A unidade militar de emergência que PSD e CDS pedem já existe

Regimento de Apoio Militar de Emergência foi anunciado em pleno Governo dos dois partidos e está a funcionar há um ano.

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Passos e Cristas desconheciam a existência da estrutura criada durante a sua governação evr enric vives-rubio

Após o conhecimento do relatório Independente aos Incêndios de Junho e depois dos fogos do passado dia 15, os líderes e vários dirigentes do PSD e CDS insistiram na ideia de ser criada em Portugal uma estrutura semelhante à Unidade Militar de Emergência (UME) espanhola, um braço militar do exército para a protecção civil. Só que essa unidade já existe no nosso país. Chama-se Regimento de Apoio Militar de Emergência (RAME) foi anunciado em 2014 em pleno Governo PSD/CDS e está operacional desde Setembro do ano passado. Está instalado em Abrantes e, entre Maio e Outubro, mais de 13 mil militares participaram em acções na área de apoio às populações, principalmente no apoio ao combate a incêndios. Os prossupostos para a sua criação e a sua missão são idênticos aos da UME e ambas são parte integrante do Exército. A grande diferença do RAME face à UME é o número de meios humanos e de equipamentos, infinitamente inferiores em Portugal.

No dia 20 deste mês, Passos Coelho, citado pela Lusa, defendia "uma unidade militar de resposta a emergências e, nomeadamente, a este tipo de emergências", a exemplo da força espanhola enviada durante o Verão para ajudar no combate aos fogos em Portugal. Entre Junho e Agosto, mais de 500 homens e diverso equipamento da UME estiveram em Portugal a apoiar o combate aos incêndios.

Mais recentemente, a 26 de Outubro, Assunção Cristas, nas 43 medidas apresentadas pelo CDS para lutar contra a tragédia dos incêndios, pediu que fosse redefinida "a forma de participação das Forças Armadas nas missões de protecção civil, com a criação de uma unidade especial formada e equipada para o efeito". Ambos ignoraram a existência de uma unidade militar em Portugal precisamente com esses objectivos, o RAME.

Em Espanha, a criação da UME foi anunciada em 2005, após uma época de grandes incêndios, com o objectivo de ser um braço do exército altamente treinado e equipado para apoio às populações e às instituições em todas as situações de emergência. Teve uma dotação inicial de 750 milhões de euros e em 2008 já operava em metade do território espanhol. Em 2011 começou a operar em pleno em todo o território, sendo hoje considerada uma ferramenta fundamental no apoio e resposta a todo o tipo de emergências. Tem o quartel-general em Madrid, com vários batalhões, nomeadamente um de telecomunicações e um de intervenção em emergências, e mais quatro aquartelamentos e batalhões de resposta espalhados pelo território espanhol. São mais de 3500 operacionais, centenas de meios terrestres e marítimos e vários meios aéreos com valências diversas. 

Em Portugal, o anúncio da criação do RAME foi feito a 17 de Abril de 2014 pelo chefe de Estado-Maior do Exército (CEME) durante as cerimónias comemorativas do Dia da Arma de Cavalaria. Sem grandes pormenores, o general Pina Monteiro disse trata-se de uma estrutura vocacionada para apoio militar de emergência à protecção civil e a situações de catástrofe. Já nessa altura, nos meios militares, se falava de uma "UME portuguesa".

Segundo várias notícias, no final de Setembro de 2014, o ministro da Defesa da altura, o social-democrata Aguiar Branco, comunicava à presidente da Câmara de Abrantes que o RAME seria instalado no quartel militar local. Nessa altura era mais uma vez referido, por fontes da Defesa, que este regimento seria "uma força militar de apoio civil que teria a missão de prestar apoio às populações em caso de catástrofes, ou à protecção civil, sempre que accionado para qualquer teatro de operações no país". Disse-se então que deveria ter cerca de 300 homens e que no aquartelamento seria reunido diverso material do Exército que pudesse ser um apoio na área da protecção civil.

As instruções gerais para a criação e entrada em funcionamento surgiram na directiva n.º 114/CEME/16, de 10 de Agosto, depois da fase de transição em que existiu o Núcleo Preparatório do RAME, entre 2013 a 2016. O RAME entraria em funcionamento operacional no dia 1 de Novembro do ano passado.

Na página oficial do Exército, bem como na directiva para sua criação, os seus objectivos estão claramente definidos. É um regimento que “garante ao país uma capacidade permanente, multifuncional e abrangente, que pode crescer rapidamente com recurso às restantes capacidades do Exército e fazer face a emergências decorrentes de acidentes graves ou catástrofes”. Tem valências em diversas áreas, nomeadamente na busca e salvamento, apoio a combate a incêndios, reabastecimento e serviços, engenharia militar e apoio sanitário e psicopessoal.

A 20 de Abril deste ano, cerca de cinco meses depois de estar operacional, o RAME foi visitado pelo actual ministro da Defesa, Azeredo Lopes, que o caracterizou como sendo de “excelência”, assim como destacou a capacidade demonstrada pelo Exército “de estar preparado para enfrentar situações de emergência”. “O Exército está hoje mais bem preparado do que estava o ano passado, no âmbito da formação, do treino e na aquisição de equipamentos” de apoio ao combate a incêndios, afirmou ainda o ministro.

O regimento voltou a ser falado já este mês, após a revelação do relatório da comissão técnica independente sobre os incêndios de Junho. As referências são pouco abonatórias. Fala no “exemplo espanhol [UME], embora com outra escala”, que “permite ampliar o papel das Forças Armadas como agente de protecção civil em Portugal”. E acrescenta: “O RAME, criado no âmbito da reforma Defesa 2020, materializou-se, porém, numa versão minimalista da intenção inicial, pois acabou por não se constituir como uma unidade militar com capacidades, meios e processos dos diferentes ramos das Forças Armadas. O actual RAME, na situação actual, não tem condições nem capacidade para ser verdadeiramente útil em operações de emergência.”

Ou seja, a tal "UME portuguesa" já existe, está operacional, mas não foi dotado de meios para ser realmente útil como braço militar da protecção civil.

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