A redução da dívida é fundamental

Mário Centeno afirma que "a execução do Orçamento de 2018 e a preparação do próximo estão asseguradas" e que "não haverá nenhuma alteração na orgânica da equipa ministerial das Finanças".

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Miguel Manso

Mário Centeno fala do processo de recuperação de Portugal e das suas maiores dificuldades, mas também do seu potencial.

Apesar de tudo, as economias mais fracas têm de melhorar a sua competitividade.
Não tenho rigorosamente nenhum dúvida sobre isso. Podemos sempre ter uma discussão em torno do conceito de competitividade. Mas é impossível que essa competitividade exista apenas pela dimensão salarial, caso contrário temos os fenómenos emigratórios que observamos nos últimos anos. Os programas de ajustamento foram desenhados a partir de um conceito económico que partia do princípio de que a oferta de trabalho não reage ao salário. Significa que há aquele número de trabalhadores que trabalha ao salário que estiver vigente na economia. Não é assim numa economia que vive num mercado único, com livre circulação de trabalhadores. O que aconteceu foi o que normalmente acontece nestas circunstâncias: os mais qualificados vão-se embora. E isto, sendo natural no Mercado Único, não é um modelo de desenvolvimento para o país.

Já deixou de ser possível centrar nos salários os ganhos de competitividade?
Já não é possível. Tem de haver investimento, mais inovação e mais formação das pessoas. E isso é algo que não podemos descurar. Já pagámos o preço de ter descurado as nossas qualificações durante décadas a fio. Já recuperámos imenso e as novas gerações já conseguem competir com aqueles que achávamos os líderes desta dimensão. Este fenómeno tem de ser trazido à equação e foi bastante descurado no programa de ajustamento. Sempre o disse. Temos verificado no último ano e meio uma alteração dessa dimensão. Há um indicador que refiro sempre quando saem dados no mercado de trabalho, que é a evolução da população activa. Caiu cinco anos de seguida em Portugal. Foi o único país do ajustamento em que isto aconteceu. É um indicador muito preocupante. Felizmente, desde meados de 2016, essa situação começou a inverter. Temos hoje mais gente no mercado de trabalho e este é o indicador de maior sustentabilidade do crescimento.

O que é que vai acontece quando o BCE subir as taxas de juro e a compra de dívida acabar? Temos capacidade para aguentar esse impacto?
Temos de estar prontos para isso. Há algumas componentes que são essenciais para garantir que estamos prontos e evitar a situação em que as nossas economias — não só a portuguesa — estavam em 2008. No caso português, hoje em dia, há um indicador absolutamente essencial que é a redução do peso da dívida no PIB.

Mas isso é difícil de fazer depressa.
É difícil mas já estamos a fazê-lo.

As metas impostas no Tratado Orçamental são praticamente impossíveis de cumprir.
Temos, mais uma vez, de usar a paciência. Não estou obcecado pelo tempo. Uma das primeiras conversas que tive com os responsáveis do Banco Central Europeu — porque o nosso problema ainda era muito um problema financeiro quando este Governo tomou posse —, o sistema financeiro estava ainda muito débil. Tínhamos o Banif cuja resolução foi feita três semanas depois; o BES que estava em resolução e sem capital; e tínhamos a Caixa que estava sem capital. Os portugueses ainda não perceberam a transcendência do que aconteceu e o que tinha de ser feito. Para mim, pessoalmente, se tiver de identificar um ponto de viragem na confiança, quer externo quer interno, foi quando o Governo conseguiu fechar o acordo com a Comissão para a Caixa Geral de Depósitos. Para nós, era como a frase de Draghi: custasse o que custasse, tínhamos de capitalizar a Caixa nas condições em que o fizemos. Foi essencial a estabilização dos bancos e devemos boa parte do sucesso que tivemos a seguir a esse processo.

Voltando à sua escolha, muito debatida por cá. A credibilidade externa é um dos ganhos? Ou essa credibilidade já estava garantida?
Esta escolha é já o reflexo da credibilidade que o país ganhou nos últimos dois anos, da determinação com que abordámos a nossa relação com as instituições internacionais e do cumprimento de todos os nossos compromissos. Essa credibilidade foi sendo reconhecida pelas instituições e mercados ao longo deste tempo. Assim sendo, também é natural que a escolha do ministro das Finanças de Portugal para este cargo ajude a reforçar essa credibilidade.

Por cá, continua a haver críticas sobre os efeitos dessa escolha na política interna. Como responde?
Respondo que todos, no ministério, sabemos as exigências que o país ainda defronta e sabemos que o caminho feito até aqui não se repete por si só daqui para a frente. A execução do Orçamento de 2018 e a preparação do próximo estão asseguradas, como temos feito até aqui. Não haverá nenhuma alteração na orgânica da equipa ministerial das Finanças.

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