A mudança do Maria Matos sabe “um bocado a derrota”

O ex-director do equipamento não está convencido de que Lisboa precise de mais um teatro comercial e defende que a reorganização proposta pela Câmara devia ter sido mais discutida com a cidade.

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NUNO FERREIRA SANTOS

Foi anunciado há dias o futuro próximo para o Maria Matos, que passará pela escolha de uma entidade privada para a gestão do espaço. Vê com apreensão o futuro da sala que dirigiu estes dez anos?

Na entrevista da vereadora Catarina Vaz Pinto há uma análise que, em muitos pontos, acompanho. Fala de uma nova realidade em Lisboa, do que mudou desde há dez anos, quando a nossa equipa entrou no Maria Matos. Também é verdade que existe no Maria Matos uma tensão entre a sua missão e a própria arquitectura do edifício, porque utilizámos imensas vezes bancadas para criar espaços mais próximos daquilo que a criação contemporânea procura, uma relação directa, olho no olho com o público. É um facto para o qual alertámos muitas vezes, porque era um problema. Outro problema evidente era programação para crianças e jovens, limitada a uma salinha mínima com 30 lugares. A análise dos problemas é relevante e levar a programação de crianças e jovens para um centro de artes é uma solução bonita, abre novas possibilidades, mas mudar a restante programação do Maria Matos para o Teatro do Bairro Alto levanta muitas questões.

Quais são as mais relevantes?

Um teatro é um espaço simbólico, pertence à cidade e à sociedade civil – ainda por cima no Maria Matos, onde isto foi muito reflectido na programação. Tirar uma programação neste espaço para pôr noutro, ainda por cima numa cave, não deixa de saber um bocado a derrota. A Câmara tem todo o direito de tomar estas decisões e até acho interessantes as questões que estão a ser colocadas, mas tenho pena que o debate tenha sido aberto numa entrevista e logo fechado com a solução. Teria sido interessante debater isto e o que significa mudar o conteúdo do Teatro Maria Matos para ali. E depois há questões práticas – a entrada e saída de cenários naquele espaço levanta-me dúvidas. Quanto ao [risco de o] Maria Matos se tornar mais comercial, porque terá de ser um teatro que se paga a si próprio, não sei se houve um estudo de mercado, se Lisboa precisa de mais um teatro comercial e se tem as características, em termos de lotação, para esse fim. Há muitas perguntas e muitas dúvidas que vale a pena discutir.

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