Santana ou Rio? “Qualquer um serve”, desde que puxe o PSD para o centro

José Miguel Júdice apresenta esta quarta-feira, dia 22, em Coimbra, o livro do social-democrata Carlos Encarnação sobre o país durante e depois da troika.

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Carlos Encarnação decidiu abandonar a Câmara de Coimbra e a vida política em 2010 Nuno Ferreira Santos

Carlos Encarnação foi deputado, secretário de Estado, governador civil e autarca e entende que o PSD precisa de um novo rumo. Quando, em 2010, deixou a presidência da Câmara de Coimbra, anunciou também o abandono da carreira política, decisão que mantém. Mas lembra que isso não significa que "deixe de pensar, de escrever ou de actuar como cidadão". É isso que tem feito e nesta quarta-feira apresenta um livro intitulado Vou por aqui, não vou por aí. <_o3a_p>

Antes de 2015 escrevia que Costa e Rio eram o país que interessa. Essa afirmação mantém-se actual?
Parece que sim. Independentemente de ser o dr. Santana Lopes ou o dr. Rui Rio a ganhar, colocava-se sempre a questão de uma nova liderança do PSD. Havia um problema com a anterior - que geriu o país num momento muito difícil e ganhou umas eleições – mas a verdade é que funcionava como o seguro de vida do PS. Estava tão marcada a actividade governativa de Passos Coelho que, quando olhavam para ele, olhavam para a austeridade, para os sacrifícios, para a punição que receberam. Portanto, não conseguiam descolar.

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Já disse que Passos Coelho devia ter abandonado a liderança do PSD mais cedo. Quando?
O dr. Paulo Portas foi muito inteligente. Chegou ao fim daquela coisa e percebeu que não havia lugar para ele e disse "até amanhã, se Deus quiser, vou tratar da minha vida". Se o dr. Passos Coelho tivesse feito a mesma coisa, poderia inclusivamente salvaguardar-se como reserva da República e aparecer num outro momento. Isso não aconteceu. Eu privava com as pessoas e compreendia que não havia possibilidade, principalmente nos grandes centros urbanos, de o PSD ser bem sucedido [nas autárquicas].

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O problema esteve nos candidatos ou em quem os escolheu?
Nos dois. O PSD teve derrotas absolutamente inacreditáveis em Lisboa e no Porto. Teve uma derrota significativa em Coimbra.

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Mas em Coimbra apoiou uma candidatura adversária do PSD.
Sim. Tive três mandatos sempre com maioria absoluta. Foram um exercício governativo o mais abrangente possível, com um grande conjunto de independentes. O actual reitor João Gabriel Silva, Carlos Fiolhais, esta gente toda que agora apoiou José Manuel Silva, e o próprio, foi minha apoiante. Nesta altura, o PSD avançou com uma solução que, pura e simplesmente, pôs fora 16% do eleitorado. É uma solução abstrusa. Politicamente, ninguém foi competente o suficiente para perceber que, com aquela solução [Jaime Ramos], o resultado seria aquele. 

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Voltamos à questão de quem escolheu e dos candidatos.
Sim. A candidata de Lisboa, quem é que a escolheu? Foi o líder do partido. Foi uma péssima escolha. No Porto houve um erro inicial. Quando apareceu o actual presidente da câmara, o PSD devia tê-lo apoiado. [Em 2013] Foram arranjar um candidato extraordinário, que tinha feito a vida negra ao Rui Rio, que era o Luís Filipe Menezes. O Rui Rio teve a mesma atitude que eu tive, apoiar o outro.

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Entre Rio e Santana, quem tem um melhor perfil para disputar as eleições com António Costa?
No último artigo do livro tenho lá aquilo que penso em relação a esse assunto de uma maneira sistematizada e clara. 

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Diz que é preciso um novo rumo. Mas...
Qualquer um serve, desde que o PSD pense de maneira diferente, actue de maneira diferente, fale de maneira diferente. Não vale a pena estar a dizer que é um novo líder, se, na verdade, não introduz modificação essencial. 

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Mas os candidatos têm perfis diferentes e há diferentes formas de o fazer.
Claro. Verdadeiramente importante é esta ideia de alteração destas três condições que acho fundamentais para o PSD reganhar o seu eleitorado. O PS, nesta altura, ganhou todo o eleitorado do centro, mobilizando aquilo que é eleitorado possível do PSD, mobilizando e dando bónus à esquerda em cada um dos pontos em que negoceia. 

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Tem defendido que o PSD deve ser recolocado ao centro. A questão é qual dos candidatos está em melhores condições de o fazer.
Rui Rio, por acaso, já teve uma declaração nesse sentido. Santana Lopes não reparei se teve ou não. Rio disse uma verdade: o PSD não é de direita, é de centro-esquerda, centro-direita. Esse é o seu verdadeiro lugar no espectro nacional. Quem assim pensar, será aquele com quem estarei de acordo. 

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Um novo posicionamento significaria uma nova na relação com o Governo?
O Governo, pelo caminho que leva, também está num plano inclinado. Esta história da negociação é muito bonita, do ponto de vista democrático. Mas a verdade é que o país precisa de algo mais do que isso. Se cada classe profissional vai buscar nas negociações a melhoria da sua situação e os outros ficam a olhar para ela, isto é um problema que acaba por se tornar numa verdadeira epidemia. Isto é uma coisa que só tem fim quando se disser 'olhe, desculpe, não há mais dinheiro'. O que há a fazer? É fazer as reformas do país como devem ser feitas. Não como punição para as pessoas, como era a ideia que o PSD muitas vezes apresentava, não como inevitabilidade histórica, mas de tentativa de fazer mais com menos, de conseguir fazer com que o país progrida, sem perder de vista o bem-estar dos portugueses. E, para isso, ou o PS arranja outros interlocutores ou está feito. Nunca defendi que PS e PSD devem estar no mesmo Governo.

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Mas quando diz que o PS tem de arranjar outros interlocutores, isso significa um entendimento?
Isso significa que o PS tem de ter outros objectivos políticos, mais claros sobre o que é necessário mudar em Portugal e encontrar quem queira estar com ele. Podem ser estes. Se estes quiserem estar, óptimo. Mas talvez fosse bom um entendimento mais alargado. Aquilo que o PS faz, nesta altura, é um exercício de exclusão, beneficiando apenas a esquerda. Em termos governativos e democráticos, deve ser feito de outra forma.

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Quando este modelo de Governo foi anunciado, escreveu que "gostaríamos de acreditar" que iria durar quatro anos.
Contra muitas opiniões, disse na altura que o Governo tinha legitimidade democrática. 

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Mas colocava em causa que esta solução durasse a legislatura.
Dizia que, ou as pessoas vão ter equilíbrio e fazer um processo negocial intensíssimo, diário, exigentíssimo, para conseguir produzir resultados, ou então isto não vai chegar ao fim. É isso que tem acontecido, porque ninguém quer abrir crise nem perder o pouco poder que tem. O PCP e o BE estão próximos do poder, o PS vai aumentando a votação com o centro esquerda que lhe vai chegando. É uma solução cómoda para todos. Isto tem garantido o apoio de parte significativa das pessoas. O que eu digo é que, se calhar, isto não é suficiente. 

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Isso quer dizer que, num próximo Governo, o PS deve olhar mais para a direita e menos para a esquerda?
Não. O PS deve olhar para o centro, deve fixar-se no centro e reforçar o centro governativo. Porque é aí que resulta o equilíbrio para esta situação difícil que o país vive. O país não pode ser governado à esquerda nem à direita.

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