Edição genética tentada pela primeira vez num doente vivo

Homem de 44 anos tem uma doença genética rara. Só daqui a um mês se terá uma ideia se a experiência está a funcionar.

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A molécula de ADN DR

Cientistas procuraram editar pela primeira vez um gene dentro do corpo, para alterar permanentemente o ADN de uma pessoa numa tentativa de cura de uma doença, noticiou esta quarta-feira a agência de notícias Associated Press.

A experiência foi feita na segunda-feira na Califórnia, nos Estados Unidos, num doente com 44 anos, que recebeu milhares de milhões de cópias de um gene correctivo e uma ferramenta genética para cortar o seu material genético num ponto exacto. Esta experiência não está, assim, ainda publicada numa revista científica.

O homem tem uma doença metabólica chamada síndrome de Hunter, caracterizada pela falta de uma enzima que controla determinados hidratos de carbono que se acumulam nas células e causam lesões no organismo.

Dentro de um mês, a equipa de investigadores saberá se a experiência, que decorreu no Hospital Pediátrico Benioff de Oakland, da Universidade da Califórnia em São Francisco, está a resultar ou não. Ao fim de três meses, haverá conclusões definitivas. Se o teste for bem-sucedido, poderá dar um novo impulso à terapia genética.

Os cientistas têm editado genes com outros métodos, alterando células no laboratório que são depois implantadas nos doentes. Existem também terapias genéticas que não implicam a edição de ADN. Estes métodos terapêuticos, contudo, servem para poucas doenças, alguns dão resultados que não são fiáveis, outros originam um novo gene, como se de uma peça sobressalente se tratasse, mas não permitem controlar a sua posição na sequência genética, podendo causar anomalias como cancro.

A metodologia da equipa de cientistas da Califórnia permitiu “cortar” e “abrir” o ADN, inserir um gene e fechar novamente o ADN. A técnica de edição genética CRISPR tem estado constantemente nas notícias pelos avanços que tem permitido, mas neste trabalho estudo usou-se uma técnica diferente chamada “nucleases de dedo de zinco”, uma classe de proteínas de ligação ao ADN. A terapia tem três partes: um novo gene e duas “nucleases de dedo de zinco”. As instruções genéticas para cada um destes três elementos foram colocadas num vírus modificado, para que este não provocasse infecção. Milhares de milhões de células foram injectadas no doente.

As instruções “viajaram” para o fígado, onde as células as usaram para produzir nucleases de dedo de zinco e preparar o gene correctivo. As proteínas “cortam” o ADN, permitindo que o novo gene entre na sequência genética. O novo gene direcciona as células para produzirem a enzima de que o doente carece. “Uma reparação invisível”, segundo Sandy Macrae, presidente da empresa que está a testar a técnica em duas doenças metabólicas e na hemofilia.

A técnica pode apresentar, no entanto, um risco: é que não há maneira de apagar um erro genético que a edição possa eventualmente causar. Além disso, não irá reparar as lesões de que o doente sofre, apenas poderá evitar que tenha de receber tratamentos enzimáticos semanais, que são caros e não previnem danos no cérebro.

Estudos de segurança que irão ser feitos vão envolver um máximo de 30 adultos, mas a intenção dos investigadores é usar o método para tratar crianças antes de as lesões aparecerem. Os doentes com síndrome de Hunter podem ter infecções nos ouvidos, perda de audição, problemas respiratórios e cardíacos, na pele e nos olhos, nos ossos e nas articulações e nos intestinos.

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