A história da arte urbana numa volta ao mundo em skate

Lorna Brown, ilustradora, pegou no skate e foi viajar pelo mundo para descobrir como os lugares inspiraram a arte urbana. Voltou com muitas aguarelas e a certeza de que a história das pessoas passa muito pelos sítios onde vivem

O skate, que às vezes serve de régua   Lorna Brown
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O skate, que às vezes serve de régua Lorna Brown
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Obra de Banksy em Bristol, na Inglaterra Lorna Brown
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Obra de Banksy em Bristol, na Inglaterra Lorna Brown

Uma torre de vigilância cinzenta sobrepõe-se ao muro de oito metros, também em betão armado, que rodeia Belém, na Palestina. “Apesar do cinzento, ao longo dos muitos quilómetros da barreira brotou arte urbana e graffiti, uma forma de resistência e solidariedade”, descreve ao P3 Lorna Brown. É este um dos primeiros cenários representados nas aguarelas da ilustradora inglesa que quer “contar a história das pessoas através dos sítios”.

Em Outubro de 2016, a artista passou cinco semanas em território palestiniano a ver cores brilhantes e “palavras amigas subverterem o simbolismo do betão cinzento e da vedação de arame farpado”. Lorna conta que partiu em viagem depois de ler a história de um homem que “desaparecia no mundo só com o skate e a câmara fotográfica”. Leu o artigo numa revista, há cerca de um ano, leu-o outra vez e outra, sublinhou umas frases, depois outras, e arrumou as malas — e o skate.

O primeiro destino na lista era uma "aldeia minúscula" no Norte da Palestina, perto de Nablus, onde fez voluntariado com a SkatePal, uma organização que trabalha com jovens e que tinha construído um parque de skate nessa mesma comunidade. Foi aí que começou o projecto de ilustração que viria a dar um livro, a ser lançado em Maio de 2018 [vê a galeria].

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Lorna Brown, 36 anos, anda a viajar para contar a história das pessoas através dos sítios DR

Depois da Palestina seguiram-se as galerias de arte a céu aberto de mais dez cidades: Londres, onde vivia, e Bristol, no Reino Unido; Cairo, no Egipto; Nova Iorque, Detroit e Los Angeles nos Estados Unidos da América; Melbourne, na Austrália; Christchurch, na Nova Zelândia; Berlim, na Alemanha; e Helsínquia, na Finlândia. Queria “viajar pelo mundo para perceber como os diferentes lugares inspiraram a arte urbana”, conta. “Cada mural é quase como uma voz única de cada cidade”, diz, porque "a única curadoria passava por conseguir ou não saltar as grades e escapar-se pelo buraco da vedação”.

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Um edifício em Londres, onde a artista vivia e registava a gentrificação, antes de começar a viagem Lorna Brown

Mas, ao longo da viagem, percebeu que nem sempre esta voz única se fazia ouvir. Não conseguiu explorar a street art de Bristol sem dar de caras com um Banksy, por exemplo. Viu a globalização atingir o graffiti, com “os mesmos estilos visíveis em todo o lado”, comenta, ou os mesmos temas a repetirem-se, quase como uma linha temática que unia todas as cidades, “sendo a principal preocupação comum a gentrificação”. 

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Um dos primeiros destinos foi a Palestina, onde a artista passou cinco semanas Lorna Brown

Numa das ilustrações, Lorna representou a mesma fachada de um edifício num bairro de Londres com dez anos de diferença, antes de começar a ser renovado. “Gosto de capturar a passagem do tempo nas caras dos edifícios e fiquei surpreendida por descobrir o quão pouco aquele [edifício] mudou. Vai ser interessente registar se a taxa acelerada de renovação do bairro vai ter impacto daqui a dez anos — e qual vai ser.”

Vêem-se os edifícios, estudam-se as pessoas

As ilustrações mostram edifícios, ou apenas fachadas, quase sempre pautadas por arte urbana, que a artista replica ao pormenor. “As minhas ilustrações são muito urbanas, procuro encontrar criatividade num ambiente de beco, como a malta do skateboard e do graffiti”, descreve. Até porque Lorna faz os dois.

“Acho que, muitas vezes, quando as pessoas olham para o meu trabalho, pensam que é só sobre edifícios impessoais, não sobre pessoas”, sublinha Lorna Brown. “O meu trabalho não é só sobre edifícios", explica. "Não colecciono apenas edifícios bonitos que vejo. [O meu trabalho] é sobre as histórias de um lugar e as histórias das pessoas que habitam nesse lugar.” Quando começa a desenhar, a “perspectiva é sempre a mesma”: “Vou 'construir' o edifício.”

Agora está em Malmö, na Suécia, a cidade escolhida para terminar o livro. A escolha foi fácil: é “uma das melhores cidades para andar de skate”, ri-se. Há pouco tempo entrou em contacto com a Cuba Skate para tentar passar uns meses em Cuba, no próximo ano, combinando o voluntariado com um novo livro. Sobre a história do país contada através da arquitectura dos seus edifícios, claro.

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