Boa noite e boa sorte

Esta reforma do combate ao fogo começa sem documentos, sem apoio político a quem a vai liderar, sem orçamento e sem grandes explicações. Começa mal, mas não pode acabar assim.

Talvez se lembre do nome: Helena Freitas, bióloga, professora na Universidade de Coimbra e deputada do PS. Em Março de 2016, foi nomeada por António Costa para liderar a Unidade de Missão para a Valorização do Interior. Passado um ano saiu do cargo, sem grandes explicações. Ontem, porém, deixou cair um lamento ao JN: “O território precisa de uma estrutura política forte, que claramente não tinha. Do ponto de vista político é preciso mais. A minha frustração foi demasiado grande”, disse Helena Freitas. 

Talvez se lembre, também, que o combate ao abandono do Interior era uma das prioridades de António Costa. Houve discursos, muitos, estudos e um guião de propostas. Houve um Conselho de Ministros especial para aprovar uma estratégia. E depois houve uma demissão. Agora sabemos melhor porquê.

António Costa falou ontem do interior, quando se defendeu da moção de censura apresentada pelo CDS. Falou do interior horas depois de ter dado posse ao homem que vai liderar outra Unidade de Missão, aquela que vai ter que mudar o combate ao fogo. Ao escolhido, Tiago Oliveira, só podemos desejar boa sorte. Que não lhe aconteça o que aconteceu a Helena Freitas. Que não aconteça à sua reforma o que aconteceu à reforma da floresta, que o Governo aprovou há um ano - ficar quase toda no papel.

Tiago Oliveira começa em terreno pantanoso. Não tem o apoio do Bloco, do PCP e dos Verdes. Não sabemos com quem vai trabalhar, que poder lhe será instituído na coordenação de esforços com os vários ministérios, que carta de missão lhe foi entregue. Na verdade, nem despacho de criação da Unidade de Missão conhecemos - porque ainda nem foi publicado. 

Da estratégia também não há rasto. O Governo fez um Conselho de Ministros, mas pouco nos disse sobre o que quer fazer. Não há um documento, uma resolução. Não há senão um copy/paste de algumas frases dos técnicos independentes, para tentarmos adivinhar o que pode vir aí. O mesmo quanto ao orçamento que exigirá esta reforma: sobre isso, só sabemos que, dos quase 400 milhões de euros anunciados por António Costa, 85% são para reparação dos danos causados pelas tragédias. O que já tínhamos poupado se já os tivéssemos gasto na prevenção. 

Não, isto não é fogo de artifício. Nem pode ser uma vaga proclamação que nos leve a mais uma "frustração demasiado grande". Esta é uma necessidade premente: saber “que capacidade tem o Governo para tirar as consequências e impedir a repetição da tragédia” - palavras de Catarina Martins, ontem, na moção de censura ao Governo. O Bloco e o PCP não a votaram. Mas nunca se levantaram para apoiar o primeiro-ministro. Como quem diz: boa noite e boa sorte.

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