Menos impostos no interior? Claro

O país que aceita a zona fiscal opaca na Madeira também terá de aceitar a ideia de uma discriminação fiscal positiva a favor destas regiões.

Há 30 anos, uma capital de distrito — ou uma cidade de dimensão razoável no interior — dispunha de um balcão da CGD, dos CTT, da EDP, da Galp, da PT, de serviços da Junta Autónoma de Estradas, da Direcção-Geral de Florestas, Segurança Social, Saúde ou Justiça. No passado mais recente, o efeito centrípeto do Estado português traduziu-se na paulatina concentração de alguns destes serviços públicos em Lisboa. Lembram-se da contestação de Almeida ao encerramento de um balcão do banco público? Almeida era longe de mais. Ou da forma como muitas populações do interior protestaram contra as consequências do fecho e deslocação de centros de saúde, hospitais ou tribunais? A privatização de empresas públicas com forte distribuição pelo território fez o resto e o legado foi um interior destituído de serviços, logo, com menos ofertas de emprego e menos oportunidade de criação de riqueza. E o que aconteceu com os serviços públicos foi o que aconteceu com os residentes em regiões onde os movimentos migratórios sempre foram uma necessidade.

Actualmente, mais de metade da população concentra-se só em 33 municípios do litoral e o que nos dizem as projecções do Instituto Nacional de Estatística é estarrecedor para o futuro do interior: a população será inferior a 10 milhões em 2031 e será apenas de 7,5 milhões em 2080. Sem pessoas, recursos e serviços, não há economia que possa emergir num deserto queimado. As duas vagas de incêndios devastadores neste ano geraram comoção e forçaram o Governo a olhar para além do perímetro em que se concentra. Não poderia ser de outro modo. Não custa concordar com o líder da UGT, Carlos Silva, quando este propõe um pacto de regime para combater a desertificação do interior, uma reforma da floresta, a atribuição de incentivos a empresas, como a redução do IRC, para que as mesmas se fixem nestas áreas do país ou até benefícios especiais para trabalhadores que façam o mesmo.

Também não custa concordar com Pedro Siza Vieira, o ministro adjunto, que ontem afirmou, no Parlamento, no debate sobre o Orçamento do Estado, que deveriam ser ponderadas propostas fiscais para a “relocalização” de empresas e de pessoas e que admitiu a redução de portagens no interior. O país que aceita a zona fiscal opaca na Madeira também terá de aceitar a ideia de uma discriminação fiscal positiva a favor destas regiões. E isso é agora, ou é hipocrisia.

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