minoritária (49,86%) dos privados na agência noticiosa.

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A Agência Lusa é uma sociedade mista, da qual os privados detêm 49,86% do capital Miguel Silva

Os nomes dos deputados socialistas e ex-ministros Gabriela Canavilhas e João Soares são dos mais falados para a futura administração da Agência Lusa, que tomará posse no início da Primavera, depois de nomeada pela assembleia geral em que se fecharão também as contas deste ano. A confirmar-se qualquer um deles, será a primeira vez que um deputado administra a agência de notícias portuguesa.

Questionada sobre este assunto pelo PÚBLICO por duas vezes – antes e depois de a actual presidente, Teresa Marques, anunciar aos trabalhadores que haverá uma nova administração -, Gabriela Canavilhas mostrou-se verdadeiramente atrapalhada e negou-se a esclarecer se foi convidada ou sondada, formal ou informalmente, pelo Governo para assumir funções na agência noticiosa.

Questionado pelo PÚBLICO, o gabinete do ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, não quis fazer comentários. Já João Soares começou por dizer que "nunca ouviu tal coisa", mas depois, contando estar em Havana, remeteu a questão para "o princípio do ano".

Na quarta-feira, a actual presidente da Lusa, Teresa Marques, comunicou aos trabalhadores que será nomeada numa nova administração na próxima assembleia geral e que continuará em funções até lá, mostrando claramente já saber que a tutela não conta com ela para um novo mandato. Na carta, além de falar dos projectos que conseguiu implementar, a gestora lamenta o adiamento sucessivo, desde 2015, da estratégia de crescimento da agência, os entraves financeiros do Governo e o "total silêncio" a que a tutela se remeteu desde Setembro passado.

Gabriela Canavilhas foi ministra da Cultura do segundo Governo de José Sócrates (2009-2011) e João Soares assumiu a mesma pasta durante quatro meses e meio no actual executivo de António Costa. Em comum têm também polémicas com jornalistas: Soares acabou por deixar o cargo em Abril de 2016, depois de, num comentário na rede social Facebook, ameaçar com um “par de bofetadas” os colunistas do PÚBLICO Augusto M. Seabra e Vasco Pulido Valente que criticaram o seu trabalho como ministro; em Junho do ano passado, Canavilhas teve que se retractar, depois de ter acusado, no Twitter, a jornalista do PÚBLICO Clara Viana de criar “factos falsos” e de ter pedido até o seu despedimento.

Mais do que nomes para a administração, o que preocupa os partidos que, à esquerda do PS, dão suporte parlamentar ao Governo socialista é a natureza mista da agência, pelo que PCP e BE defendem que a Lusa devia passar a ser totalmente pública.

Ao contrário da RTP, que tem capital exclusivamente público e cujo processo de designação da administração passou a ser feito pelo Conselho Geral Independente, a Agência Lusa é uma sociedade de capitais mistos entre o Estado (50,14%), seis empresas privadas e a RTP, em que o Estado é o accionista maioritário e tem poder de nomeação, como acontece, por exemplo, na TAP. Esta configuração impede que se possa mudar o esquema de nomeação da administração, afirma o deputado comunista António Filipe, quando questionado pelo PÚBLICO sobre se o processo de escolha dos administradores não deveria ser mudado.

Para mudar, por exemplo, para um esquema de concurso, “pressuporia que o Estado adquirisse a quota dos privados”, tornando-se o único accionista, cenário que o PCP “veria com bons olhos”, defende o deputado, que admite desconhecer quanto isso custaria. “Se a Agência Lusa fosse exclusivamente pública, podia-se encarar outra forma de fazer as nomeações”, aponta António Filipe.

É para o mesmo cenário que aponta o Bloco, que não quer discutir particularmente questões de nomeações mas antes a natureza da Lusa “no sentido mais amplo da sua missão”. O deputado Jorge Campos defende ser preciso “tirar as questões dos media da esfera dos entendimentos tácitos entre PSD e PS” que depois levam a problemas como o que se arrastou com a ERC. “A Lusa devia ser uma empresa integralmente na esfera do Estado. Faz sentido uma comunicação social pública forte que dê garantias de ser uma referência nos valores de independência, pluralismo, qualidade e variedade dos conteúdos”, acrescenta o bloquista.

Outras hipóteses

Um nome que chegou a estar em cima da mesa foi o do actual provedor do espectador da RTP, Jorge Wemans, que já passou pela administração da Lusa entre 1998 e 2002 – depois de ter sido fundador e director-adjunto do PÚBLICO e também provedor do leitor deste jornal. Ao PÚBLICO, Wemans garante não ter sido contactado, mas admite que soube que o seu nome tinha sido falado mas também logo posto de lado por “quem sabia” que tenciona levar o seu mandato na RTP até ao fim.

Debaixo de olho da tutela chegou a estar ainda o nome de Gustavo Cardoso, docente e investigador do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, mas acabou descartado porque o académico se candidatou ao lugar de reitor daquela instituição de ensino superior. Ao PÚBLICO, Gustavo Cardoso negou ter recebido qualquer contacto para funções na Lusa, lembrando a anterior passagem pela agência. O professor catedrático já integrou a equipa de gestão da agência como vice-presidente da administração entre 2006 e 2012, um cargo não-executivo. A pedido da actual administração, fez um estudo sobre como a Lusa se devia posicionar, face ao crescimento das redes sociais e do seu poder como veículos de informação.

A próxima administração deverá estar em melhores condições para negociar com os gabinetes de Castro Mendes e de Mário Centeno uma nova estratégia (e respectivo plano de financiamento) para a agência e para enfrentar os parceiros privados (que detêm 49,86% do capital), em especial a Global Media Group e a Impresa (que juntas têm 45,71% da Lusa), que há muito mostraram interesse em vender a sua quota.

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