Uma festa de arromba

Afasto os pés para não pisar nada, ao mesmo tempo que olho para o lado e vejo inscrito numa placa: “Eusébio da Silva Ferreira (1942-2014) Futebolista”. Só então caí em mim: estou no Panteão!

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Miguel Manso

Epá, estava mesmo à rasquinha, a cerveja fora mais que muita e um tipo não é de ferro, mas a casa-de-banho nem vê-la, ou então era eu que já estava bem entornado, mas talvez fosse ali mesmo ao lado, levanto-me, a custo, peço desculpa, em inglês, mas acho que a rapariga do lado não percebeu e pisei-lhe o pé à mesma, ou então tropecei, não sei, mas não caí, agarrei-me à cadeira e a sala a rodar, mas um pequeno impulso e lanço-me para a frente, em direcção ao espaço, como na “Galáctica”, yupi, e o chão desliza, uma porta aberta, mesmo a tempo, talvez seja aqui, não é, mas também não está aqui ninguém e no cantinho ninguém me vê enquanto, gloriosa e finalmente, me alivio, graças a Deus.

 

Afasto os pés para não pisar nada, mais ou menos ao mesmo tempo que olho para o lado e vejo inscrito numa placa: “Eusébio da Silva Ferreira (1942-2014) Futebolista”. E eu “Porra, não queres ver que eles têm aqui a lontra do Oceanário?”, e só então caí em mim: “Estou no Panteão! E já fiz chichi nos sapatos”! Então era isto que a malta dizia no afterparty, e eu sem perceber, apenas a acenar que sim com o polegar para cima enquanto me empurravam para dentro do táxi. 

 

Corro de volta para a nave (lá está, a ”Galáctica“) e pasmo: a Sophie está a tirar a roupa em cima da mesa e a malta a aplaudir, o Jorgen a trepar parede acima agarrado a uma garrafa de champanhe, ali de lado um grupo de alemães a rir do colega a vomitar, a bebedeira que já me passou, os restos do jantar pelo ar enquanto meia dúzia de franceses brindam com mais uma garrafa de vinho, francês pois claro, e o ”Patty” a ligar o sistema de som mais as colunas em feedback ao mesmo tempo que grita com as mãos no ar.

 

Não, já não estou no Panteão, talvez na Urban a julgar pelos seguranças de cabelo rapado, as adolescentes alcoolizadas agarradas ao vodka, o som tecno ensurdecedor, as bailarinas semi-despidas com asas de anjo a voar por cima das colunas e os vitrais a vibrar.

 

O “Patty” vem ter comigo e diz que este ano foi espectacular, ainda melhor que o ano passado, e para o ano há mais, há mais como, nos Jerónimos, na Torre de Belém, o que é que se segue? Lá fora um carro da polícia, dois polícias à porta, mas o ”Patty“ mostra um papel e os polícias pedem desculpa. Não querem entrar?, pergunta, os polícias olham um para o outro e o ”Patty“, no seu português arranhado, acrescenta “Temos mulheres e vinho”, e dois minutos depois já temos dois polícias em amena cavaqueira com a comitiva espanhola enquanto dois anjinhos lhes enchem os copos, os olhos e as medidas.

 

A noite corre, como todas as noites correm. Lá em cima, no terraço, de onde se vê Lisboa, o Tejo e Portugal, já se vislumbram as primeiras luzes do dia. No fim é o fim. Mas todos gostaram, e isso é o que interessa, e para o ano há mais! Mal posso esperar, mas desta vez que tenham casas-de-banho.

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