Mudanças em Angola lançam dúvida sobre participação no BCP

Petrolífera estatal angolana, da qual Isabel dos Santos foi afastada, é o segundo maior accionista do banco português.

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Sonangol é o segundo maior accionista do BCP, depois da Fosun Fábio Augusto
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Galp foi o primeiro grande negócio em Portugal, em associação com a Sonangol e Amorim Nuno Ferreira Santos

Num plano de investimentos cruzados entre Portugal e Angola, a primeira dúvida que se coloca após o afastamento de Isabel dos Santos é sobre o futuro da participação da Sonangol no BCP. Actualmente, a petrolífera detém 15,2% do capital, posicionando-se como o segundo maior accionista (após a chinesa Fosun, dona de 25%).

Em Maio de 2016, no âmbito do processo de reestruturação do grupo estatal angolano encabeçado por Isabel dos Santos (e ainda antes de ser chamada por José Eduardo dos Santos para liderar a empresa), a estratégia desenhada pela Boston Consulting Group passava por colocar esta participação na esfera do Ministério das Finanças angolano.

Em Julho deste ano, com a empresária na presidência da petrolífera, a Sonangol já dizia claramente que a participação era “estratégica”, até porque “acentua a natureza e vocação internacional” da petrolífera.

Agora, no entanto, falta saber qual é a estratégia do novo presidente da Sonangol, Carlos Saturnino (e do novo Presidente de Angola, João Lourenço), numa conjuntura de baixa de preço do petróleo e com a petrolífera em dificuldades ao nível de financiamentos e pagamentos.

A Sonangol é também accionista de outras instituições financeiras, mas de origem angolana, como o BAI e o Atlântico (liderado por Carlos Silva, também ligado ao BCP).

No mais recente relatório aprofundado sobre Angola, divulgado no início do ano, o FMI afirmou que a Sonangol deve “alienar alguns do seus negócios não principais”, focando-se no petróleo e gás. A expectativa é a de que sejam alienadas algumas empresas e participações detidas por aquele que é o maior grupo angolano.

Menos espaço na Galp Energia

O primeiro grande investimento de Isabel dos Santos em Portugal foi através da Galp Energia, onde entrou associada à Sonangol e à Amorim Energia, criada por Américo Amorim, no final de 2005.

Acontece que, neste caso, os dois sócios angolanos, via Esperaza, nunca conseguiram soltar-se da rede tecida por Amorim, que dominou sempre a holding — dona de 33% da Galp — com 55% do capital. No caso concreto de Isabel dos Santos, a empresária angolana pode estar a braços com dificuldades acrescidas, porque detém apenas 45% da Esperaza, cabendo à Sonangol o controle na parceria.

Entre 2005 e 2016, enquanto os interesses da Sonangol e de Isabel dos Santos estiveram alinhados, não houve problemas. E menos houve a partir do momento em que a empresária passou a liderar os destinos da empresa estatal.

Agora, no entanto, com a petrolífera estatal a ser liderada por um gestor que se apresenta como antagónico, Isabel dos Santos fica com muito menos espaço de manobra.

A associação a uma empresa estatal angolana para investir em Portugal ocorreu também em Junho de 2015, quando comprou 65% da Efacec em associação — mas com uma posição maioritária — com a Empresa Nacional de Distribuição de Electricidade (ENDE).

De resto, a empresária tem mais dois bons negócios em Portugal, após ter vendido a participação no BPI (dando espaço ao controlo do Caixabank): o banco Eurobic e a Nos, onde tem havido um equilíbrio com a Sonae (grupo dono do PÚBLICO).

Negócios mais enfraquecidos em Angola

A exoneração de Isabel dos Santos pelo actual Presidente de Angola levanta também algumas dúvidas sobre o desenvolvimento dos negócios da empresária neste país.

Para já, haverá certamente um enfraquecimento, uma vez que João Lourenço quer mais concorrência em duas áreas onde está presente: cimentos, através da Nova Cimangola, e telecomunicações móveis, através da Unitel.

No caso da Unitel, há também a particularidade de a Sonangol deter 25% do capital, via Mercury. E é através da Unitel que Isabel dos Santos detém a maioria do capital do Banco de Fomento de Angola (BFA), após o BPI ter cedido o controlo accionista. Além do BFA, Isabel do Santos domina outro banco, o BIC, tendo ao seu lado Fernando Teles.

Os negócios alargam-se a outras áreas, como o caso da ZAP (operadora de televisão por satélite da qual é dona de 70%, cabendo à Nos outros 30%), retalho alimentar (onde detém a Candango) e diamantes (é dona da empresa De Grisogono).

Neste último caso, há quem veja a exoneração da administração da Sodiam, a empresa estatal de comercialização de diamantes que era liderada por Beatriz Jacinto de Sousa — tida como próxima de Isabel dos Santos —, levada a cabo por João Lourenço no início do mês, como o primeiro sinal de que a posição da empresária ia começar a enfraquecer em Angola.

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