Estas são as nossas elites

Tudo isto se resume a uma questão muito simples: se o senhor juiz é uma besta, e se não consegue deixar de ser uma besta, tem de deixar de ser juiz.

Uma mulher foi perseguida, ameaçada e insultada durante um ano por dois homens com quem se tinha relacionado, até que foi sequestrada por um e atacada por ambos, tendo até sido agredida com uma moca cheia de pregos. Dando estes factos como provados, o juiz desembargador Joaquim Neto de Moura e a juíza desembargadora Maria Luísa Arantes decidiram que a pena suspensa seria justa para estes crimes. Como atenuante foi usado o “contexto de adultério”, o que permitiria compreensão judicial sobre o acto de violência exercido por causa da “deslealdade e imoralidade sexual” da vítima.

Os tristes magistrados têm direito à sua opinião — não têm é direito a usar os seus preconceitos e abusar dos seus poderes para promover visões do mundo que estão ao arrepio do que é minimamente exigível num Estado de direito. Tudo isto se resume a uma questão muito simples: se o senhor juiz é uma besta e se não consegue deixar de ser uma besta, tem de deixar de ser juiz.

Citando um excerto de outra decisão judicial do mesmo autor, é preciso perguntar: se uma mulher adúltera será “uma pessoa falsa, hipócrita, desonesta, desleal, fútil, imoral", o que dizer de um juiz que usa estes termos para se pronunciar sobre uma vítima? Parece óbvio que não merece ser representante judicial da República portuguesa. Se as suas capacidades se resumem ao ampliar dos preconceitos que tem enfiados na cabeça, perdidos entre teias de aranha e bazófia moralista, merece apenas ser reduzido ao ridículo em que vegeta. E os doutos colegas que pensem da mesma forma merecem destino semelhante, porque não deve haver lugar na justiça para quem se quer servir da mesma apenas para criar um simulacro de sociedade arcaica e bafienta.

Verdadeiramente triste é pensar que estas são as nossas elites: as pessoas que mais estudaram, que melhor se prepararam, que mais responsabilidade têm. São servidores do Estado, com regalias muito acima da média nacional, que usam indecorosamente o seu estatuto para promover preconceitos que, eles mesmos, atentam contra a lei fundamental nacional e contra os protocolos internacionais a que Portugal adere.

Se estes são os nossos melhores, não podemos esperar muito dos nossos piores. Podemos apenas ansiar que a evolução da espécie cumpra o seu papel, ajudando a erradicar tão rapidamente quanto possível estas ideias atávicas do discurso do poder em Portugal.

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