Este chocolate é de alfarroba, vegano e cru

É produzido pela Casa do Bosque, de Sara Oliveira e Vasco Loubet.

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É o primeiro chocolate cru de alfarroba do mundo, pelo menos que Sara Oliveira e Vasco Loubet tenham conhecimento. Leva apenas ingredientes vegetais biológicos — base de manteiga de cacau, farinha de alfarroba e açúcar de coco — trabalhados a temperaturas que nunca ultrapassam os 42ºC, valor a partir do qual os alimentos são considerados cozinhados.

Sobre o creme já derretido nas formas, caem depois outros sabores: pedaços de amêndoa e funcho, raspas de limão, avelã e cânhamo, nozes e passas de uva, amora branca, nacos de figo seco e tomilho. São eles que saltam à vista quando desembrulhamos cada tablete, em contraste colorido com o castanho profundo da placa fina de chocolate.

Depois de um projecto embrionário, com amêndoas de sabores, e uma primeira vida da Casa do Bosque com bolachas e biscoitos veganos, Sara e Vasco decidiram apostar no chocolate cru de alfarroba, um produto mais desafiante e singular. “Começámos a experimentar e, depois de algumas tentativas frustradas, achámos que aquilo não era mau”, ri-se Sara, 35 anos.

Vera Moutinho

O lançamento no mercado, em 2015, não poderia ter sido prova de fogo maior: expositor e sessões de showcooking no festival de Óbidos, a Meca do chocolate em Portugal. “É um evento que atrai mesmo as massas e como nós tínhamos um quadrinho a dizer ‘vegan’, as pessoas abordavam-nos porque não sabiam o que era”, recordam. Apesar do desconhecimento geral, “as pessoas até têm algum interesse em [provar] algo que seja diferente do chocolate comum”. A aposta parecia ganha. Continuaram.

Dois anos depois, o processo de fabrico mantém-se totalmente artesanal. Desde a preparação dos ingredientes ao empacotamento de cada tablete, embrulhadas em folhas de papel que o casal cola à mão. No interior de cada embalagem, uma citação de diferentes autores portugueses, de Fernando Pessoa e heterónimos a Florbela Espanca ou Eça de Queiroz. “Queríamos que o chocolate tivesse um carácter português presente, apesar de não ser um produto tipicamente nacional”, conta Vasco, 39 anos. Assim, “ao mesmo tempo que a pessoa está a degustar um produto diferente, está a pensar em algo inspirador também”. É na embalagem do chocolate com figo e tomilho que se encontra a frase preferida do ribatejano. “Como tudo é possível, ousemos fazer rumo ao impossível”, de Agostinho da Silva.

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Foi um pouco com essa filosofia em mente que o casal se mudou para Santarém, depois de dois anos de produção numa quinta da família da Sara em Tomar. Além da distribuição para mais de 30 lojas no país, ultimam os preparativos para abrir um espaço próprio ao público, bem no centro histórico da cidade. Um produto vegano no Ribatejo taurino. “É um sítio pouco apropriado mas tem um pouco a ver com isto de tentar ultrapassar os obstáculos”, diz Vasco, natural de Porto de Muge (Cartaxo).

No novo espaço, metade loja, metade zona de produção, concentram muitos dos saberes e experiências acumulados ao longo da vida. A paixão pela cozinha herdada pela Sara — “Todas as memórias que tenho são em função da mesa, da cozinha da minha avó ou do forno a lenha, fez parte do meu crescer.” A formação em fotografia (Sara) e design gráfico (Vasco), adquirida no Instituto Politécnico de Tomar, onde se conheceram. A escolha de se tornarem vegetarianos e depois veganos. O testemunho da marcenaria, que passou de avô para pai e depois para filho, e hoje espelha-se em todas as estruturas e móveis de madeira da nova loja.

Além da venda ao público e do teste de novos produtos, querem abrir o espaço a workshops. A ideia é criar “um pequeno pólo de promoção do vegetarianismo, do veganismo e dos produtos biológicos, até do interesse pela própria cozinha”, ambicionam. Para mudar o coração do Ribatejo. Um chocolate de cada vez.

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