Portugal e a Defesa Europeia — a CEP

O país não perderá soberania, já que as decisões serão tomadas por unanimidade, num quadro intergovernamental.

A União Europeia avança ao estabelecer uma “Cooperação Estruturada Permanente" (CEP ou PESCO em inglês) na Defesa. CEPs já são a Moeda Única e o Acordo de Schengen — uns tantos Estados avançam, todos podem vir a aderir, aceitando os compromissos e condições. Portugal esteve na linha da frente do Euro e de Schengen e deve juntar-se aos 23 Estados-Membros que já notificaram o Conselho deste passo integrador.

A Defesa era, até há pouco, área que muitos diziam vedada à UE, entregue à NATO. O Tratado de Lisboa prevê a CEP na Defesa, mas a “bela adormecida” foi tardando... Agora, finalmente, a CEP vai permitir aos Estados Membros da UE (incluindo os que não estão na NATO) reforçarem a coordenação, aumentarem o investimento em Defesa e cooperarem para desenvolver capacidades operacionais: diminuindo o número de sistemas de armamento diferentes, aumenta-se interoperabilidade e competitividade industrial. 

Capacidades de Defesa são precisas quando se multiplicam ameaças e desafios transnacionais e nenhum Estado Membro, por si só, dispõe de recursos para as desenvolver. E quando o uso generalizado de tecnologias de informação gera riscos de ciber-segurança em todos os sistemas de que dependemos, na protecção de infraestruturas críticas e para a própria resiliência das democracias face ao terrorismo e à chamada "guerra híbrida".

O contexto é de desordem global e instabilidade nas relações internacionais, com o Conselho de Segurança das Nações Unidas muitas vezes bloqueado, com a confiança transatlântica inquinada por Trump, a Turquia, o "Brexit"... Os europeus — como todos os eurobarómetros demonstram - exigem respostas, entendendo que a era globalizada em que vivemos impõe cooperação europeia e internacional.

A CEP visa estabelecer coordenação e o planeamento das capacidades militares dos países signatários. Institui um quadro de cooperação que se baseia em compromissos por cada um dos Estados participantes, com contribuições cuja execução será supervisionada, anualmente, pelo/a Alto/a Representante para Acção Externa e Vice-Presidente da Comissão Europeia, que já coordena PESC (Política Externa e de Segurança Comum) e PCSD (Política Comum de Segurança e Defesa).

Os projetos CEP deverão abranger a formação, a investigação científica e tecnológica, o desenvolvimento de capacidades e prontidão operacionais das Forças Armadas. Isso cria também oportunidades para as empresas em sectores tecnológicos avançados: é assumido o objectivo de favorecer a Base Industrial da Defesa, reforçando a  autonomia estratégica europeia. Projectos CEP considerados prioritários no quadro CARD - Revisão Anual Coordenada sobre Defesa - podem ser do-financiados pelo Fundo Europeu de Defesa, no âmbito do Programa Industrial de Defesa Europeia que a Agência Europeia de Defesa (EDA) implementará.

Portugal vai, assim, inserir-se numa parceria para reconstituir e reforçar as suas capacidades militares e de segurança, dizimadas nos últimos anos - como o desbarato da EMPORDEF, dos ENVC e o recente episódio trágico-cómico de Tancos evidenciam. Vai poder adquirir e co-produzir equipamentos necessários para a Defesa europeia e nacional (por exemplo, para controlar a sua vasta zona marítima). E na formação e treino das suas Forças Armadas e de Segurança em quadros multinacionais. Pois, possuindo capacidades, tanto as poderá pôr ao serviço de missões europeias, como da NATO, ONU ou outras plataformas.

É tempo de investirmos na Defesa europeia, através da CEP. É tempo de se obter mais valor em troca do que os contribuintes portugueses gastam com Forças Armadas e de Segurança, acabando com a corrupção e o desperdício que grassam em contratos de equipamento e fornecimento. A supervisão e o controlo democrático das CEPs pelo Parlamento Europeu podem forçar transparência e controlo parlamentar nacional.

Portugal não perderá soberania, já que as decisões serão tomadas por unanimidade, num quadro intergovernamental. Não, a CEP/ PESCO não é, ainda, o exército europeu. Procura só recuperar tempo e recursos desperdiçados.

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