“Não queremos encostar o PS à parede, mas apenas chamá-lo à razão”, diz Jerónimo

Líder do PCP insiste em marcar a diferença em relação ao PS e a distância para o Governo de António Costa, e defende que há todas as condições para aumentar salário mínimo para 200 euros em Janeiro próximo.

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À porta dos SMAS, à espera do secretário-geral do PCP estava o presidente da câmara, Basílio Horta, que o cumprimentou efusivamente, lhe deu as boas-vindas a Sintra e desejou "bom trabalho". LUSA/JOSÉ SENA GOULÃO

Numa altura em que se ultimam as negociações do Orçamento do Estado para 2018 e sobe o tom da contestação dos funcionários públicos, o secretário-geral do PCP garante que os comunistas não querem “encostar o PS à parede” mas apenas “chamá-lo à razão” para atender aquilo que são as “aspirações, direitos e vontade do povo português de ter uma vida melhor”.

Jerónimo de Sousa diz que o seu partido está a fazer esse “esforço” de dar uma “contribuição para que as coisas andem para a frente” com “franqueza e frontalidade”, não abdicando da sua independência, do seu programa e objectivos e pensando sempre “no que é melhor para os trabalhadores e o povo”. O líder comunista admite que é um “desafio” constante, que há “contradições insanáveis” com o PS em questões como o limite do défice e os compromissos externos, que criticou duramente.

Falando esta terça-feira ao início da noite para militantes numa acção nos SMAS de Sintra, o secretário-geral comunista tentou afastar-se das opções do executivo de António Costa. “Muitas vezes se coloca esta questão de que existe um Governo de esquerda, um Governo das esquerdas, ou um Governo com um acordo parlamentar. Não existe nada disso; existe um Governo minoritário do PS e uma nova correlação de forças no Parlamento em que foi possível conseguir alguns objectivos nas posições conjuntas que foram assinadas.”

Jerónimo fez questão de vincar que esse documento “define apenas o grau de compromisso do PCP, mas que diz claramente que o primeiro compromisso é com os trabalhadores e o povo e não com o Governo do PS. E aproveitou para apelar à movimentação e reivindicação.

“A luta não pode estar dispensada”

“Com este Governo de esquerda, das esquerdas ou de maioria parlamentar, muita gente pensou que a luta está dispensada. ‘Eles lá na AR entendem-se e tal, fazem lá uns acordos e entendimentos, isto vai ser para a frente e nós podemos ficar em casa descansados.’”, ironizou o líder comunista, para logo a seguir avisar: “Cometeríamos um erro tremendo. A luta não está dispensada; a luta não pode estar dispensada. (…) Isto é sempre uma obra inacabada.”

“Temos este sentimento: conseguimos avanços na reposição de rendimentos e direitos. Limitados e insuficientes, mas que valorizamos. Claro que há sempre a teoria de alguns do tudo ou nada. Ou vem tudo ou isto racha”, apontou Jerónimo de Sousa, para logo a seguir acalmar os ânimos e justificar-se. “A nossa experiência de muitos anos de luta é que às vezes uma pequena vitória é importante porque é do pequeno que se faz grande. Nesta nova fase da vida política nacional valorizamos tanto estes avanços que estamos a conseguir alcançar embora com sentimento de insatisfação.”

Lembrou questões como a do descongelamento das progressões nas carreiras da função pública, que o Governo propunha de forma faseada até 2020 e que o PCP acordou para um ano antes. “Isso deu muita luta. Podemos transformar isso numa derrota? Não, apesar do sentimento de insatisfação por considerarmos que o justo era a reposição total e imediata. Mas é ou não um avanço nesta perspectiva?”, questionou, para responder a si próprio com outros exemplo, como o aumento dos escalões do IRS, os manuais escolares grátis, os aumentos do abono de família ou o extraordinário de dez euros nas pensões que se vai repetir em 2018.

Durante as suas duas intervenções, Jerónimo de Sousa defendeu várias vezes que “o caminho é o desenvolvimento da luta reivindicativa” e argumentou que a “história está cheia de exemplos” de que é a “partir dos locais de trabalho” que a luta se faz. E foi isso que incentivou os camaradas a fazerem, seja pela reposição de direitos ou pela defesa do aumento do salário mínimo para 600 euros em Janeiro próximo, ou seja ainda pela presença em acções concretas, como a manifestação convocada pela CGTP para dia 18, em Lisboa. “Não desarmamos, não nos conformamos que exista tanta coisa para discutir e que continua a não ter resposta no OE2018.”

“Quem ganha o salário mínimo empobrece a trabalhar”

O líder comunista criticou a atitude do Governo e também a do Bloco. Este último, talvez “bem intencionado”, acompanhou a calendarização dos aumentos do salário mínimo nacional (SMN) proposta pelo PS considerando que “era um mínimo e o Governo aproveitou-se disso”.

E apresentou os argumentos para o aumento do SMN para 600 euros no início de 2018 dizendo que a evolução económica provou que o aumento dos salários, pensões e direito é benéfico para a economia, que esta fatia de trabalhadores ainda não recuperou o poder de compra que perdeu em dez anos, que um salário mais alto contribui para o reforço da Segurança Social, e que os salários são apenas um quinto dos custos totais das empresas. “Não há nenhuma razão que justifique que o SMN não chegue aos 600 euros em Janeiro próximo. É uma medida indispensável, justa e exequível. (…) Quem recebe o salário mínimo, depois dos descontos feitos, vai empobrecer a trabalhar.”

Jerónimo de Sousa esteve no auditório dos SMAS de Sintra para uma sessão sobre o salário mínimo nacional que reuniu cerca de quatro dezenas de militantes e activistas comunistas do concelho, e que falaram sobre situações difíceis que têm enfrentado na última década nas empresas e serviços municipais onde trabalham. À chegada e apesar do frio que já se fazia sentir, o líder comunista tinha à sua espera, à porta dos SMAS, o presidente da câmara e os administradores daqueles serviços municipais. Basílio Horta recebeu-o de braços abertos, com um “bem-vindo a Sintra” e desejos de “bom trabalho”.

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