A “Lei de Guardiola” não é infalível

O conceituado treinador de futebol explicou a sua teoria no livro “Guardiola Confidencial”, lançado em 2014. O PÚBLICO foi ver se, afinal, ela é fiável.

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FC Porto e Sporting, os dois primeiros da Liga LUSA/JOSÉ SENA GOULÃO

Pep Guardiola compara a sua tese a uma receita: “O título ganha-se nas últimas oito jornadas e perde-se nas oito primeiras”. No livro “Guardiola Confidencial”, lançado em 2014, o então treinador do Bayern Munique revela as suas ideias sobre a forma como se pode chegar a campeão. “É preciso evitar perder a liga nos primeiros dois meses do campeonato. Os adversários podem roubar pontos, mas não muitos. A eventual desvantagem deve ser mentalmente aceitável, de dois ou três pontos, quatro no máximo, no final dessas oito jornadas. Ainda que a tua equipa esteja na perseguição, mantém o líder por perto; e num confronto directo, poderá alcançá-lo. Assim, terá condições de lutar pelo título nas últimas oito jornadas, demonstrando a verdadeira força da sua equipa no momento decisivo. Nessa recta final não se pode falhar. Essa é a teoria”, escreveu.

O PÚBLICO aplicou a “Lei de Guardiola” às ligas inglesa, espanhola, italiana e portuguesa, todas elas a partirem, este fim-de-semana, para a nona jornada para perceber se, nos últimos dez anos, a tese do técnico catalão, actualmente à frente do Manchester City, resiste ao teste da realidade. E a verdade é que ela é quase infalível. Nos quatro campeonatos analisados, só numa ocasião a equipa que viria a sagrar-se campeã estava fora dos oito primeiros lugares à oitava jornada.

A excepção à regra vem de Itália. A Juventus, crónica campeã da Serie A (leva seis títulos consecutivos), não começou da melhor maneira a temporada 2015-16, tendo somado apenas nove pontos nas oito primeiras jornadas (duas vitórias, três empates e três derrotas). Cumprida a primeira etapa do campeonato, tal como Pep Guardiola a define, a equipa de Massimiliano Allegri ocupava o 14.º lugar na classificação, quatro pontos acima do primeiro emblema em zona de despromoção e já a nove da liderança, que era ocupada pela Fiorentina.

Vários meses depois, havia festa em Turim. A Juventus conquistou o título a três jornadas do desfecho do campeonato, tendo concluído a Serie A com nove pontos de vantagem sobre o segundo classificado, Nápoles. A Fiorentina, que liderava à oitava jornada, não foi além do quinto lugar – a 27 pontos dos “bianconeri”.

A recuperação feita pela Juventus não tem par nos últimos dez anos. E em cinco ocasiões, a equipa que liderava após oito jornadas seria a campeã. Este ano o primeiro lugar pertence ao Nápoles – mas quem irá celebrar no fim do campeonato?

No campeonato inglês, e nos últimos dez anos, a “Lei de Guardiola” não falhou. A equipa que viria a ser campeã esteve sempre entre os primeiros lugares após as oito rondas iniciais – e quase sempre dentro da margem de dois a quatro pontos definida pelo técnico catalão. A maior recuperação foi feita pelo Manchester United, que seguia a cinco pontos do Chelsea em 2010-11 mas terminou no topo, com nove pontos de vantagem sobre os “blues”.

O próprio Pep Guardiola já sentiu na pele os efeitos da sua teoria. Em 2016-17, na primeira temporada ao comando do Manchester City, partilhava a liderança com o Arsenal quando estavam decorridas oito jornadas. Mas os dois veriam escapar o título para o Chelsea, do igualmente estreante Antonio Conte: quinto classificado com três pontos de desvantagem à oitava jornada, o emblema londrino terminou com 15 pontos de avanço sobre os “citizens” e 18 relativamente aos “gunners”.

Portugal uma espécie de excepção

Em Espanha, também não houve qualquer excepção à regra. Na última década, os títulos foram repartidos entre Barcelona e Real Madrid, com o Atlético de Madrid a imiscuir-se neste duelo na temporada de 2013-14 e, em todas as épocas o campeão ou já liderava a prova ou nunca esteve a mais do que um ponto de diferença do primeiro classificado à oitava ronda.

E em Portugal? Face à hegemonia de Benfica e FC Porto nas últimas décadas na Liga portuguesa rapidamente se conclui que o campeão esteve sempre entre os oito primeiros à oitava jornada. Mas foram várias as vezes que a regra pontual em que Guardiola baseou a sua tese não se verificou.

O caso mais flagrante ocorreu na época de 2015-16. O Benfica sagrou-se campeão mas à oitava ronda era apenas sexto e estava a sete pontos do então líder Sporting. E o mesmo sucedeu nas temporadas de 2013-14, novamente com o Benfica a conseguir recuperar (cinco pontos de atraso face ao FC Porto), e em 2008-09, desta vez sendo os portistas os protagonistas, já que anularam uma desvantagem de cinco pontos em relação ao surpreendente líder de então à oitava ronda, Leixões.

Esta época, FC Porto, Sporting e Benfica ocupam as três primeiras posições da Liga no arranque da nona jornada. Mas se os "leões" estão apenas a dois pontos do líder, as "águias" terão de colocar a "Lei de Guardiola" em xeque se quiserem chegar ao "penta", pois são cinco os pontos de atraso que têm para os "dragões".

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