Tentativa da PT de evitar pagar 35 milhões à Nos travada no Supremo

A PT foi condenada a pagar 35 milhões à Nos por dívidas relativas a tarifas de interligação e a Nos desistiu de uma queixa por abuso de posição dominante contra a PT. São os desfechos mais recentes numa longa lista de diferendos em tribunal

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Casos são os desfechos mais recentes numa longa lista de diferendos em tribunal Nuno Ferreira Santos

Numa altura em que as posições se extremaram com trocas de acusações públicas por causa do processo de compra da Media Capital, vale a pena recordar que as batalhas entre a PT/Meo (detida pela Altice) e a Nos também se travam em palcos menos expostos aos olhares públicos, como os tribunais.

A tradição de litigância entre os grupos é grande e antiga, antiga do tempo em que nem a Nos era Nos, nem a PT era Meo e, muito menos, Altice. Entre a morosidade da justiça e os recursos que uma e outra vão apresentando, há processos que se arrastam em tribunal há vários anos. Mas este ano, há pelo menos dois que parecem ter ficado resolvidos.

Num deles, de 2011, a Nos viu-se obrigada a deixar cair uma queixa de 11 milhões de euros contra a Meo (comprada pela Altice em 2015) por abuso de posição dominante e noutro, de 2010, a Meo viu confirmada a decisão que a condenou ao pagamento de 35 milhões de euros à Nos, por valores em dívida à antiga Optimus (que se fundiu com a Zon em 2013 e deu origem à Nos).

Esta disputa, que envolveu as antigas Optimus, TMN e PT Comunicações, diz respeito a um diferendo sobre as tarifas grossistas de interligação (que as empresas pagam umas às outras pelas ligações para as diferentes redes) de 2001 e resultou numa primeira condenação da PT/Meo, em 2015, ao pagamento de um “valor aproximado de 35 milhões de euros”. É isso que a Altice revela no seu relatório e contas de 2016 (publicado em Abril).

A empresa também explica que, apesar de a PT/Meo ter recorrido para o Tribunal da Relação, a decisão da primeira instância foi confirmada e que, em Setembro do ano passado, foi “notificada da decisão do Supremo Tribunal de Justiça de rejeitar o seu recurso” da decisão da Relação. O PÚBLICO questionou a PT sobre se considera o processo encerrado ou se ainda existe possibilidade de recurso, mas não obteve resposta. A Nos, no documento de contas do primeiro semestre (que foi divulgado no final de Agosto), destaca que a sentença transitou em julgado e que a regularização dos valores “continua em aberto”.

Quanto à queixa da Optimus contra a PT por abuso de posição dominante no mercado grossista, é também a Altice que revela, desta vez no relatório e contas do primeiro trimestre (publicado em Maio), que a empresa liderada por Miguel Almeida desistiu do pedido de indemnização de 11 milhões de euros por perdas e danos no mercado da banda larga.

No final de 2016, o tribunal decidiu que esta acção, de Março de 2011, não tinha evidências suficientes para prosseguir e a Nos, que numa primeira fase admitiu contestar a decisão, comunicou finalmente à PT, “durante o primeiro trimestre de 2017”, que não iria avançar com um recurso.

Mas a litigância entre a Meo e a Nos em 2011 não se ficou por aqui. Esse foi mesmo um ano de grande reciprocidade entre as empresas; uma e outra avançaram com acções contra a rival para o Tribunal Judicial de Lisboa com o mesmo tema como pano de fundo: o da portabilidade dos números.

Segundo a Nos, em 2011, a Meo apresentou um “pedido de indemnização de 10,3 milhões de euros, a título de compensação por alegadas portabilidades indevidas”, ocorridas entre Março de 2009 e Julho de 2011. Entre o final de Abril e o início de Maio de 2016, realizou-se a audiência de discussão e o julgamento” e a sentença “julgou parcialmente procedente a acção”, ou seja, deu razão parcial à Meo. O que houve não foram portabilidades indevidas (de números de clientes da Meo portados para a rede Nos), e sim “mero atraso no envio da documentação”, diz a Nos. Com isto, a empresa participada pelo grupo Sonae (dono do PÚBLICO) foi condenada ao “pagamento de aproximadamente 5,3 milhões de euros”, mas recorreu da decisão. Em Agosto, de acordo com o relatório e contas da Nos, o processo ainda estava pendente na Relação.

Nessa data também não tinha desfecho conhecido o caso do pedido de indemnização de 22,4 milhões que a Nos fez à Meo por alegados danos “decorrentes da violação do regulamento da portabilidade”, nomeadamente um “avultado número de recusas injustificadas de pedidos de portabilidade”, registado entre Fevereiro de 2008 e Fevereiro de 2011. Sobre este caso, que ainda estava pendente da realização da “perícia económica e financeira”, o conselho de administração da Nos (presidido por Jorge Brito Pereira) entende, e é “corroborado pelos advogados” da empresa, que há “boas probabilidades” de sucesso. Porquê? Entre outras coisas “pelo facto de a Meo já ter sido condenada, pelos mesmos ilícitos, pela Anacom”, diz a Nos. Ainda assim, a empresa admite que, na eventualidade de a acção ser julgada totalmente improcedente, arrisca-se a arcar com custas processuais no valor de 1,15 milhões.

No documento de contas semestral, a Nos também indica que, entre 2013 e 2016, a Meo efectuou três “notificações judiciais avulsas” a cada uma de três empresas do grupo (Nos SA, Nos Açores e Nos Madeira). Segundo o documento, todas elas pretendiam “interromper a prescrição de danos alegadamente emergentes de pedidos de portabilidade indevida, da ausência de resposta em tempo a pedidos que lhes foram apresentados pela Meo e de pretensas recusas ilícitas de pedidos electrónicos de portabilidade”. No total, está em causa um pedido de compensação de pelo menos 27 milhões de euros.

É no relatório e contas anual da Altice que se faz referência a outro processo que tem andado a passo de caracol e continua, aparentemente, sem fim à vista: o da queixa da extinta TV Tel contra a PT Comunicações, que se transformou num caso da Nos contra a PT/Meo.

Em 2004, esta operadora de cabo do Porto apresentou queixa contra a antiga incumbente por abuso de posição dominante e concorrência desleal. O processo tem o seu quê de caricato porque a acção foi instaurada contra a PT, na época em que esta era dona da TV Cabo, concorrente da TV Tel, que depois passou a ser sua proprietária. Isto porque, em 2008, já depois da separação da PT Multimédia do grupo PT (depois da tentativa fracassada da Sonaecom comprar a PT), a TV Tel acabaria por ser comprada pela empresa que resultou dessa separação (e que ficou dona da TV Cabo), a Zon Multimédia.

“A TV Tel alega que, desde 2001, a PT Comunicações lhe restringiu ou recusou ilegalmente o acesso às suas condutas no Porto”, com isso prejudicando o desenvolvimento da sua operação, refere o relatório e contas da Altice. A TV Tel reclama à Meo uma indemnização de cerca de 15 milhões de euros. “Após um julgamento inicial, e com base numa decisão judicial, aguarda-se a marcação de um novo julgamento para apreciar factos novos sobre o processo”, refere a Altice, acrescentando que a Meo “foi recentemente notificada pelo tribunal para apresentar uma lista de testemunhas” para serem ouvidas “durante a primeira metade de 2017”.

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