Rohingya são alvo de crimes contra a humanidade, acusa a Amnistia Internacional

Relatório da organização diz que foram cometidos crimes como execução, deportação e deslocamentos forçados, tortura, violação e outros tipos de violência sexual, contra a comunidade rohingya.

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Refugiados rohingya chegam ao Bangladesh Reuters/JORGE SILVA

A Amnistia Internacional denuncia, naquela que considera ser a análise “mais aprofundada” realizada até agora sobre o assunto, uma campanha sistemática e organizada das forças de segurança da Birmânia contra a minoria muçulmana dos rohingya que incluem pelo menos seis crimes contra a humanidade.

A investigação da organização, intitulada O meu mundo acabou: rohingya são alvo de crimes contra a humanidade em Myanmar, identifica, pela primeira vez desde o início da crise que provocou já a fuga de mais de 500 mil rohingya da Birmânia, unidades militares específicas responsáveis pelos crimes relatados: o Comando Ocidental do Exército da Birmânia, a 33ª Divisão de Infantaria Leve e a guarda fronteiriça. Tudo isto foi analisado com base em três missões recentes na zona de fronteira entre a Birmânia e o Bangladesh, tendo reunido mais de 150 testemunhos, incluindo refugiados rohingya, profissionais médicos, trabalhadores da ajuda humanitária, jornalistas e responsáveis governamentais bengali. Além disso, foi realizada uma análise pericial de dados e imagens de satélite, assim como de fotografias e de vídeos feitos no estado birmanês de Rakhine.

A conclusão da Amnistia é a de que foram perpetrados massacres, violações, destruição de aldeias e vilas inteiras, numa “estratégia orquestrada para forçar à fuga mais de meio milhão de pessoas daquela minoria étnica e religiosa, alvo de enraizada discriminação”. A organização informa ainda que pediu acesso ao terreno para continuar a investigar os abusos, incluindo do grupo rebelde Exército Arakan de Salvação Rohingya.

"Nesta campanha orquestrada, as forças de segurança de Myanmar atacaram brutalmente, por vingança, toda a população rohingya no estado de Rakhine, numa tentativa aparente de os expulsar permanentemente do país. Estas atrocidades continuam a alimentar a pior crise de refugiados da região em décadas”, disse Tirana Hassan, directora do gabinete de resposta à crise da Amnistia Internacional.

A fuga em massa começou na altura em que um grupo rebelde da minoria muçulmana atacou, no dia 25 de Agosto, as instalações policiais e militares do Estado birmanês de Rakhine – de onde é originária a maior parte dos que atravessam a fronteira.

Nesta zona, a Amnistia identificou pelo menos seis dos 11 crimes contra a humanidade previstos no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional: execução, deportação e deslocamentos forçados, tortura, violação e outros tipos de violência sexual, perseguição, e outros actos como impedir o acesso a comida e a outras provisões básicas.

Os sobreviventes ouvidos pela organização relatam que tiveram de fugir das suas aldeias, afirmando que os mais velhos e as pessoas com incapacidade não o conseguiram fazer, acabando, muitos deles, por morrer queimados depois das forças de segurança birmanesas terem incendiado as suas casas. Existem também relatos de centenas de pessoas que morreram ou ficaram feridas pelos tiros disparados pelas forças birmanesas enquanto fugiam dos locais onde se encontravam. Segundo o relatório, estas acções estenderam-se por dezenas de aldeias, com particular incidência junto ao local onde o Exército Arakan de Salvação Rohingya realizou o seu ataque em Agosto.

Os relatos mais chocantes descritos no relatório da Amnistia são os das vítimas de crimes sexuais. Pelos menos sete delas foram ouvidas pela organização, incluindo quatro mulheres e uma rapariga de 15 anos, que dizem ter sido violadas pelas forças de segurança birmanesas em duas vilas diferentes.

De acordo com os testemunhos, os soldados birmaneses executaram a maior parte dos homens e rapazes das respectivas aldeias, tendo levado as mulheres para casas, violando-as aí. As habitações foram depois incendiadas, matando várias pessoas que ficaram no interior.

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Imagem de satélite de Setembro deste ano, depois do ataque dos rebeldes rohingya
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Imagem de satélite em Dezembro de 2016, antes do ataque dos rebeldes rohingya

A partir de imagens de satélite, a Amnistia identifica também cerca de 20,7 quilómetros quadrados de edifícios queimados pelos militares desde o dia 25 de Agosto. Além disso, desde esse dia, a organização diz que foram verificados 156 grandes incêndios em Rakhine, acrescentando que nos últimos cinco anos não foram registados quaisquer fogos nessa região. As imagens de satélite corroboram também os relatos das testemunhas ouvidas: de que as forças de segurança incendiaram apenas aldeias e vilas habitadas pela comunidade rohingya.

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