Crítica não justifica linchamento público, diz sindicalista dos juízes

Manuela Paupério admite não se rever na argumentação adultério feminino usada por colega, mas diz que independência dos magistrados não pode ser posta em causa.

Foto
Enric Vives-Rubio

A Associação Sindical dos Juízes Portugueses vai "acompanhar de muito perto" o inquérito instaurado pelo Conselho Superior da Magistratura ao juiz relator Neto de Moura, do Tribunal da Relação do Porto, pelas considerações proferidas num acórdão sobre violência doméstica.

Em Braga, à margem de uma conferência na Universidade do Minho, a presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, Manuela Paupério, salientou que "tem que haver muita ponderação" na análise do caso em apreço sob pena de se “pôr em causa a independência dos juízes".

O Conselho Superior da Magistratura anunciou quarta-feira a instauração de um inquérito ao juiz que num acórdão sobre um caso de violência doméstica invoca a bíblia, o Código Penal de 1886 e até civilizações que punem o adultério com pena de morte para justificar as agressões cometidas contra uma mulher por parte do marido e também do amante, condenados a pena suspensa na primeira instância.

"O Conselho Superior da Magistratura já disse que ia abrir um inquérito disciplinar, é o órgão competente para aferir a existência de eventual responsabilidade disciplinar. A Associação Sindical dos Juízes Portugueses vai acompanhar de muito perto o desenrolar deste inquérito", declarou Manuel Paupério. A magistrada sublinhou que "tem de haver muita ponderação", porque "um órgão de natureza administrativa não pode colocar em causa decisões judiciais ou os seus fundamentos", sob pena de “estar a pôr-se em causa a independência dos juízes".

Segundo Manuela Paupério, "o que compete aferir é se o juiz, ao proferir aquela decisão, viola algum dos seus deveres estatutários".

"Vamos aguardar com serenidade os desenvolvimentos posteriores deste caso que está a tomar proporções inauditas, a justiça precisa de serenidade", apontou. Questionada sobre se como mulher concorda com o discurso usado no acórdão em causa, Manuel Paupério afirmou que não. "Como cidadã, não me revejo naquele tipo de argumentário. As considerações ficam com o senhor juiz", respondeu. No entanto, acrescentou, "a crítica a uma decisão, por mais justa que possa ser, não justifica o recurso ao insulto e ao linchamento público".

"O adultério da mulher é uma conduta que a sociedade sempre condenou e condena fortemente (e são as mulheres honestas as primeiras a estigmatizar as adúlteras) e por isso vê com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído, vexado e humilhado pela mulher", lê-se na decisão daquele tribunal superior, também assinada pela desembargadora Maria Luísa Abrantes. 

Sugerir correcção
Ler 7 comentários