Há outra Internet atrás da muralha

A China reforçou este ano o controlo da Internet, juntando mais serviços a uma lista negra que tornou a sua rede radicalmente diferente da nossa

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Liste tudo aquilo que costuma fazer na internet. Abra a página inicial, que será quase de certeza o Google. Vá ao Facebook e fique a par das novidades da família e amigos. Veja o Gmail. Acesse o YouTube e ponha a tocar aquela música do momento. Quem é a cantora? Espreite na Wikipédia. Que se passa no mundo? Vamos abrir o Twitter e consultar o New York Times. E aqui só entre nós, e se espreitasse aquele site para adultos? Espere, alguém enviou uma mensagem pelo WhatsApp. É verdade, ficou de ligar-lhe pelo Skype.

Esta breve descrição é coincidente com a lista do que não se pode fazer na China. Não é que o maior país do mundo esteja desligado da rede. Na verdade, é o maior mercado online, com mais de 750 milhões de utilizadores. Mas a Internet ali é radicalmente diferente da nossa. 

Por detrás da Grande Firewall da China, a rede está a distanciar-se cada vez mais do resto do mundo. Nos últimos meses, o WhatsApp juntou-se à lista de serviços indisponíveis no país, onde já estava a generalidade dos serviços da Google, o Facebook, Twitter, Netflix, várias secções da Wikipédia, grandes jornais internacionais, serviços de partilha de ficheiros e todos os sites pornográficos.

Especulou-se que a recente proibição do WhatsApp pudesse estar relacionada com a realização, em Outubro, do XIX Congresso do Partido Comunista da China. No entanto, o serviço continua indisponível. Nas últimas semanas, o Skype também desapareceu da loja online da Apple na China. E esta semana, a Apple confirmou em resposta a perguntas do Senado norte-americano que removeu mais de 600 aplicações. Eram quase todas aplicações VPN, que permitiam aos utilizadores conectar-se à Internet através de servidores no estrangeiro, contornando o filtro chinês.

A ordem vem do topo. O Presidente Xi Jinping defendeu este ano “um ciberespaço limpo” e anunciou uma oposição “firme” à difusão de “ideias erradas”. O discurso oficial é o de que é necessário preservar a estabilidade num país que atravessa um rápido processo de transformação. Leituras mais críticas, no entanto, colocam a domesticação da Internet no contexto do fortalecimento do poder do partido e de Xi.

Há neste momento 50.000 censores governamentais online e a estes junta-se um exército de comentadores a soldo das autoridades. Moderadores de fóruns e utilizadores rebeldes recebem cada vez mais a visita da polícia. Palavras sensíveis são removidas dos motores de buscas. 

Para lá da censura política, há também um aspecto moralista. No Verão, o mais popular videojogo online chinês, Honour of Kings, viu limitada a sua utilização a apenas algumas horas por dia e está desligado à noite, para impedir comportamentos aditivos. A pornografia está proibida, bem como conteúdos que possam ser sexualmente sugestivos, o que tem detalhes caricatos: comer bananas em vídeos é agora proibido. 

O ano de 2018 deverá marcar o agravamento das medidas de controlo. Segundo a Bloomberg, as três operadoras chinesas de telecomunicações têm ordem para, a partir de Fevereiro, bloquear todos os serviços VPN que vão permitindo a alguns utilizadores contornar a muralha e espreitar o resto do mundo.

A rubrica Tecnologia encontra-se publicada no P2, caderno de domingo do PÚBLICO

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