O momento certo para Centeno

Se há uma altura em que é realmente possível acertar o passo na zona euro, talvez este seja esse momento.

Parecia uma repetição de uma velha história: quando apareceram as primeiras notícias sobre uma candidatura de Mário Centeno ao Eurogrupo, muitos desvalorizaram, outros tantos desprezaram. Até o Presidente Marcelo afastou a ideia, convencido de que o cargo exigia exclusividade e pedindo-lhe que ficasse para resolver os nossos problemas. Já tinha sido assim com Barroso e com António Guterres. E mesmo aí não falta quem se mostre céptico. É como no velho ditado: quando a esmola é muita, o pobre desconfia. 

Só na segunda-feira teremos a certeza sobre se Mário Centeno consegue chegar ao lugar de topo da zona euro. Mas o que já sabemos é suficiente para se valorizar. Um país do Sul da Europa, um Estado que só há três anos saiu de um resgate, um ministro que está num Governo com bloquistas e comunistas ter a perspectiva de liderar o Eurogrupo é um sinal de confiança que Portugal não deve desaproveitar. E esta candidatura revela uma ousadia que merece apoio, dos cépticos mais à esquerda aos resistentes à direita.

Ousadia porque tem muitos riscos, mas desses já aqui falámos (do equilíbrio da geringonça, à probabilidade de sair de lá em contradição com o que aqui se aplica). Mas os riscos não são maiores do que a oportunidade. Porque o interesse português é o de termos uma Europa melhor. Porque não é indiferente ter um português em boa posição, quando se começa essa conversa.

Ainda céptico? Deixo-lhe três argumentos simples. A Comissão e o Conselho já traçaram um roteiro para lançar a discussão, que será feita nos próximos meses; dos países que estiveram sob resgate, só a Grécia continua na mão dos credores; e a economia do euro cresce como há uma década não acontecia. Se há uma altura em que é realmente possível acertar o passo na zona euro, talvez este seja esse momento. E não faltam acertos para fazer: da união bancária à coordenação de políticas económicas, até à criação de uma rede para a próxima crise.

Ontem, na apresentação da sua candidatura, Centeno usou a palavra-chave de qualquer bom europeu: consensos. Não será fácil consegui-los para ser eleito, será ainda mais difícil obtê-los para chegar a um novo equilíbrio. 

Mas a oportunidade vale o risco. E devemos valorizar a coragem. Para que as circunstâncias todas ajudem, só falta vir uma boa notícia de Berlim: o apoio do SDP a um novo Governo da chanceler Merkel, abrindo portas a um diálogo com o Presidente Macron. Há quanto tempo não tínhamos tantos astros alinhados?

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