Comandante da Marinha Grande critica inacção do ICNF: “Não gozem com os meus bombeiros”

Vítor Graça escreveu uma dura carta aberta dirigida ao ministro da Agricultura, denunciando que os bombeiros voluntários são obrigados a realizar o trabalho do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.

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LUSA/TIAGO PETINGA

O comandante dos Bombeiros Voluntários da Marinha Grande, Vítor Graça, enviou uma carta aberta ao ministro da Agricultura, na qual exige que o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) cumpra as suas funções e diz que são os bombeiros voluntários que fazem o trabalho que deveria ser realizado por aquele organismo do Estado.

"Infelizmente, observo que continuamos a ser desrespeitados enquanto operacionais, com impacto nas nossas vidas pessoais e familiares, por entidades com rostos e nomes, que existem, não cuidam nem cumprem o que está legislativamente escrito. E é nesse sentido que esta carta surge, pedindo por favor para que quem tem essas responsabilidades que as assuma e execute, e que acima de tudo não 'gozem' com os meus bombeiros", lê-se no documento, que está publicado na página da corporação no Facebook.

Sem querer questionar se a mata estava limpa ou não, Vítor Graça disse à agência Lusa que o ICNF tem "determinadas funções", definidas por lei, de intervir no pós-incêndio. "Não é fazer o rescaldo. Esse é feito pelos bombeiros. É verificar o que fica no terreno ainda a arder [pequenas chamas], para evitar que as pessoas nos chamem a toda a hora com receio de se estar a iniciar um incêndio", explicou.

Vítor Graça revelou ainda que no domingo os bombeiros tiveram de ir combater alguns reacendimentos e, ao mesmo tempo, "foram mobilizados meios, necessários, para validar novos focos, em zonas que deveriam ser elementos do ICNF a validar essas situações".

"A vigilância pós-rescaldo está determinada, quer sob a forma de lei, quer nas Directivas Operacionais Nacionais que saem todos os anos, que deverá ser realizada por Sapadores Florestais (ICNF-Matas Nacionais, nesta nossa área). É triste que descarreguem mais esse fardo e responsabilidade, em quem anda exausto, não lhe compete assumi-la, não é dono, tem que assegurar todos os outros serviços operacionais, e tem que recuperar energias, pois os alertas não prometem descanso", acrescenta ainda o comandante na carta.

Vítor Graça lamenta ainda ter assistido "durante a evacuação de um barracão das Matas Nacionais em Pedreanes, por causa do incêndio, que saíram lá de dentro mais viaturas de combate do ICNF do que as que tinha no terreno em combate". E saíram, "não para combater, mas apenas para não arderem". "É triste, numa reunião de entidades responsáveis ainda em fase de incêndio, os 'donos' serem alertados para o risco de queda de pinheiros queimados e fragilizados na sua sustentação, e a resposta ter sido no meio da frase algo como: 'identifiquem e abatam'. Honestamente, estão a gozar com quem? Para que servem os meios humanos do ICNF?".

Vítor Graça critica ainda o facto de os Voluntários terem ligado para "Serviços Florestais às 17h03 de sexta-feira, a solicitar-lhes o que a lei determina que eles façam, e para o qual eles se deveriam ter organizado, e a resposta da senhora que atendeu é a de que: 'O horário de saída é às 17h, e além do mais deram-nos a tarde de sexta para compensar as horas no incêndio'".

“Senti-me impotente e revoltado. Tive que pedir a um bombeiro assalariado, que por coincidência tinha terminado o seu horário de trabalho às 17h e estava para ir para casa, que fosse validar um reacendimento”, continua. “Expliquem-me como é que lhe compenso os 45 minutos extras que trabalhou (dinheiro não entra na equação). Mais ainda, como é que compenso todos os bombeiros por tudo extra que fizeram em tantos dias? Como é que compenso os bombeiros por andarem a fazer gratuitamente, o trabalho que deveria ser feito por quem é pago?”, questiona ainda Vítor Graça.

O comandante afirmou ainda à Lusa que não pretende "fazer rolar cabeças" e que não espera uma resposta do ministro. "Espero que leia a carta e faça com que as pessoas responsáveis em relação a esta questão percebam o que têm que fazer".

Durante a noite desta segunda-feira, o presidente do ICNF,  Rogério Rodrigues, refutou à Lusa estas acusações, afirmando que que os operacionais não descansam quando há alertas da Autoridade Nacional de Protecção Civil e que o quadro de competências dos sapadores está definido por lei.

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