Jyri fugiu de bicicleta e só pára em Portugal

Partiu da Finlândia há 4000 quilómetros. Este sábado terá uma festa de boas-vindas em Viana do Castelo onde vai contar as histórias que acumulou durante as últimas oito semanas

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“Estou em fuga, a tentar não ser apanhado.” A afirmação pode parecer vinda do protagonista da série Prison Break ou talvez de um qualquer filme de acção repleto de correrias e perseguições, mas se já olhaste para a foto deste artigo perceberás que é "apenas" um finlandês de 51 anos a descobrir a Europa à boleia do seu projecto Life on the Run.

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“Estou em fuga, a tentar não ser apanhado.” A afirmação pode parecer vinda do protagonista da série Prison Break ou talvez de um qualquer filme de acção repleto de correrias e perseguições, mas se já olhaste para a foto deste artigo perceberás que é "apenas" um finlandês de 51 anos a descobrir a Europa à boleia do seu projecto Life on the Run.

 

“É um jogo de palavras, a piada é como se eu fosse um prisioneiro em fuga da sociedade contemporânea”, explica Jyri Manninen, que vai concluir o seu percurso este sábado, 2 de Dezembro, em Viana do Castelo. Para trás, ficam oito semanas de viagem, 4000 quilómetros e uma bicicleta, a Matilda. À sua espera estará uma festa de boas-vindas, organizada pela Dínamo10, na casa de hóspedes Dona Emília, onde vai partilhar com o público muitas das histórias e experiências que acumulou ao longo dos dois meses de viagem.

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São 4000 quilómetros a pedalar pela Europa DR

 

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A primeira noite de Jyri foi passada numa floresta, já na Suécia DR

Como a da primeira noite, em que teve de pernoitar na floresta, algures na Suécia. "Não encontrei ninguém no parque de campismo e estava a pedalar há quase cem quilómetros, então decidi simplesmente montar a tenda no meio das árvores e dormir ali”, conta. Um cenário que pode ser assustador e periogoso, e Jyri sabe-o. Aliás, ele próprio estava nervoso: “Nas primeiras horas estava a ouvir os barulhos lá fora e a pensar: ‘É um animal? É uma pessoa?’ Mas depois comecei a ouvir a chuva e acordei de manhã, vivo. E aí percebi que é só a nossa imaginação a trabalhar e que a forma de combater isso é ir e experimentar.” A primeira lição foi aprendida na sua primeira noite; muitas mais viriam. “Com esta viagem, estou a educar-me mais”, admite.

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Matilda, a filha de dez anos, com a outra Matilda, a bicicleta DR

 

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Jyri partiu da Finlândia. Destino

Um dos motivos para iniciar esta aventura foi mesmo a aprendizagem. Aproveitou a chegada do frio à Finlândia para montar a bicicleta e desatar a “saltar de país para país” até chegar a Portugal pelo caminho francês de Santiago. Porque “existe tanta coisa boa por aí e ninguém fala disso”, explica, fazendo um contraponto com as notícias que diariamente chegam pela televisão. Prova disso foi a história que viveu em terras germânicas, a melhor da viagem.

 

“Uma noite", começa, "estava na Alemanha, pedalei até um parque de campismo, noite cerrada, e o parque parecia estar fechado". "O que fazer?", pensou, "não sei para onde ir." Chegou então um carro, luzes viradas para ele. "Eu nem conseguia ver nada, estava a ficar zangado", recorda. Sem razões. Afinal, era o condutor que lhe tinha dado indicações anteriormente para o parque de campismo e que acabou por lhe oferecer um quarto e uma refeição na sua casa. "Ele faz turismo de bicicleta e já esteve na mesma situação, mas essa nem é a melhor parte", sublinha Jyri. "Na manhã seguinte, como o meu selim era duro e desconfortável, ele deu-me o selim de turismo dele. E esse pequeno gesto fez a maior diferença na minha jornada porque tornou a viagem menos dolorosa”, diz, revelando que uma das suas maiores “descobertas” foi perceber que “a hospitalidade e amabilidade das pessoas”, um ponto comum em todo o percurso.

 

Uma tenda, uma mochila com roupa, equipamento de cozinha e o computador — é tudo o que o ciclista transporta. E, mesmo em viagem, nunca deixou de trabalhar. É um coach, ou mentor numa tradução aproximada para português, de empresas, particularmente de start-ups, procurando conectar a psicologia e a terapia cognitiva aos negócios. “Tenho o computador comigo, assim posso fazer o meu caminho todos os dias, ver o e-mail nas pausas, comunicar com os meus clientes por Skype. Posso trabalhar em rede e em mobilidade”, diz, adiantando ainda que entre os seus seguidores estão os próprios clientes, que vão acompanhando a jornada até Portugal. E, quem sabe, se este não será o seu novo modo de vida. É que Jyri ainda "à procura de uma nova casa" e a cidade minhota está no topo da lista do finlandês. 

 

Matilda, a bicicleta e a filha

A história desta jornada tem um início mais distante. Jyri Manninen foi casado durante 18 anos, é divorciado há dois e quer um mundo melhor para a próxima geração, da qual fará parte Matilda, a sua filha de dez anos. “Quero que a minha filha tenha a coragem de seguir os seus sonhos", sublinha. "Mesmo que não seja bem-sucedida, pelo menos tentou”, esclarece, em conversa com o P3 via Skype. Espera, assim, que o seu exemplo a inspire. 

 

Antes da partida, Jyri e Matilda compraram, juntos, vários acessórios para a bicicleta que preparam cuidadosamente. A bicicleta recebeu o nome da filha “para ser parte do trajecto”. “Vou estar fora durante dois meses, mas a bicicleta, a Matilda, vai viver estas experiências”, diz. 

 

Todas as pessoas com quem se cruza ao longo da viagem têm direito a uma fotografia com Matilda e à entrada automática no álbum de retratos Viagens de Matilda. Acumulam-se também os postais que o finlandês envia em todos os países por onde passa, bem como os pequenos presentes ou souvenirs que vai comprando para oferecer quando voltar à Finlândia, na próxima Primavera.

Até lá, Jyri ainda vai depois pedalar até às Caldas da Rainha, onde se vai encontrar com a mãe, reformada, a viver na cidade. Até regressar, de avião, à Finlândia, vai aproveitar para conhecer a Península Ibérica e espera um dia voltar para viver no Norte, mas de Portugal.