Maioria dos catalães quer um governo que restabeleça a convivência e sare as feridas

Ex-conselheiros detidos vão pedir para aguardar julgamento em liberdade, agora que o processo passou para o Supremo. Blocos pró e anti-independência estão quase empatados a três semanas e meia das eleições.

Inés Arrimadas, no lançamento da sua candidatura, a mais bem colocada entre os partidos que se opõem à independência
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Inés Arrimadas, no lançamento da sua candidatura, a mais bem colocada entre os partidos que se opõem à independência Andreu Dalmau/EPA
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Miquel Iceta, num pequeno-almoço com jornalistas em Madrid, onde esteve Pedro Sánchez ZIPI/EPA

A menos de um mês das eleições autonómicas de 21 de Dezembro na Catalunha, as intenções de voto no conjunto dos partidos independentistas não chega à maioria absoluta, isto apesar de ser maior que a soma dos votos das formações constitucionalistas, que se opõem ao soberanismo e ao direito dos catalães a votar sobre o seu futuro político.

A caminho de umas eleições absolutamente excepcionais – Carles Puigdemont descreve-as como “as mais transcendentes da História” catalã –, sabe-se que a participação será alta (em 2015 já bateu recordes com 75%) e espera-se que os eleitores do Partido Popular, Socialistas da Catalunha e Cidadãos estejam particularmente mobilizados. Contrários à  independência, assistiram impávidos ao referendo sobre a autodeterminação de 1 de Outubro e à declaração de independência no parlamento autonómico, a 27 de Outubro.

Por outro lado, aos independentistas, que viram o governo que elegeram destituído por Madrid e mais de metade dos seus membros em prisão preventiva, também não faltam motivos para se mobilizarem, apesar de sobrar o cansaço da tensão acumulada.

Em todos os inquéritos, a ERC (Esquerda Republicana da Catalunha) continua a surgir como partido mais votado, mas na nova sondagens realizada pelo instituto Metroscopia para o diário El País, saltam à vista outros dados: ao todo, independentemente do seu sentido de voto, 80% dos catalães deseja uma fórmula de governo “cuja prioridade seja restabelecer a convivência” e “estancar as feridas”.

Famílias divididas, amigos que deixaram de se falar e até gente com origem noutras regiões de Espanha a decidir abandonar a comunidade: de tudo aconteceu na Catalunha e, de um e de outro lado, muitos admitem que a tensão cresceu a um ponto intolerável e será preciso recomeçar por lidar com isso mesmo, ganhe quem ganhar.

Se olharmos para os eleitores de cada um dos partidos que manterá representação parlamentar, a esmagadora maioria, em qualquer campo, aposta numa coligação pós-eleitoral.

Os próprios eleitores já perceberam que não haverá maiorias fáceis nem óbvias – a soma da ERC com a Juntos pelo Catalunha (lista do PDeCAT de Puigdemont, o president destituído que aguarda na Bélgica uma decisão sobre o pedido de extradição da Justiça espanhola), antes no governo (Juntos pelos Sim), aos votos da CUP, que apoiava a coligação, está nos 46% (um pouco abaixo dos 47,7% que obtiveram em 2015). Com estes resultados elegeriam 67 deputados, um abaixo da maioria.

Os mesmos cerca de 46% somam por agora os unionistas – com 100% dos eleitores do PP a apostarem numa coligação a três, o mesmo que pensam 91% dos catalães convencidos em votar Cidadãos e 60% dos que já sabem que darão o seu voto aos socialistas.

Coligação à vista

Face a estes resultados, e com os líderes dos dois partidos constitucionalistas da direita a insistirem num pré-acordo, o líder do PSC, Miquel Iceta, lá disse que “não haverá repetição de eleições” por sua causa. Ou seja, se com os votos do PSC “não será investido nenhum candidato independentista”, Iceta está disponível a dar apoio ao Cidadãos de Inés Arrimadas (de longe, o partido mais votado dos três).

Acompanhado pelo líder do PSOE numa conferência em Madrid, Iceta ouviu um jornalista perguntar-lhe “Então, só pode ser você o presidente constitucionalista?”. “Sei que é presunçoso, e estou disposto a contemplar outras possibilidades, mas tendo uma tão boa…”, brincou Iceta.

Já entre os independentistas, os eleitores da ERC e dos nacionalistas conservadores Juntos pela Catalunha apoiam esmagadoramente a busca de uma solução de governo negociada. Divididos (literalmente, 50%-50%) estão os votantes do partido à esquerda da ERC, a CUP. São bastantes mais os que recusam esquecer o independentismo (40% dos catalães, aliás, aposta num executivo ERC/ Juntos pela Catalunha/ CUP), mas só 24% da população apoia a estratégia de ruptura adoptada na legislatura interrompida pela intervenção de Madrid.

A três semanas e meia da ida às urnas, muito pode mudar. Por exemplo, se os candidatos detidos puderem sair em liberdade e fazer campanha. Um cenário mais possível desde que todos os processos abertos por causa do independentismo passaram para o Tribunal Supremo e ficaram nas mãos do magistrado Pablo Llarena, novo instrutor da investigação por rebelião, sedição e desvio de fundos contra todos os membros do antigo governo e alguns parlamentares.

Detidos desde 2 de Novembro, os quatro ex-conselheiros do PDeCAT Jordi Turull, Josep Rull, Joaquim Forn e Meritxell Borràs, assim como os quatro da ERC, Raül Romeva, Dolors Bassa, Carles Mundó e o ex-vice-presidente, Oriol Junqueras, tentam sem sucesso ser ouvidos para afirmar que acatam a aplicação do artigo 155 da Constituição e reconhecem a legalidade das eleições de 21 de Dezembro, convocadas por Mariano Rajoy.

Agora que o caso passou da Audiência Nacional para o Supremo, o pedido será formalizado esta terça-feira e espera-se que possam ser ouvidos em breve.

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