Henrique Capriles abandona coligação opositora a Maduro

A Mesa de Unidade Democrática corre o risco de dissolução após a derrota contundente nas eleições regionais de 15 de Outubro.

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Henrique Capriles não aceita sentar-se à mesma mesa que Henry Ramos Allup LUSA/MIGUEL GUTIERREZ

A unidade da coligação opositora da Venezuela já só existe no nome. A saída formal da formação liderada por Henrique Capriles da aliança de partidos adversários do regime chavista, consuma a ruptura e abre a porta à fragmentação da Mesa da Unidade Democrática (MUD), desavinda e fragilizada pela pesada derrota sofrida nas eleições regionais de 15 de Outubro.

“Não continuarei a fazer parte de uma coligação que não tem a unidade nem como conceito nem como visão, e que alberga pessoas dispostas a aceitar os ossos”, criticou Henrique Capriles, rival presidencial de Nicolás Maduro. O líder do partido Primeiro Justiça, que foi impedido de voltar a candidatar-se à liderança do governo do estado de Miranda, justificou o seu afastamento com a posição assumida por quatro dos cinco concorrentes da MUD que foram eleitos governadores: contrariando a posição oficial da coligação de denúncia de fraude eleitoral e boicote dos resultados, os quatro aceitaram tomar posse numa cerimónia na Assembleia Constituinte.

“Não vou continuar sentado nesta mesa. Não aceito fazer parte de nenhuma aliança que conte com o senhor Henry Ramos Allup”, disse Capriles, num violento ataque ao secretário-geral do partido Acção Democrática (a que pertencem os quatro governadores eleitos) que chegou a presidir à Assembleia Nacional da maioria opositora que perdeu as suas funções legislativas quando o Presidente convocou a constituinte – cuja legitimidade não é reconhecida por vários países da América Latina, bem como a União Europeia e os Estados Unidos.

Ramos Allup – que ambiciona o seu próprio duelo eleitoral contra Maduro – desvalorizou o ataque de Capriles e as críticas de outros dirigentes da MUD, dizendo que “só estão a disparar contra a Acção Democrática porque ficaram ressentidos com o resultado das eleições”. A sua reacção poderá precipitar mais dissidências e eventualmente a dissolução da coligação opositora, menos de um ano antes do importante combate presidencial, previsto para 2018.

“Quando se trata da nossa pátria, o pragmatismo ou a conveniência não são uma opção. A tomada de decisões só pode ter por base a defesa dos princípios do povo venezuelano”, sublinhou Julio Borges, o actual presidente do Parlamento e deputado do partido Primeiro Justiça – ao qual pertence o quinto governador eleito pela oposição, Juan Pablo Guanipa, que se recusou a comparecer perante a Assembleia Constituinte para ser empossado como presidente do governo estadual de Zulia.

Numa mensagem no Twitter, o governador eleito disse que se mantinha de pé, “com coerência e dignidade”, e que “por amor a Zulia e à Venezuela recusava dobrar-se perante a ditadura. Nunca validarei esta assembleia inconstitucional”, prometeu. A bola está agora do lado do Conselho Nacional Eleitoral, que tem de decidir se perante a recusa de Guanipa em assumir o mandato marca novas eleições no estado de Zulia.

“Os governadores da oposição têm uma responsabilidade histórica de se manterem firmes nas suas convicções e princípios perante os enganos e os ataques da ditadura”, considerou Leopoldo López, o dirigente do partido Vontade Popular que se converteu no mais famoso preso político do regime venezuelano, em apoio à declaração de Guanipa.

O bloco opositor ao Governo do Presidente Nicolás Maduro antecipara uma vitória retumbante na votação para os governos estaduais e outros órgãos da administração local. O que talvez explique porque tenha ficado tão atordoada e incapaz de reagir ao anúncio dos resultados oficiais, que contrariando as previsões das sondagens e as expectativas dos observadores políticos atiraram o chamado “oficialismo” para o pico das preferências dos venezuelanos.

A cúpula da MUD, que já se tinha dividido por causa da decisão de participar ou não nas eleições regionais, nunca se entendeu para acertar uma estratégia de resposta à vitória do oficialismo. Enquanto alguns dirigentes insistiam na tese da fraude eleitoral, apresentando provas, outros reconheciam os resultados e ofereciam explicações para o descalabro, desde a imposição de candidatos a partir dos directivos de Caracas até erros na campanha. “Derrotámo-nos a nós próprios”, resumiu o deputado José Guerra.

A heterodoxa Mesa da Unidade Democrática nasceu em 2008 com a missão declarada de combater e derrotar o PSUV, e transformar o regime venezuelano enterrando o chavismo. Esse era o objectivo comum da coligação que abarcava dezenas de partidos que ideologicamente vão das duas margens direita e esquerda até ao centro do espectro político.

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