GNR que sobreviveu aos crimes de Aguiar da Beira vive com medo

Arguido Pedro Dias poderá vir a falar pela primeira vez em julgamento na próxima terça-feira.

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O GNR tem ainda constante preocupação com alguns movimentos pois tem receio de que a bala que tem alojada na cervical se mova e lhe provoque lesões permanentes Hugo Santos

A irmã do GNR que sobreviveu aos crimes de Aguiar da Beira disse, esta quarta-feira, em tribunal que o militar vive constantemente com medo, o que o leva a ter sempre as portas trancadas e as janelas fechadas.

Fátima Espadilha recordou, esta quarta-feira, que o seu irmão António Ferreira - que na madrugada de 11 de Outubro de 2016 foi atingido por um tiro e viu o seu colega Carlos Caetano ser assassinado, alegadamente por Pedro Dias - lhe diz que "as portas são para fechar".

Segundo a mulher, António Ferreira teve vigilância à porta de casa até Dezembro, mas "deixou de ter". "Passam lá, mas não estão na porta", contou. O advogado do militar, Pedro Proença, explicou aos jornalistas que, no âmbito do programa de vigilância e protecção de testemunhas, "houve uma vigilância fixa junto à casa do militar Ferreira até Dezembro", com militares da GNR à paisana a fazer vigilância 24 horas por dia, por turnos.

"A partir de um determinado momento, a própria GNR, o comando, entendeu que não se justificaria manter essa vigilância", contou, acrescentando que nunca concordou com esta alteração. Na altura, o advogado mostrou a sua apreensão e espanto por essa alteração das medidas de vigilância, por ter "sinais" de que "havia e persistem riscos para a integridade física do militar Ferreira".

"Ele já depôs e à partida, esse nível de perigo terá sido atenuado. Mas, até à data do depoimento, tínhamos informações de que poderia haver algum risco para a integridade física de uma testemunha que era fundamental e essencial no processo", frisou.

Pedro Proença contou que, mesmo na altura em que tinha vigilância à porta de casa, "esse comportamento de medo já era notório e evidente e revelava já um trauma daquilo que ele viveu".

Durante o seu depoimento, Fátima Espadilha descreveu as limitações com que o irmão vive, nomeadamente o facto de não poder fazer alguns movimentos com receio de que a bala que tem alojada na cervical se mova e lhe provoque lesões permanentes."Andar a cavalo, andar de tractor, ir apanhar comida para as cabras... acabou tudo", lamentou, explicando que o militar é que costumava ajudar os pais na agricultura.

Durante a manhã, foram ouvidas várias testemunhas alusivas aos pedidos de indemnização dos pais de Carlos Caetano, António Ferreira, Liliane e Luís Pinto (o casal baleado junto à estrada nacional, em Aguiar da Beira).

Pedro Dias, que está acusado de três crimes de homicídio qualificado sob a forma consumada e outros tantos sob a forma tentada, poderá falar em tribunal na próxima terça-feira, se nesse dia ficar concluída a produção de prova.

O seu julgamento começou a 3 de Novembro, no Tribunal da Guarda, mas nesse dia optou por não prestar declarações. Esta quarta-feira, depois de concluídos os depoimentos das testemunhas referentes aos pedidos de indemnização dos familiares das vítimas e faltando apenas ouvir as testemunhas de defesa, os advogados admitiram que o arguido poderá falar na terça-feira.

"Antes que [o julgamento] termine, falará. Se terminar na terça-feira, falará na terça-feira", disse aos jornalistas o advogado Rui Silva Leal, que assegura a defesa de Pedro Dias juntamente com Mónica Quintela. Mónica Quintela referiu que, apesar de faltarem apenas ouvir as testemunhas de defesa, hoje "foram requeridas novas diligências" e a produção de prova poderá não terminar na terça-feira.

Um dos requerimentos, que foi apresentado pela defesa de Pedro Dias, está relacionado com divergências nos depoimentos quanto ao período que o militar da GNR Carlos Caetano viveu com a companheira, Katherine Azevedo, antes de ser assassinado.Testemunhas de Katherine Azevedo ouvidas, na terça-feira, tinham referido que eles viviam juntos há mais de dois anos, mas, já esta quarta-feira, testemunhas dos pais de Carlos Caetano aludiram a alguns meses, entre o Verão de 2016 e o dia dos crimes.

A defesa de Pedro Dias argumenta que mesmo Katherine e o pai de Carlos Caetano "afirmaram nos autos que aquela coabitação, à data da morte de Carlos Caetano, ocorria desde Julho de 2016 ou há dois meses". Por isso, pediu a leitura dos autos de inquirição ou, havendo oposição a isso, que ambos sejam ouvidos em tribunal.

"O que está em causa é saber se efectivamente ocorre uma determinada situação jurídica, que é uma união de facto", explicou Mónica Quintela.

"Este tipo de requerimentos e este tipo de incidentes criados no processo acontecem porque as coisas não estão propriamente a correr de feição ao arguido no que respeita à contraprova de factos essenciais na parte penal do processo", considerou por seu turno Pedro Proença, antecipando que o arguido contará, na terça-feira, "uma versão artificial" dos acontecimentos, que "vai construir" em função do que tem ouvido durante o julgamento.

"O senhor Pedro Dias hoje [quarta-feira] passou o dia a escrever, não foi a anotar rigorosamente nada do depoimento das testemunhas", afirmou.

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