Ordem quer que relação médico-doente seja património da humanidade

Iniciativa espanhola tem o apoio da Ordem dos Médicos portuguesa. “É fundamental para melhorar a qualidade e a humanização da medicina." Bastonário já enviou um pedido de reunião com o secretário-geral da Organização das Nações Unidas.

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Há pouco tempo para os doentes. Neste momento, diz a Ordem, os hospitais estão a marcar consultas de 15 em 15 ou de 10 em 10 minutos MARIA JOÃO GALA

A Ordem dos Médicos quer ver a relação médico-doente elevada a Património Cultural Imaterial da Humanidade da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação e Cultura). A candidatura é espanhola, mas tem o apoio dos médicos portugueses, que já enviaram um pedido à ONU para se reunirem com o secretário-geral.

O tema foi discutido no ano passado em Coimbra, num encontro onde estiveram as ordens dos médicos de Espanha e Portugal e congéneres de países de língua castelhana e portuguesa. E desde a primeira hora que acolheu o apoio dos médicos portugueses. “No dia em que for reconhecida, estamos a dar uma importância à relação médico-doente que ela não tem recebido dos países e respectivos governos. Esta importância é fundamental para salvaguardar a segurança clínica, tanto dos doentes como dos profissionais, e isto é fundamental para melhorar a qualidade e a humanização da medicina”, explica o bastonário dos Médicos, Miguel Guimarães, a propósito do 20.º Congresso Nacional de Medicina, que começa neste sábado e tem como tema central “A Relação Médico-Doente: Património do ser Humano”.

Guimarães diz ainda que o processo para a candidatura a património imaterial já chegou ao Governo espanhol e que este já terá enviado a proposta para a UNESCO.

A Ordem dos Médicos portuguesa quer ir mais longe no apoio. “Está pedida uma reunião nas Nações Unidas, com o secretário-geral [António Guterres] no sentido de lhe falarmos da questão médico-doente. Queremos criar um facto político, chamar a atenção de que o tema é importante e tentar influenciar positivamente este processo que está em andamento”, diz.

A ser aprovada, a relação médico-doente junta-se-ia à dieta mediterrânica, por exemplo, como Património Cultural Imaterial da Humanidade. “Vamos empenhar-nos até ao limite.” Para Miguel Guimarães também esta “é uma forma de lutar contra o excesso de burocracia que existe no SNS e de lutar contra a imposição de tempos que são completamente absurdos na relação médico-doente”. Neste momento, diz, os hospitais estão a marcar consultas de 15 em 15 ou de 10 em 10 minutos. “Todos entendem que quando estamos a resolver uma situação é preciso ter o tempo necessário para o fazer e esse tempo não está a existir.”

A Ordem espera publicar em Janeiro uma recomendação com tempos mínimos para consultas adaptados às necessidades de cada especialidade. “Vamos tentar definir com os colégios três ou quatro tempos padrões que depois serão aplicados de acordo com as necessidades. Psiquiatria é a especialidade que tem de ter o maior tempo, tal como medicina interna e neurologia.”

Mas há uma outra questão que está a limitar a relação médico-doente. A marcação de mais de um doente para a mesma hora. “Marcam mais porque têm doentes, nomeadamente da área oncológica, que têm de ser observados em determinada altura. Todos os médicos estão a fazer um esforço porque há uma insuficiência grande de profissionais de saúde”, afirma, estimando que no SNS faltem entre 4 mil e 5 mil médicos.

O bastonário falou ainda do novo Juramento de Hipócrates. A primeira formatura em Portugal com o novo compromisso é já neste fim-de-semana. “Em termos práticos está mais adaptado aos tempos modernos”, diz Guimarães. "Acrescenta o conceito de bem-estar, além da saúde do próprio doente, incorporando questão que têm sido abordadas pela Organização Mundial de Saúde." Entre as novidades, está a introdução do respeito pela autonomia e dignidade do doente e os médicos terem de se comprometer a olhar pela sua própria saúde.

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