Como? Quando? Quanto? O que diz o compromisso do Governo com os professores

Foi o "texto possível", diz João Dias da Silva, da Federação Nacional da Educação.

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Rui Gaudêncio

Após três dias de rondas negociais, com a última a estender-se até às cinco da manhã deste sábado, de uma greve nacional de professores e duas outras sectoriais, os sindicatos de professores conseguiram ter um compromisso por parte do Governo de que o tempo de serviço prestado durante o período de congelamento das carreiras seria contado para efeitos de progressão.

Na proposta de Lei do Orçamento de Estado para 2018 tal não estava previsto e, durante esta semana, o Governo fez saber por várias vezes que continuaria assim. A concretizar-se o compromisso subscrito esta madrugada entre sindicatos e Governo, o tempo vai mesmo contar, mas não se sabe quanto deste tempo será contabilizado, nem em que moldes. Tudo ficou adiado para futuras negociações em Dezembro.

Até ao início da madrugada deste sábado, os sindicatos de professores continuavam a dar como “inegociável” que não ficasse expresso que o tempo de serviço a recuperar não era só o dos últimos sete anos de congelamento (2011-2017), como chegou a ser admitido informalmente pelo Governo, mas também os dois anos em que as suas carreiras estiveram congeladas entre 2005 e 2007. Ou seja, mais de nove anos.

O líder da Federação Nacional da Educação (FNE), João Dias da Silva, disse ao PÚBLICO que este foi o "texto possível" e que os sindicatos têm consciência de que "o Governo pretende ter outra interpretação" do que significa o tempo de serviço a contabilizar, mas que os professores não abdicarão dos nove anos. "É uma questãso que por certo vai voltar a estar em cima da mesa nas negociações de Dezembro", disse.

Se tal número ficasse firmado no documento, “provavelmente” teria sido assinado um acordo esta madrugada, disse o líder da Federação Nacional de Professores (Fenprof), Mário Nogueira, no final da última ronda negocial. Mas o que consta, a este respeito, no “compromisso” assinado, que não é um acordo ainda, é apenas isto: a promessa de “negociar o modelo concreto da recomposição da carreira que permita recuperar o tempo de serviço”.

Não está esclarecido o que se entende exactamente por recomposição das carreiras, mas esta menção poderá abrir portas a uma revisão do Estatuto da Carreira Docente, uma questão que os sindicatos tinham dada como resolvida.

Para quando a recuperação do tempo?

Em declarações ao PÚBLICO, Mário Nogueira disse que só aceitaram subscrever o compromisso, mesmo não esclarecendo este qual o tempo de serviço que será compatibilizado, porque ficou assente que o assunto não estava fechado e que continuaria "tudo em aberto" para as negociações de Dezembro.

Nogueira conta que "a maior guerra de todas" foi a de conseguir substituir um "de" por "o". Mais concretamente, explica, o Governo pretendia que se inscrevesse no texto do compromisso a expressão "recuperação de tempo de serviço", o que, adianta Nogueira, tanto poderia significar três meses ou quatro anos ou qualquer outro período de tempo, mas os sindicatos conseguiram que a expressão fosse a de "recuperar o tempo de serviço", o que permitirá aos docentes continuar a insistir nos nove anos.

Outro ponto que era dado como “inegociável” pelos sindicatos dizia respeito à altura em que se iniciaria esta recuperação do tempo e a reposição salarial daí decorrente, afirmando que não aceitariam que o Governo chutasse o princípio deste processo para 2020, como chegou a ser indicado.

No compromisso assinado esta madrugada indica-se que o início da produção de efeitos será feito ainda nesta legislatura, “prevendo-se o seu final no termo da próxima” ou seja, 2023, um prazo que os sindicatos também chegaram a contestar.

Também em 2018, os professores contratados que entraram na carreira, mediante processos de vinculação extraordinária, serão reposicionados nos escalões a que tinham direito caso as carreiras não estivessem congeladas. Esta disposição já se encontrava prevista na proposta de lei do Orçamento do Estado apresentada pelo Governo para 2018, que também já fizera saber que iria abranger sete mil docentes. O que no “compromisso” desta madrugada se confirma é que esta recomposição se fará por inteiro no próximo ano, uma medida que já tinha sido contabilizada pelo Governo nas contas que apresentou quanto ao impacto orçamental para 2018 do descongelamento das carreiras dos professores: 20 milhões de euros.

A esta verba juntam-se os 90 milhões de euros também disponibilizados para 2018 para cobrir os custos da progressão dos 46 mil professores que, mesmo sem recuperação do tempo de serviço, já estavam condições de avançar. Porquê? Porque sendo posto a contar o cronómetro na altura em que se inicia o descongelamento, 1 de Janeiro de 2018, como estava previsto na proposta inicial de OE que acontecesse, já terão nessa altura completado o tempo de serviço em cada escalão, por regra quatro anos.

Mais progressões em 2018

Em 2018 o Governo também contava acolher os custos da progressão dos professores que se encontram bloqueados no 4.º e 6.º escalões. Não se sabe ainda o impacto desta medida porque o acesso ao 5.º e ao 7.º escalão se faz mediante a abertura de vagas e estas ainda não estão definidas. O processo negocial com vista à sua fixação inicia-se na próxima semana. De acordo com os dados do Governo, há 14 mil professores no 4.º escalão à espera de transitar para o 5.º e oito mil parados no 6.º.

Mas do compromisso assinado esta madrugada resulta um novo impacto orçamental para 2018 pela aceitação da reivindicação dos sindicatos para que seja retirada da proposta de lei do OE um artigo que tinha esta consequência prática: os professores colocados no 8.º e 9.º escalões, numa carreira que tem 10, teriam de permanecer um total de seis anos na mesma posição, em vez dos quatro previstos no seu estatuto, antes de poderem progredir.

Se esta alteração se concretizar aumentará assim o pelotão dos docentes que poderão progredir já em 2018 e pela primeira vez, desde que a actual carreira está em vigor (2010), existirão professores a atingir o topo da carreira. No 8.º escalão estarão 10 mil professores e no 9.º cerca de três mil.

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