E vão 14

Os sintomas de um problema político estão aí, bem visíveis, e vão muito para além desta remodelação forçada.

Diziam que era a política que salvava este Governo. E agora veja bem a sequência: desde que tomou posse, António Costa já perdeu 12 secretários de Estado e dois ministros. E sempre a reboque dos acontecimentos: foi com João Soares, por causa de um texto no Facebook, continuou assim por causa do Galpgate, também na sequência dos incêndios (apesar da intransigência do próprio primeiro-ministro em deixar sair a fragilizada Constança Urbano de Sousa).

A demissão de ontem, de Manuel Delgado, só peca por tardia. E deixa-nos a pensar sobre o modo como o núcleo político do Governo reage a crises internas. Numa entrevista que ainda deu ontem à TVI, antes de tomar a decisão, o secretário de Estado da Saúde admitia ter colocado imediatamente o seu lugar à disposição do ministro, logo após a divulgação da reportagem sobre a Raríssimas. O ministro, diz ele, recusou. E pelos vistos durante dois dias ninguém chamou Delgado a São Bento para que explicasse, “tintim por tintim”, até onde estava metido nesta polémica. Bastava ver a reportagem para perceber como o caso era complicado: Manuel Delgado não nos disse que trabalho tinha feito para a Raríssimas, menos ainda porque aceitou receber 63 mil euros com verbas do Estado para “reequilíbrio financeiro” da instituição. A porta de saída já estava aberta, mas no Governo ninguém a viu.

Acontece que os sintomas de um problema político vão muito para além desta remodelação forçada. Na semana passada, vimos António Costa a tirar o tapete ao seu ministro da Saúde em plena Assembleia da República, criticando-o por um “erro de comunicação” sobre a deslocalização do Infarmed (que foi na verdade um erro político dele próprio). E na mesma semana vimos Mário Centeno desautorizar o seu colega do Ensino Superior, dando uma nega ao pedido de mais verbas para as universidades — que tinham sido acordadas com o próprio chefe de Governo. Antes já tínhamos visto uma première, atónitos: o ziguezague sobre a taxa das renováveis, que expôs o PS a críticas pouco amigáveis do Bloco — e a um certo nervosismo no próprio PS.

Há uma semana disse-o aqui, a propósito da eleição de Mário Centeno para o Eurogrupo: já era tempo de António Costa fazer uma remodelação a sério, para evitar dois anos de desacertos. Reitero-o agora, porque ainda vai a tempo.

A sorte de Costa é que na sexta-feira a Fitch deve rever em alta o rating de Portugal. Quem diria que era pelas Finanças que este Governo conseguia respirar?

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