Castro de Sabroso vai sacudir as mimosas e ser recuperado

Monumento Nacional desde 1910, o castro da Idade do Ferro tem algumas das estruturas em risco por causa das mimosas que têm afectado o local nos últimos 40 anos. Agora vai dispor de 50 mil euros para ser recuperado e depois integrado na rede de castros do Noroeste.

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As estruturas graníticas que evocam, numa superfície de cerca de três hectares, um povoado que habitou a elevação que é hoje o Monte do Coto de Sabroso, no noroeste do concelho de Guimarães, ficaram mais próximas de terem o futuro assegurado com a confirmação, a 31 de outubro, de que o projecto de requalificação submetido ao Orçamento Participativo (OP) do município foi um dos escolhidos para ser executado.

Orçada em 50 mil euros, valor máximo permitido pelo OP, a proposta submetida por Carlos Marques, sócio da Sociedade Martins Sarmento (SMS), entidade responsável pelo Castro de Sabroso desde 1921, prevê a aplicação de 31 mil euros na consolidação das estruturas, de 15 mil em escavações arqueológicas e de 3.500 em equipamentos e já recebeu a garantia da Câmara que vai ser incluída no orçamento municipal para 2018, apesar do projecto ter ainda de ser discutido com a autarquia, explicou ao PÚBLICO Gonçalo Cruz, arqueólogo da instituição.

A intervenção, avançou o especialista em proto-história, visa, sobretudo, tornar “limpo e circulável” aquele espaço, habitado, pelo menos, entre os séculos III a.C. e I a.C., e depois incluí-lo na rede de castros do Noroeste Peninsular. A mais-valia do castro, diz, reside na primeira das duas muralhas lá construídas, com cinco metros de altura, na maior parte dos pontos, e mais de quatro metros de espessura, dimensões anormalmente grandes para um castro relativamente pequeno, com 35 casas circulares e três rectangulares, dispostas sem ruas entre elas.

Para isso, a obra contempla a vedação de toda a área do castro a jipes, motas e bicicletas, mas com um acesso para permitir “visitas livres”, a colocação de informação e a conservação das estruturas “em pior estado, a ameaçar derrocada”. Várias das ruínas do Castro de Sabroso, escavado pela primeira vez entre 1877 e 1878, pelo arqueólogo Martins Sarmento, encontram-se em risco desde a década de 70, quando “começou a haver menos limpeza da vegetação em geral” e surgiu a “infestação por mimosa”, que continua a ser uma ameaça, disse o especialista. As mimosas, lembrou, deixaram até várias das construções “parcialmente destruídas”, após terem tombado sobre elas no rescaldo de um incêndio que lavrou nas imediações, em 2013.

A proposta eleita no âmbito do OP baseia-se, aliás, num projecto de requalificação elaborado nesse ano, na sequência desses danos, e já recebeu pareceres favoráveis da Unidade de Arqueologia da Universidade do Minho e da Direcção-Geral do Património Cultural, adiantou Gonçalo Cruz, um dos autores do projecto, a par do arqueólogo José Antunes.

Num cenário ideal, essa requalificação exige, contudo, 170 mil euros, e envolve ir mais além na conservação das estruturas “mais instáveis” – para uma requalificação total, esta parte requer, desde logo, 100 mil euros –, e uma “limpeza arqueológica”, com a remoção da matéria vegetal que se acumulou nas ruínas e uma intervenção de conservação nas estruturas “mais instáveis”, descreveu o arqueólogo. A verba, acrescentou, serviria também para uma musealização mais completa do espaço, com um painel maior a identificar a planta do castro e outros mais pequenos em locais como as gravuras rupestres e o “ponto em que a segunda muralha arrancou da primeira”, mas tais obras seriam apenas possíveis com outra fonte de financiamento, algo que até agora a SMS não conseguiu.

A desinfestação das mimosas, outra das necessidades para a preservação de Sabroso, tem sido garantida nos últimos dois anos pela União de Freguesias de S. Lourenço de Sande e de Balazar, numa iniciativa, motivada, em parte, pelo incêndio de 2013, que custou cerca de 15 mil euros, ao longo do mandato anterior do presidente Francisco Gonçalves.

O autarca salientou ao PÚBLICO que a requalificação prevista vai valorizar não só o Castro de Sabroso, com um aumento das visitas, mas igualmente a área envolvente da União de Freguesias, enquanto o autor da proposta, Carlos Marques, acredita também que a requalificação pode “arrastar o turismo em Guimarães para além dos muros da cidade”, até pela proximidade da Citânia de Briteiros, estação arqueológica da mesma época a quatro quilómetros do castro, que, segundo Gonçalo Cruz, tem a maior área escavada do Noroeste de Portugal – sete hectares – e chegou a albergar perto de três mil pessoas no século I a.C.

Muralha pode ter guardado uma elite da população ou um lugar sagrado

O traço mais distintivo de Sabroso, disse Gonçalo Cruz, reside na “muralha exageradamente grande” para um “castro tão pequeno”, que denotava as “muitas preocupações defensivas” da população aí residente. Apesar de não estar ainda confirmada a razão para as dimensões da fortificação, o arqueólogo crê que o Castro de Sabroso era “residência de uma elite” ou “importante do ponto de vista ritual”, com sítios considerados sagrados, ou até ambas as coisas.

O especialista sustenta a tese de que o local albergou um grupo privilegiado da sociedade da época pelos “muitos materiais importados da Idade do Ferro” já encontrados nas sondagens arqueológicas, incluindo objectos de vidro oriundos da Palestina ou do Egipto, uma moeda de prata cunhada em Roma no século II a.C., época anterior à ocupação romana da Península Ibérica, e ânforas que traziam produtos como azeite e vinho - na altura, não havia cultura da vinha na região, esclareceu.

Por outro lado, a ideia do espaço dedicado ao culto provém do altar rupestre que lá se encontrava antes da construção do próprio castro – “um penedo com uma cavidade decorada a toda a volta para sacrifícios”, detalhou Gonçalo Cruz – e da descoberta de duas estátuas de porcos, que “provavelmente representavam divindades”.

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